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Da mesma forma que o capital mercantil se isola sob a forma de capital comercial, também o capital monetário se isola sob a forma de capital de empréstimo. Como já vimos, o capital de empréstimo surge em substituição ao capital usurário. Tal como o capital usurário surgiu nas condições das formações pré-capitalistas, o capital de empréstimo é fruto do modo de produção capitalista.
No processo de rotação do capital, nas mãos do capitalista industrial forma-se em determinados momentos um capital monetário livre, que não encontra aplicação em sua empresa. Por exemplo, quando o capitalista acumula o fundo de amortização destinado a reposição de partes do capital fixo que se desgastaram, acumulam-se em suas mãos somas de dinheiro temporariamente livre. Estas somas só serão gastas na aquisição de novos equipamentos e máquinas dentro de alguns anos. Se o industrial vende suas mercadorias mensalmente e compra matérias-primas cada seis meses, então ele, durante cinco meses, tem em mãos dinheiro livre. É este um capital inativo, isto é, um capital que não proporciona lucros.
Já em outras ocasiões, o capitalista tem necessidade de dinheiro, como, por exemplo, quando ele ainda não conseguiu vender suas mercadorias, acabadas, mas precisa de comprar matérias-primas. Ao mesmo tempo em que um capitalista dispõe de excedentes temporários de capital monetário, outro tem necessidade dele. Na caça ao lucro, o capitalista esforça-se por fazer com que cada partícula do seu capital lhe proporcione ingressos. O capitalista fornece o dinheiro livre em empréstimo, isto é, para utilização temporária por outros capitalistas.
O capital de empréstimo é o capital monetário que o seu dono concede temporariamente a outro capitalista em troca de certa remuneração. Um traço característico do capital de empréstimo consiste em que ele é aplicado na produção não pelo capitalista ao qual pertence. Tendo a possibilidade de obter dinheiro emprestado, liberta-se o capitalista industrial da necessidade de reter grandes reservas monetárias em inatividade. O empréstimo de dinheiro dá ao industrial a possibilidade de ampliar a produção, aumentar o número de operários e, consequentemente, elevar a grandeza da mais-valia auferida.
Como remuneração ao capital monetário temporariamente posto a sua disposição, o industrial paga ao dono deste capital determinada quantia chamada juro. O juro é uma parte do lucro com que o capitalista industrial retribui ao capitalista emprestador, em troca da concessão do empréstimo. O capital de empréstimo é o capital que produz juros. A fonte do juro é a mais-valia.
O movimento do capital de empréstimo é inteiramente baseado no movimento do capital industrial. O capital dado em empréstimo é utilizado na produção com o objetivo de extrair mais-valia. Por isto, o capital de empréstimo, do mesmo modo que qualquer outro capital, em geral, exprime antes de tudo as relações de produção entre os capitalistas e os operários por eles explorados. Ao mesmo tempo e de uma maneira imediata, o capital de empréstimo exprime as relações entre dois grupos de capitalistas: de um lado, os capitalistas monetários e, de outro, os capitalistas em função, isto é, os industriais e comerciantes.
A fórmula do movimento do capital de empréstimo é D—D'. Aqui, desaparece não apenas o estádio do capital produtivo, mas também o estádio do capital mercantil. Cria-se a aparência de que a origem do ingresso é o dinheiro, em si mesmo, e não a mais-valia produzida através da exploração dos operários na esfera da produção. O fato de que o capital de empréstimo proporcione ingressos, sob a forma de juros, apresenta-se como se isto fosse uma propriedade do dinheiro tão natural como a da árvore que dá frutos. Aqui, atinge seu grau máximo o fetichismo que caracteriza as relações capitalistas.
O proprietário do capital monetário coloca temporariamente seu capital a disposição do capitalista industrial, que o utiliza na produção com o objetivo de apropriar-se da mais-valia. Desse modo, opera-se uma separação entre a propriedade do capital e o emprego do capital na produção, uma separação entre o capital como propriedade e o capital como função.
