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A minha conferência hoje é o início de um ciclo. Ninguém aqui deve esperar que eu ofereça um painel completo de uma obra como O Capital em uma única noite. Hoje, pretendo apresentar um quadro geral dessa obra de Karl Marx, referir-me à sua atualidade e chamar a atenção para algumas questões que dizem respeito exatamente ao seu caráter geral. Os aspectos mais particulares, as muitas contribuições especiais dessa obra ficarão a cargo dos conferencistas seguintes.
Falarmos na atualidade de O Capital não parecerá, porventura, uma arrogância depois dos desmoronamentos dos regimes do Leste Europeu que se diziam baseados na teoria marxista, tanto em Marx, quanto em seus principais seguidores, particularmente em Lenin (daí ter se criado o termo marxismo-leninismo)? Ou depois do sucedido nesses países e do fato de que, em todos eles ou na grande maioria, se faz um esforço enorme para a implantação do capitalismo? Como então afirmar que a obra de Marx tem atualidade? Não será ela uma obra ultrapassada, que os fatos desmentiram e, com isso, merece a atenção apenas dos eruditos como um capítulo encerrado na história das idéias? Será isso?
Obviamente, a ofensiva do neoliberalismo, tanto prática como teórica e ideologicamente, desde os fins dos anos 70, quer fazer com que acreditemos na falência do marxismo. E o que sucedeu nesses últimos anos, com o esfacelamento dos regimes dirigidos pelos partidos comunistas do Leste Europeu e a dissolução da própria União Soviética, parece confirmar o prognóstico do neoliberalismo. Quero frisar, aqui, que me refiro precisamente ao neoliberalismo e não ao liberalismo do século XVIII. Embora um provenha do outro, eles pertencem a épocas muito diferentes e têm sinais diferentes.
O liberalismo, seja dos iluministas franceses, dos naturalistas, de economistas como Adam Smith e Ricardo, era uma ideologia realmente anti-operária, mas progressista para a época. Revolucionária mesmo, porque se dirigia contra o feudalismo e em certos aspectos até mesmo contra o colonialismo.
O neoliberalismo de hoje é uma ideologia das grandes empresas multinacionais, dos monopólios que, em número de algumas centenas, dominam o sistema capitalista mundial. E esse neoliberalismo se voltou com todos os canhões contra o marxismo e também alvejou o keynesianismo. Mas, este último foi um alvo, digamos, lateral, situado no próprio campo das idéias burguesas.
Como então O Capital e a obra marxista mantêm sua atualidade? No mesmo ano de 1989, quando ruiu o Muro de Berlim, surgiu um artigo que logo a mídia internacional se encarregou de divulgar com grande alarde, um artigo que anunciava o fim da História, de autoria do politólogo norte-americano Francis Fukuyama. Depois desse artigo, Fukuyama compendiou sua obra num livro que já foi traduzido aqui no Brasil. Para o autor, o fim da História se dá com a proclamação de vitória final do liberalismo, da democracia liberal apoiada no sistema capitalista, no mercado capitalista.
Contudo, pouco depois, já no começo dos anos 90, iniciava-se nos Estados Unidos e, logo em seguida, também na Alemanha, no Japão e em outros países do sistema capitalista, uma recessão, que, não sendo muito profunda, se revela, entretanto, demorada, já se prolongando por dois anos. Eis porque se fala em estagnação e até mesmo em crise sistêmica, o que se ouve de economistas que nada têm de marxistas.
Junto a isso, vários fenômenos chamam a atenção, justamente fenômenos que colocam em foco a obra de Marx. Em primeiro lugar, o renitente e crescente desemprego, que é um fenômeno tanto de países adiantados quanto atrasados. É universal, pode-se dizer.
Percebe-se que a produção cresce, mas cresce também o desemprego, o que está ligado a uma revolução tecnológica e ao fato de que a classe operária, os trabalhadores intelectuais e manuais, desempregados por essa revolução, não têm tido a capacidade de resistir à ofensiva do capital começada já nos anos 70.
Agora, entretanto, desponta um movimento grevista de certas proporções em vários países da Europa e, recentemente, com particular vigor, na Alemanha. Por outro lado, vantagens que eram atribuídas ao capitalismo japonês, como o emprego vitalício (que na verdade só existia nas grandes empresas, atingindo 1/3 dos empregados), também estão sendo, de certo modo, abolidas ou parcialmente anuladas.
Percebe-se uma concorrência cada vez mais aguda. Avança o processo de concentração e centralização do capital. Quase todos os dias, na imprensa econômica, há notícias de empresas que se fundiram, empresas que foram compradas por outras ou incorporadas em conglomerados maiores.
É evidente o processo de internacionalização de todos os aspectos do capitalismo, da produção, do comércio e, sobretudo, das finanças; e a aplicação crescente da ciência à tecnologia e ao processo produtivo. Tudo isso foi estudado em O Capital. Todos esse fenômenos podemos encontrar expostos com bases não só históricas, mas profundamente lógicas, em O Capital.
Aquela lei, tantas vezes refutada, da acumulação de capital, que concentra num pólo a riqueza e no outro a miséria, está patente, evidente, no mundo de hoje. Muito mais patente aqui em nosso país do que em tantos outros, mas também nos países desenvolvidos. Nestes últimos, na trajetória do neoliberalismo dos anos 80 para cá, a minoria rica se tornou mais rica e a pobreza avançou. Aumentou a população que está abaixo do chamado limiar da pobreza, tanto nos Estados Unidos como na Comunidade Européia. O número de desempregados estruturais, isto é, constantes, consolidados, também subiu.
O que significa isso? Que hoje, nos Estados Unidos, quem tem emprego trabalha mais e obtém menos. Os salários reais são menores. Pela primeira vez, a atual geração vive pior do que a anterior. Isso é publicamente reconhecido. Foi uma das teses mais abordadas pelo candidato Clinton na última campanha eleitoral pela presidência daquele país, o que lhe garantiu a vitória.
A própria realidade presente do capitalismo torna atual O Capital, faz com que, entre outras obras, seja esta uma das obras prioritárias para a leitura de quem quer compreender o capitalismo.
Evidentemente, o mundo em que Marx viveu e escreveu O Capital era muito diferente do mundo de hoje. Apenas o primeiro livro da obra foi publicado em vida. O segundo e o terceiro foram editados postumamente pelo seu grande amigo Engels.
No século XIX, vivia-se ainda a primeira revolução tecnológica do capitalismo, aquela que corresponde à Revolução Industrial.
Marx morreu no limiar da segunda revolução tecnológica, que ocorre no fim do século XIX. Ele estava ainda na época da invenção das máquinas-ferramenta que são fundamentais na revolução industrial inglesa, da revolução tecnológica do fim do século XVIII, da máquina a vapor e das invenções típicas mais importantes: a locomotiva, a estrada de ferro, o navio a vapor, o telefone, o telégrafo com fio e algumas outras invenções fundamentais da época, bem como a penetração de certa mecanização e da química na agricultura, tornando-a uma atividade menos aleatória, mais produtiva e assim por diante.
Mas Marx não chegou a assistir a segunda revolução tecnológica. Não conheceu a generalização da aplicação da eletricidade e o enorme avanço da química industrial, não conheceu o automóvel (uma invenção fundamental), não conheceu o avião, o telégrafo sem fio, o cinema, o rádio. Muito menos a atual revolução tecnológica com o computador, a automação eletrônica, a biotecnologia, a telemática, o raio laser, os novos materiais. Tudo isso que está provocando exatamente fenômenos que ele previu: desemprego, concentração da produção, maior internacionalização. Quer dizer, a internacionalização da produção é maior do que nunca e a aplicação da ciência à produção, a ciência como força produtiva, o que foi perfeitamente previsto por ele.
Já em 1858, numa carta a Engels, Marx dizia:
"Creio que a missão histórica da burguesia é criar o mercado mundial e, na base dele, a produção de caráter mundial".
Hoje, isso é muito mais verdade do que naquela época. Os modernos produtos, que estão em nossas casas, são objetos produzidos em massa: geladeira, TV, vídeo, gravador, aparelho de som, disco digital, forno de microondas, microcomputador pessoal. Tudo isso contém colaboração de inúmeros países. As invenções não foram feitas num só país. Em muitos casos, resultaram da colaboração de empresas dos Estados Unidos, Europa, Japão e de outros países. Se é um produto importado, as peças, a matéria-prima, a elaboração etc., não são só daquele país, são de inúmeros outros. Então, temos uma produção de caráter mundial como jamais tivemos. Temos, particularmente, o capital financeiro, como fenômeno mais característico da globalização.
Um trilhão de dólares circula pelo mundo diariamente. Passa de um país para outro, não conhece fronteira. Por meios eletrônicos, em segundos, passa de um lugar para outro, onde os lucros são maiores, onde lhe paguem juros superiores. Não há governo que possa controlar esse capital. Pode apenas atraí-lo ou repeli-lo, mas não pode controlá-lo. Eis, aí, a confirmação do que Marx chamava fetichismo da mercadoria, que se condensa mais do que nunca nesse fetichismo do dinheiro.
Apesar de todos os recursos de que os governos dispõem, hoje, seja do ponto de vista da comunicação, que opera em tempo real, seja do ponto de vista da capacidade de intervir, a sociedade não tem condições de controlar a circulação do capital e das mercadorias porque, comandados pelo dinheiro, são produzidos e impelidos por forças que procedem do mercado. Essas forças escapam ao controle. Elas têm um conteúdo que a língua portuguesa chamou de fetiche (fetiche é uma palavra da língua portuguesa e que depois se internacionalizou). Quer dizer, um objeto inerte ao qual atribuímos alma, atribuímos animação e capacidade de nos dominar.