O industrial ou o comerciante dá ao capitalista monetário uma parte do seu lucro sob a forma de juro. Desse modo, o lucro médio é dividido em duas partes. Aquela parte do lucro médio que permanece com os capitalistas industriais e comerciais chama-se renda do empresário.
Se a forma de juro cria a enganosa aparência de que o juro seria um fruto natural do capital-propriedade, a forma de renda do empresário dá origem a ilusão de que, supostamente, esta renda representaria o pagamento do “trabalho” do capitalista em função, por dirigir e fiscalizar em sua empresa o trabalho dos operários assalariados. De fato, porém, a renda do empresário, como o juro, não tem qualquer relação com o trabalho de direção da produção; representa, sim, uma parte da mais-valia gratuitamente apropriada pelos capitalistas.
A proporção segundo a qual o lucro médio é partilhado entre a renda do empresário e o juro depende da correlação entre a oferta e a procura do capital de empréstimo, da situação do mercado de capitais monetários. Quanto mais alta a procura de capital monetário, tanto mais alta, também, mantidas as demais condições, a taxa de juros. Denomina-se taxa de juros a relação existente entre o total dos juros e o capital monetário emprestado. Em condições normais, o limite superior da taxa de juros é a taxa media de lucro, uma vez que o juro é uma parte do lucro. Como regra, a taxa de juros é consideravelmente mais baixa do que a taxa média de lucro.
Com o desenvolvimento do capitalismo, a taxa de juros revela uma tendência a baixa. Esta tendência decorre de duas causas: em primeiro lugar, a ação da lei da tendência a baixa da taxa média de lucro, uma vez que a taxa média de lucro constitui o limite superior da variação da taxa de juros; em segundo lugar, com o desenvolvimento do capitalismo, a massa total de capital de empréstimo aumenta mais rapidamente do que a procura desse capital. No seio da burguesia, aumenta o grupo dos rentistas, isto é, dos capitalistas proprietários de capital monetário e que não exercem atividades empresariais. Também aí manifesta-se a acentuação do parasitismo na sociedade burguesa. O aumento do capital de empréstimo facilita a centralização dos recursos monetários livres nos bancos e nas caixas econômicas.
No mercado monetário dos Estados Unidos, o juro para empréstimos a curto prazo era, em 1866/1880, de 3,6% (taxa mínima), a 17% (taxa máxima), em 1881/1900, respectivamente, de 2,63 a 9,75%, em 1901/1920, de 2,98 a 8%, em 1921/1935, de O,75 a 7,81%, em 1945/1958, de O,75 a 3,81%.
O Crédito capitalista é a forma de movimento do capital de empréstimo. Por intermédio do crédito, o capital monetário temporariamente livre transforma-se em capital de empréstimo. No capitalismo são duas as formas de crédito existentes: comercial e bancário.
Chama-se crédito comercial aquele que é concedido reciprocamente pelos capitalistas em função — pelos industriais e comerciantes —, ao serem realizadas as mercadorias. O industrial, visando a apressar a rotação do seu capital que se encontra sob a forma mercantil, entrega a mercadoria a crédito a outro industrial ou ao comerciante atacadista, o qual, por sua vez, vende a mercadoria a crédito ao comerciante varejista. O crédito comercial é utilizado pelos capitalistas na compra-e-venda de matérias-primas, combustível, equipamentos, máquinas e também de objetos de consumo. O crédito comercial é geralmente concedido a curto prazo: é dado num prazo não superior a alguns meses. O instrumento do crédito comercial é a letra de câmbio. A letra de câmbio é uma obrigação de dívida, pelo qual o devedor se obriga a pagar ao seu possuidor uma determinada quantia em dinheiro no prazo indicado. A letra de câmbio comercial é uma letra de câmbio segundo a qual os capitalistas pagam uns aos outros determinadas quantias em dinheiro pelas mercadorias compradas a crédito. O crédito comercial, portanto, está ligado as transações comerciais. Devido a isto, ele constitui a base do sistema de crédito capitalista.