Afinal, quem cria o dinheiro são os homens. Se não houvesse sociedade humana, não haveria dinheiro, não haveria capital. Capital é uma relação social, não é a máquina que é o capital. A máquina pode não ser o capital se a sociedade não for capitalista, mas sendo capitalista ela é relação social e quem a cria são os homens.
Mas tudo isso toma o caráter de um fetiche. É uma coisa que anima e domina quem o criou. Por isso é que estamos numa recessão difícil de sair. Dominássemos essas forças, é claro que não precisaria haver tantos desempregados, e tantos países marginalizados, não só dependentes, mas marginalizados.
O Capital é uma obra muito extensa e, sem dúvida, difícil de ler. É preciso atravessar o primeiro capítulo, que é um dos mais abstratos, para poder seguir adiante. Sem esse primeiro capítulo, não se compreende toda a obra. Ele se refere exatamente ao que Marx chamava a célula do modo de produção da sociedade burguesa, do modo de produção capitalista, que é a mercadoria.
Curiosamente, a palavra capitalismo não aparece em O Capital, ela só seria criada depois. Marx fala em modo de produção capitalista, em sociedade burguesa, mas não usa o termo capitalismo. Todavia isso é apenas uma questão terminológica. O objetivo dele era estudar exatamente o capital e, juntamente com esse estudo, fazer a crítica da economia política existente em sua época como ideologia burguesa, como uma teoria que tinha aspectos científicos nos quais ele próprio se baseou, mas que, no seu conjunto, justificava a sociedade burguesa. Marx demonstrou antes que qualquer outro que o salário não paga o trabalho do operário, do assalariado, do empregado do capitalista. Ele paga a força de trabalho, isto é, o salário corresponde — em tese, em condições, digamos assim, de equilíbrio que raramente existem na sociedade burguesa — aos bens que o operário necessita para reproduzir sua força de trabalho e criar os seus filhos que serão os futuros operários.
Todo modo de produção deve ser um modo de reprodução. Isso é uma lei inelutável da sociedade humana. Se o modo de produção não fornece condições aos trabalhadores para que voltem ao trabalho no dia seguinte, durante um certo período de vida útil, seja esse trabalhador um escravo, um servo ou um assalariado, então a sociedade humana não se sustenta e se extingue. É necessário que o trabalhador tenha, entre um período e outro de trabalho, um certo repouso, alimentação e os elementos essenciais de abrigo para si e também para sua família, a fim de que o processo de produção seja contínuo, não se interrompa, siga de um dia para outro, indefinidamente. Então, o que o salário paga é a força de trabalho, aquilo a que se chamam os bens-salário.
Mas, como demonstrou Marx, apenas e unicamente o trabalho, como uso da força de trabalho, é criador de algo novo do ponto de vista produtivo. As máquinas, as coisas inertes não criam nada de novo. Dela se transfere uma parcela do valor que elas possuem, criadas que foram pelo trabalho, aos novos produtos. Mas o trabalho, no tempo em que ele se exerce, seja de 8, 10, 12, 14, 15 horas conforme a época, reproduz um valor igual à força de trabalho e um excedente que é apropriado pelo capitalista. Este excedente Marx denominou de mais-valia. Marx estudou a mais-valia na sua forma geral. Os fisiocratas Turgot e, sobretudo, François Quesnay viram a mais-valia como a renda da terra, como uma forma particular. Em Smith e Ricardo, a mais-valia é sobretudo o lucro. Marx desprendeu a mais-valia de suas formas particulares — renda da terra, lucro industrial, lucro comercial e juro do capital de empréstimo — e pôde estudá-la no seu caráter de excedente geral do trabalho explorado pelo capital. Esse é o objetivo do livro primeiro de O Capital. O estudo de como o trabalho é explorado nas fábricas, onde os trabalhadores são empregados pelos capitalistas, como se dá esse processo pelo qual a força de trabalho se reproduz e, além disso, produz o excedente, que é a mais-valia.
No livro segundo, Marx estuda o processo geral de reprodução e circulação do capital, ainda sem levar em conta as variações especiais do capital, como o capital industrial, comercial, bancário, etc. É o capital em geral, no seu processo de reprodução. Como ele se reproduz e circula, e como ele passa de uma forma à outra.
Ele vê, aí, esse processo geral que inclui todo o circuito do capital em ciclos sucessivos sob dois aspectos: o capital, como valor de uso e, para isso, ele divide o processo geral em dois departamentos, em duas seções fundamentais: o departamento de bens de produção e o departamento de bens de consumo. Por outro lado, ele aborda o processo de reprodução do ponto de vista do valor do capital, ou seja, do seu conteúdo como cristalização do trabalho, morto ou vivo. O capital constante, que é o trabalho morto, e o capital variável, que é a força de trabalho, isto é, o capital que cresce, que varia, enquanto o outro é constante. Todo esse movimento é estudado na sua extraordinária complexidade e, sem dúvida, Marx, no livro segundo, oferece uma contribuição das mais importantes, senão a mais importante até hoje ao estudo da macroeconomia. Enquanto o livro primeiro se concentra na empresa, o livro segundo se concentra na macroeconomia. É só no livro terceiro que Marx vai estudar os capitais individuais em sua concorrência uns com os outros, como essencial ao mercado capitalista. Aí é que vai aparecer a lei da taxa média de lucro. É aí também que Marx vai introduzir a categoria de preço de produção, isto é, vai demonstrar que, no mercado capitalista, as mercadorias já não se apresentam confrontadas como valores, mas como preços de produção, ou seja, o valor já está na mercadoria metamorfoseado em preço de produção. Esse é um dos pontos mais debatidos pelos adversários de Marx.
Marx parte da tese da troca de equivalentes, que é um pressuposto do primeiro e do segundo livros. Porém, já no livro terceiro, afirma que as mercadorias, quando se trocam no mundo real, só por acaso se trocam como equivalentes, porque já estão metamorfoseadas e se apresentam umas diante das outras de acordo com seus preços de produção. Daí porque Max Weber e Benedito Croce, e alguns críticos atuais, afirmarem que a lei do valor é apenas um instrumento heurístico, que não existe no mundo prático, uma vez que o próprio Marx afirmou que não existe no mercado capitalista troca de equivalentes. Seria possível num mercado de pequenos produtores, porém este, na realidade, nunca existiu. No mundo real, nunca houve esse mercado de pequenos produtores, estável e funcionando com regularidade, onde se praticasse de fato a troca de equivalentes. Então, a lei do valor e todas as outras categorias de Marx nessa obra, seriam uma hipótese de caráter heurístico ou um tipo ideal, de acordo com Max Weber. O que acontece é que Marx parte dos fenômenos, ou seja, das aparências para a essência. É uma afirmação dele que se a essência se apresentasse de maneira direta e imediata, então não haveria necessidade da ciência. As coisas já seriam evidentes empiricamente por si mesmas, bastaria descrevê-las, não haveria necessidade de uma pesquisa analítica e sobretudo dialética. A essência se esconde atrás de aparências, de fenômenos, e o trabalho da ciência é justamente ir além dos fenômenos e, para isso, no caso de uma ciência como a economia política, o instrumento que se pode usar é a abstração, uma vez que não se pode trabalhar em laboratório com economia, não se pode reproduzir a sociedade em laboratório e nem se pode fazer com a sociedade experiências como em seres vivos, senão de maneira muito limitada. De fato, os governos fazem experiências e nós, brasileiros, temos sido vítimas de tantas delas, desastrosas, mas isso é muito limitado. Nunca é como num laboratório onde os fatores são isolados e devidamente controlados. O instrumento de que dispõe o economista é fundamentalmente sua capacidade de abstração e Marx levou muito longe esta capacidade de abstração, de essência em essência, aprofundando-se em essências cada vez mais escondidas. Ele tinha que chegar a um ponto de onde já não se podia ver diretamente a realidade.
Parece haver uma contradição entre o mundo real e as essências desvendadas por Marx. Mas não foi assim, porventura, também com a astronomia? Porventura, durante milênios, os homens não tiveram a certeza de que o sol girava em torno da terra? Não era isso o que dizia o sistema de Ptolomeu? Não foi somente a partir de Copérnico que se passou a suspeitar e depois, com Galileu e Kepler, ter a certeza de que, ao contrário, era a terra que girava em torno do sol? Quer dizer, confiar nas aparências é enganoso, não é científico.
Mas qual a prova de que as essências que Marx desvendou são verdadeiras? A prova está nas conclusões que se tiram a partir delas. Conclusões a que me referi no início da conferência. O desemprego crescente, as crises cíclicas, a acumulação da riqueza num pólo e da miséria no outro, a concentração e a centralização do capital, a internacionalização do processo produtivo, o fetichismo da mercadoria e do capital. Tudo isso se extrai desse sistema de categorias e tudo isso vem sendo comprovado pela história do capitalismo. Por isso, O Capital conserva plenamente a sua atualidade, suas categorias continuam a ser fecundos instrumentos de trabalho.
Infelizmente, o socialismo de Estado que, apresentando-se como inspirado em Marx, se estabeleceu na extinta União Soviética, nos países do Leste Europeu e nos outros países socialistas que ainda sobrevivem, foi o pior inimigo do marxismo como criação teórica, porque o esterilizou, impediu que durante 50 ou 60 anos pudéssemos avançar na trilha do pensamento marxista. Avançamos muito pouco por causa dessa esterilidade, por causa dessas barreiras que o socialismo de Estado, cristalizado no chamado marxismo-leninismo emanado de Moscou, impôs a tantos cérebros filiados ao movimento comunista no mundo inteiro.