Chama-se crédito bancário o que é concedido pelos capitalistas monetários (banqueiros) aos capitalistas em função. Diferentemente do crédito comercial, o crédito bancário não é concedido as expensas do capital aplicado na produção ou na circulação, e sim as expensas do capital monetário inativo e temporariamente livre, que busca aplicação. O crédito bancário é concedido pelos bancos. O banco é uma empresa capitalista que negocia com capitais monetários e atua como intermediário entre os credores e os que tomam empréstimos. O banco, de um lado, recolhe os capitais e ingressos livres e inativos e, de outro lado, coloca o capital monetário a disposição dos capitalistas em função — industriais e comerciantes. Os bancos levam a efeito a centralização do capital monetário livre e a sua aplicação nas esferas da produção e da circulação.
A esmagadora maioria dos capitais que se acham a disposição dos bancos c de propriedade alheia e está sujeita a devolução. Mas, em cada momento determinado, só uma parte insignificante dos depositantes reclama a devolução dos seus depósitos. Na maioria dos casos, as quantias retiradas são compensadas e cobertas pela entrada de novos depósitos. Mas, a situação se modifica radicalmente quando se produzem certas comoções — crises ou guerras. Nesse caso, os depositantes exigem a um só tempo a devolução dos depósitos. Nas condições habituais, o banco só pode conservar em sua caixa quantias relativamente pequenas para o pagamento daqueles que reclamam a devolução dos seus depósitos, enquanto que a grande maioria dos depósitos é distribuída pelo banco mediante empréstimos.
As operações bancárias dividem-se em passivas e ativas.
Denominam-se passivas aquelas operações por meios das quais o banco incorpora recursos a sua caixa. Destas operações, a principal é a aceitação de depósitos. Os depósitos são feitos em diferentes condições: uns a prazo fixo e outros sem indicação de prazo. Neste último caso, o banco é obrigado a pagar a qualquer momento em que seja solicitado, enquanto nos depósitos a prazo fixo a restituição do depósito só se dá após o transcurso do prazo convencionado. Dessa maneira, os depósitos a prazo são mais vantajosos para o banco.
Denominam-se ativas aquelas operações mediante as quais o banco distribui e utiliza os recursos postos a sua disposição. Aqui está incluída principalmente a concessão de empréstimos em dinheiro. Uma destas operações é o desconto de letras de câmbio. Tendo vendido sua mercadoria a crédito, o industrial transfere ao banco a letra de câmbio recebida do comprador. O banco, então, sem esperar que expire o prazo de vencimento da letra, paga imediatamente ao industrial um valor correspondente. Desse modo, o banco credita o industrial e por isso recebe determinado juro sobre o valor da letra. Uma vez que o banco se tornou agora o detentor da letra de câmbio, a ele também se transfere o direito de cobrá-la. Transcorrido o prazo indicado na letra, o devedor terá que pagá-la já não ao industrial, mas ao banco. Através desta operação, o crédito comercial entrelaça-se com o bancário. Outra operação ativa realizada pelos bancos consiste na concessão de empréstimos sob diferentes tipos de garantias: sob hipoteca de mercadorias, documentos mercantis, letras de câmbio, títulos, propriedade imóvel. O banco também efetua empréstimos sob a forma de financiamentos próprios. Finalmente, o banco realiza investimentos diretos de capital nestas ou naquelas empresas.