Paradoxalmente, a extinção do socialismo de Estado pode vir a ser, e eu acredito que virá a ser, um impulso para uma nova onda de criatividade marxista, verdadeiramente marxista, na trilha de O Capital. Aqui, quero me referir a outros aspectos dessa obra no tempo de que disponho e considerando o caráter de conferência introdutória.
O Capital não é só uma obra de economia política. Aliás, o seu subtítulo é "Crítica da Economia Política", da economia política burguesa. Mas não é só uma obra de economia política, é uma obra em que Marx lança mão de todos os instrumentos possíveis e acessíveis das ciências sociais de sua época. Não há, nela, apenas raciocínios abstratos, fórmulas, mas um constante vai-e-vem entre a abstração e os fatos concretos, o mundo real, o mundo histórico em que os homens vivem. O Capital é ao mesmo tempo uma obra de historiografia e sociologia, de antropologia, de demografia, de politologia, de história do direito e de tecnologia. Marx foi um dos maiores historiadores de todos os tempos. Isaiah Berlin, conhecido pensador liberal inglês, dá a Marx a paternidade da historiografia econômica, fundador da história econômica, porque em O Capital vamos encontrar, com freqüência, capítulos ou seções de capítulos que são verdadeiras monografias historiográficas. Ali temos a história do dinheiro, de como surgiu o dinheiro, a história das fases do próprio capital, da cooperação simples, da cooperativa, da manufatura e da fábrica mecanizada, o célebre capítulo 24 do livro primeiro, que é a história da acumulação primitiva, de como o capital nasceu do não capital. Ou seja, de como o capital nasceu de processos não capitalistas, incluindo a violência do Estado e da classe exploradora, a expulsão dos camponeses, o colonialismo, o tráfico de escravos, o saque das colônias, a dívida pública. Enfim, os numerosos processos que levaram à concentração do capital e à formação de uma massa de homens que, despojados da terra e de qualquer meio de produção, foram coercitivamente obrigados a se tornar assalariados. Depois, o próprio hábito das relações de produção capitalistas iria entranhar nos assalariados o hábito de se deixar explorar.
O Capital contém numerosas monografias historiográficas, além de referências esparsas, riquíssimas. Encontramos nos chamados Grundrisse, de 1859, os elementos fundamentais da economia política, particularmente no capítulo sobre as formas precedentes do capitalismo, um capítulo fundamentalmente historiográfico. Mas encontramos tudo isso também em O Capital. E, ao lado disso, temos estudos, não raro circunstanciados, sobre as condições sociais em que se processaram os fenômenos econômicos. A história da Revolução Industrial, da dizimação de gerações de trabalhadores pelas fábricas, o trabalho extenuante de mulheres e crianças de dia e de noite, durante 15 a 17 horas por dia, pois não havia limite proibitivo na legislação. Marx era um leitor atento de tudo o que era produzido na época pelos pesquisadores oficiais, pelos inspetores do trabalho que ele elogia como honestos, quando reproduzem as condições extremamente cruéis da revolução industrial. Soma-se a isso estudos de demografia, de legislação do trabalho, de legislação penal, de política. E ainda as razões explicativas de tal ou qual posição deste ou daquele Estado burguês, particularmente na Inglaterra, tomada como campo privilegiado de observação e estudo, a história da propriedade da terra, do seu desenvolvimento, a história da tecnologia, assunto sobre o qual Marx demonstra possuir conhecimentos minuciosos. A atenção que ele dedica a essa questão é extraordinária, no que teve grande ajuda de Engels, além do auxílio em particular no estudo das finanças. Marx fez, também, observações que se poderiam chamar hoje de ecológicas. Chamou a atenção para o caráter predador da agricultura capitalista, como ela esteriliza a terra com as vistas curtas para o lucro imediato, como o sistema de arrendamento é contrário à preservação da fertilidade da terra. Fez estudos sobre a necessidade de aproveitamento do que chamamos de lixo, como o lixo pode ser reciclado e, ao invés de ser jogado fora e empestear o Tâmisa, o rio que corta Londres, ser devidamente trabalhado e devolvido aos homens como matéria útil. Estudou a família, a família operária e a família burguesa, o direito de herança. E é isto que rarissimamente se encontra em obras de economistas profissionais dos dias de hoje, da Escola de Chicago ou de Harvard.
O Capital é de fato uma obra interdisciplinar. A economia política aí se apóia num conjunto de ciências sociais que, naquela época, estavam apenas dando seus primeiros passos e, às quais Marx dá uma contribuição vigorosa. Em particular, gostaria, antes de terminar esta parte, de me referir à antropologia que Marx apresenta em O Capital. A antropologia de Marx é a da relação do homem com a natureza, do homem que trabalha a natureza. Está ali a célebre comparação que ele faz entre o arquiteto e a abelha. A abelha também elabora uma arquitetura, espantosamente funcional nas colméias, mas o faz por mero instinto, e de maneira inalterável através, talvez, dos milhões de anos de existência dessa espécie. Já o mais modesto arquiteto, quando constrói uma casa, já a pensa antes de sua construção, tem o desenho dela numa planta, isto é, o homem é a única espécie que projeta o trabalho que realiza. Essa característica é a base antropológica para Marx. A relação do homem com a natureza se dá através do trabalho projetado e, por isso, é um trabalho que tem história, que se desenvolve. Daí o desenvolvimento das forças produtivas do homem e, em conseqüência, das suas relações de produção. Daí, também, a mudança das formas sociais de agregação dos próprios homens. Esta é a antropologia que Marx desenvolve em O Capital e que já não tem relação com a antropologia de Feuerbach, o qual via o homem como gênero natural, como espécie biológica.
Gostaria, também, de fazer alguma observação sobre as vicissitudes de O Capital, decorrido já um século ou mais desde a morte de seu autor. Para a construção dessa obra, Marx partiu do princípio da espontaneidade das leis econômicas do capitalismo. O mercado que ele tinha em vista era um mercado caracterizado pela anarquia. Anarquia não é desordem, bagunça, anarquia significa que não há uma regulamentação prévia do mercado, o que não quer dizer também que inexiste qualquer regulação. Marx concebia a lei do valor como a lei reguladora do capitalismo, mas uma regulação que, só por acaso e em momentos muito efêmeros, chega a situações de equilíbrio.
É característico do capitalismo a ocorrência de situações de desequilíbrio no interior das quais atuam forças que procuram equilibrar o sistema. Há uma contradição permanente entre aquelas forças espontâneas de mercado, que impelem ao desequilíbrio por múltiplas razões, e a lei do valor, que procura espontaneamente pôr alguma regulação no sistema e, por isso, o sistema funciona; de outra maneira, ele não funcionaria. O termo anarquia não pode ser tomado no sentido de bagunça, nem de desordem total. A própria lei do valor desequilibra o sistema e ao mesmo tempo, espontaneamente, o impele para o equilíbrio que, como disse, é sempre um momento raro e efêmero. Mas, justamente porque não há regulação é que o capitalismo é cíclico. Ele atravessa fases de animação, de prosperidade e de auge e cai na crise e, depois, no seu prolongamento depressivo. É isso que se chama hoje de recessão. O que Marx apresentou não apenas descritivamente, mas explicando também, os fatores que logicamente, de maneira inelutável, conduziam à trajetória cíclica do capitalismo.
A escola neoclássica ou marginalista de Bohm-Bawerk, Menger e Walras, também se baseou na espontaneidade do mercado, mas chegando a uma conclusão contrária à de Marx, a de que o mercado, deixado livre por si mesmo, atinge as condições otimizadoras de equilíbrio. Segundo os marginalistas, seria a intervenção no mercado, feita por monopólios públicos ou privados, ou a intervenção despropositada do Estado, que levaria ao desequilíbrio. O mercado, por si mesmo, seria capaz de se equilibrar em condições de utilização ótima dos fatores.
Esta tese da escola neoclássica ou marginalista veio abaixo com a Grande Depressão de 29 a 33, a pior da história do capitalismo, que abalou todo o sistema, gerando uma massa enorme de desempregados, queda violentíssima da produção, destruição enorme de mercadorias e assim por diante. Uma crise que era mais do que cíclica. Na verdade, ela ocupou toda a década de 30 com a estagnação econômica. Dela o capitalismo só pôde sair depois da Segunda Guerra Mundial. Aqui, gostaria de repetir uma observação do sociólogo inglês Antony Giddens, que recentemente esteve aqui no Brasil. Ele afirma que se fala de modernidade com tudo o que o conceito implica de revolucionamento na vida social, de quebra das tradições, mas é preciso também mencionar que a modernidade trouxe consigo os maiores massacres da história humana, que ela também se caracteriza por sua destrutividade. Só as guerras do século XX custaram mais de 100 milhões de vidas, algo que não tem comparação com as guerras do passado.
Mas justamente esta crise, esta Grande Depressão dos anos 30 veio trazer, na prática e na teoria, uma certa reviravolta na concepção burguesa do próprio mercado. O New deal do presidente Roosevelt, nos Estados Unidos, e depois a teoria de Keynes sobre o dinheiro, os juros e o emprego, se opuseram à tese de que o mercado espontaneamente tende ao equilíbrio e defenderam, ao contrário, a necessidade da intervenção do Estado. Por conseguinte, a partir da escola de Keynes, a teoria econômica burguesa deixou de tecer loas ao automatismo do mercado como capaz de atingir estágios de equilíbrio e passou a inventar dispositivos intervencionistas, que estimulassem a economia, que a fizessem andar e, dessa maneira, propiciassem emprego.
Keynes compreendeu que o desemprego, sobretudo o desemprego de dezenas de milhões como o que ocorria na década de 30, era algo extremamente perigoso para a sociedade burguesa. O seu objetivo não tinha nada a ver com idéias socializantes ou de benefício aos trabalhadores. O que ele tinha em vista era a salvação
da sociedade burguesa e, por isso, ele confiou ao Estado a regulação do mercado. Durante muito tempo, houve quem acreditasse na possibilidade aludida por Keynes, de um permanente equilíbrio através dessa intervenção. A social-democracia, sobretudo, tirou de Keynes sua inspiração teórica. Na prática econômica, abandonou Marx porque este nunca teve em vista a salvação da sociedade burguesa, mas o contrário. Keynes foi, então, aplicado na Suécia e, no pós-guerra, na Alemanha, na Inglaterra, na França e em numerosos outros países. Mas os recursos keynesianos, chamados anticíclicos porque capazes de deter o ciclo, mostraram- se, digamos metaforicamente, intoxicantes do próprio sistema burguês. Foi inevitável que a política keynesiana conduzisse a uma estatização cada vez maior, a uma ampliação do setor estatal da economia e, com isso, também aos efeitos inflacionários. Daí o limite do keynesianismo nos anos 70, quando foi declarado falido diante de uma inflação crescente nos Estados Unidos e nos outros países capitalistas; e a necessidade, então, de reagir contra os métodos keynesianos e de apelar para os métodos decorrentes da teoria neoliberal. A partir de então, o grande teórico é Friedman. Contra o keynesianismo, erige-se o monetarismo de Friedman e, junto com ele, a teoria neoliberal extremista e rigorosa de Hayek e a teoria política e sociológica de Karl Popper. Podemos dizer que a trindade teórica do neoliberalismo está nesses nomes — Friedman, Hayek e Popper. Eles passam a ser os inspiradores dos neoliberais. Não por acaso, a metade dos prêmios Nobel de economia conferida até hoje agraciou o próprio Friedman e a seus discípulos da Escola de Chicago.
Hoje, face à recessão, há uma certa volta a Keynes. Isto se observa na plataforma do candidato Clinton e em algumas propostas que ele fez como presidente, mas ainda não aprovadas pelo Congresso americano, e nas práticas que o governo japonês está empregando para conseguir salvar a economia japonesa da recessão, que a acomete gravemente neste momento.
A questão da regulação da economia pelo Estado foi imprevista por Marx. Não é uma questão tratada em O Capital. Como já disse, Marx tem sempre como pressuposto a espontaneidade das leis econômicas e a espontaneidade das tendências reguladoras do sistema capitalista pela lei do valor. Então, a teoria de Keynes é, sem dúvida, uma teoria importante, é uma contribuição notável à economia que os marxistas não podem de jeito algum desconhecer, como infelizmente desconheceram durante muito tempo, declarando-a uma teoria fantasiosa. Sem dúvida, é uma teoria limitada porém não fantasiosa. Deve ser considerada, como deve ser considerado o papel do Estado na economia capitalista atual.
O capitalismo não pode funcionar hoje sem o Estado, ainda quando os economistas afirmam o contrário. Mesmo na prática do neoliberalismo, a economia capitalista está impregnada de intervenção do Estado. Apenas a título de exemplo, citemos os governos Reagan e Bush nos doze anos de domínio republicano nos Estados Unidos, quando o Estado interveio para salvar grandes monopólios e bancos, que estavam à beira da falência. No governo Bush, o Estado gastou mais de meio trilhão de dólares para salvar o sistema de cadernetas de poupança, que tinha se atolado em investimentos especulativos, estava à beira da falência e somente com aquela soma, que é maior do que a dívida externa da América Latina, foi possível salvar o sistema. Isto é política keynesiana, como o foi todo o armamentismo de Reagan, todos os gastos que ele fez duplicando e triplicando as despesas militares, praticando um keynesianismo do tipo militarista. É impossível para nós fazer avançar a teoria marxista sem considerar esses fenômenos novos que, de fato, não têm registro em O Capital. A criatividade do marxismo é indispensável sob esse aspecto e também na questão do socialismo e do mercado.
Uma obra já conhecida e traduzida aqui em português, do autor alemão Robert Kurz, que esteve duas vezes em nosso país, dá uma ênfase muito grande ao fetichismo da mercadoria e procura mostrar que o desmoronamento dos regimes comunistas do Leste não foi senão uma parte da crise terminal do capitalismo. Começou com o Terceiro Mundo, passou para o sistema dito socialista (o Leste Europeu) e agora atinge finalmente o próprio sistema dos países desenvolvidos. Creio que Kurz comete um erro lógico ao considerar os países do Leste Europeu como integrantes do sistema capitalista. Não me parece correto, nem do ponto de vista lógico, nem do ponto de vista empírico. A meu ver, eles constituíram uma fratura do sistema capitalista mundial, tanto assim que durante a sua vigência, o capital internacional não tinha como ser ali aplicado e, sobretudo, veja-se a dificuldade hoje de instaurar o capitalismo sobre o terreno do socialismo de Estado. Não digo impossibilidade, mas a enorme dificuldade que isso implica já demonstra que aqueles países não faziam parte do sistema capitalista mundial. Até agora, em todos aqueles países, o que existe de capital privado continua secundário, marginal; o fundamental ainda está nas empresas do Estado.
Quando se fala em privatização dessas empresas, em muitos casos, faz-se referência às empresas que são geridas pelos coletivos de trabalhadores, arrendadas a eles ou adquiridas por eles como acionistas junto com os diretores e com alguma parte de acionistas privados. As exceções existem, mas são poucas. Então, eu penso que essa tese de Robert Kurz carece de fundamento histórico e lógico, não explica porque o Leste desmoronou. Desmoronou exatamente porque não soube compatibilizar a construção do socialismo com as categorias de mercado, porque essas não podem ser abolidas assim que os trabalhadores tomam o poder. É impossível eliminar de imediato categorias como mercadoria, preço, salário e lucro que permaneceram na União Soviética, continuaram a ser usadas como categorias, porém violadas na sua lógica e, por isso, chegou-se a um beco sem saída que resultou no colapso e no desmoronamento.
Mas se há de se construir o socialismo, não será com um mercado capitalista, não será com um mercado que se desenvolve espontaneamente. Mas qual mercado? Aí está um campo para a criatividade marxista, tendo em vista que o socialismo ainda virá numa segunda onda, suscitado pelas contradições e impasses inerentes ao capitalismo. Não no prazo de hoje para amanhã, catastrofista e terminal, como Kurz sugere. Não compartilho a idéia de que o capitalismo esteja à beira de uma catástrofe, porque não há forças revolucionárias no mundo que o ponham abaixo. O capitalismo não virá abaixo só pela dinâmica de sua economia, ele terá que ser derrubado por forças políticas revolucionárias, e essas inexistem com capacidade para fazê-lo. Certamente, não será de um momento para outro que elas se formarão no mundo. Então, sem este catastrofismo, entretanto, creio que o capitalismo suscitará uma nova onda de lutas pelo socialismo. Porém, terá que ser um socialismo com propostas diferentes daquele que, sem dúvida, não deu certo. Em determinado sentido, um socialismo que se apresente compatível com as categorias de mercado que não podem ser imediatamente abolidas, que persistirão talvez por muitas décadas ainda, ao contrário do que Marx previa na Crítica do programa de Gotha.
Ainda havia em Marx uma idéia utópica de que com a chegada dos trabalhadores ao poder, o mercado desapareceria e, com ele, a lei do valor. Pela experiência concreta que conhecemos, não parece que isto seja possível. Creio que o mercado desaparecerá. A tecnologia levará a isso na medida em que ela vai reduzindo cada vez mais a necessidade da contribuição do trabalho para a criação de uma certa quantidade de produtos. Então, a necessidade da diminuição da jornada de trabalho, que hoje os trabalhadores não conseguem obter porque estão desfigurados e desagregados pela revolução tecnológica, com o tempo levará cada vez mais à queda do valor agregado em cada processo produtivo, até um ponto em que este valor será tão próximo do zero que será desprezível. Nesse momento, ou perto dele, a lei do valor poderá ser desconsiderada e, nesse caso, também o mercado desaparece. Isto foi previsto por Marx, está nos Grundrisse, mas é um processo muito demorado. Embora acelerado agora pela revolução tecnológica, mas, para chegar ao ponto de anular a lei do valor, ainda vai uma distância enorme. Então, nessas condições é que o socialismo terá que enfrentar a realidade do mercado.
Esta é uma nova questão, não proposta por Marx, e tem que ser focalizada pela criatividade marxista de nosso tempo. O Capital, quero encerrar, é atual, fortemente atual, uma obra imortal, uma escola de pensamento. Ali, o método dialético perpassa página por página, linha por linha. É uma obra de economia, de sociologia, de antropologia, de demografia, particularmente no que se refere à questão do exército industrial de reserva, dos desempregados como funcionalmente necessários ao capitalismo. Uma obra, enfim, que abarca todo o âmbito das ciências sociais. Mas, se quisermos ser fiéis ao espírito dela, precisamos dar prosseguimento à criatividade de que ela oferece tão eminente exemplo.
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Inclusão | 02/01/2015 |