Portanto, o banqueiro é um comerciante de capital monetário. A fonte de lucro do banco é a mais-valia criada na produção. O lucro do banco, como intermediário no crédito, forma-se da diferença entre o juro recebido pelo banco e o juro que ele paga. Nas operações passivas, o banco paga juros e, nas ativas, ele os recebe. O banco recebe dinheiro em depósito, pagando um juro mais baixo, e o empresta, cobrando um juro mais alto. Com essa diferença, o banco cobre as despesas realizadas com a execução de suas operações; estas operações são gastos puros de circulação. O que sobrar disto, constituirá lucro do banco. O mecanismo da concorrência capitalista encarrega-se de nivelar espontaneamente este lucro com a taxa média de lucro sobre o próprio capital do banco. O trabalho dos funcionários assalariados do banco, da mesma forma que o trabalho dos empregados assalariados do comércio, que realizam as mercadorias, não cria valor nem mais-valia, mas é ele que torna possível ao banqueiro apropriar-se de parte da mais-valia criada na produção. Dessa maneira, os bancários estão submetidos a exploração por parte dos donos dos bancos.
Os bancos desempenham a função de centros de pagamentos. Cada empresa que faz um depósito ou toma um empréstimo, tem uma conta corrente no banco. O dinheiro, depositado em conta corrente, é entregue pelo banco mediante uma determinada exigência, que se chama cheque O cheque constitui uma ordem ao banco, emitida pelo depositante, para que pague determinada soma em dinheiro de sua conta corrente. O banco funciona, portanto, como caixa de um grande número de empresas. Esta circunstância cria a possibilidade de uma larga difusão dos pagamentos compensados. O capitalista A, tendo vendido sua mercadoria ao capitalista B, recebe deste um cheque contra o banco, onde ambos possuem conta corrente. O banco efetua a operação, debitando o valor do cheque na conta corrente do capitalista B e creditando-o na do capitalista A. Quando tais operações são multilaterais, há uma compensação recíproca das dívidas e obrigações por meio de cheques, com amortização total ou parcial, e assim O ajuste de contas de elevadas somas é feito sem que haja participação de dinheiro em espécie.
Suponhamos que o capitalista A compre mercadorias ao capitalista B e pague a este último com um cheque de 100 000 dólares. Ao mesmo tempo, o capitalista B, tendo comprado ao capitalista C mercadorias do mesmo valor, emite em favor deste um cheque de 100 000 dólares, enquanto o capitalista C, por sua vez, entrega ao capitalista A um cheque de 100 000 dólares como pagamento de mercadorias que comprou a este último. Os três cheques, chegados ao banco, compensam-se mutuamente e se amortizam um ao outro. Em consequência, o pagamento da soma global de 300 000 dólares terá sido efetuado sem a presença de dinheiro em espécie.
As empresas costumam ter contas correntes em diferentes bancos, entre os quais processa-se constantemente um movimento recíproco de cheques. Nos grandes centros, os bancos criam câmaras de compensação, onde são compensados reciprocamente, em escala considerável, os cheques procedentes de muitos bancos. Tal organização de pagamentos compensados, baseada na mútua compensação de exigências e obrigações, é denominada clearing. Está muito difundida a amortização recíproca das dívidas por meio de letras de câmbio. A circulação de cheques e de letras de câmbio reduz a necessidade de dinheiro em espécie.
Existem no capitalismo três tipos principais de bancos: comerciais, hipotecários e de emissão. Os bancos comerciais abrem crédito aos industriais e comerciantes geralmente através da concessão de empréstimos a curto prazo. Nestas operações, o desconto de letras desempenha um importante papel. Tais créditos são prestados sobretudo por conta dos depósitos.
Os bancos hipotecários concedem empréstimos a longo prazo com a garantia de bens imóveis (terras, casas e instalações). O aparecimento e a atividade dos bancos hipotecários estão estreitamente ligados ao desenvolvimento do capitalismo na agricultura e a exploração dos camponeses pelos banqueiros. Semelhantes a este tipo de banco são os bancos agrícolas, que efetuam empréstimos a longo prazo para fins de produção.
Os bancos de emissão têm o direito de emitir dinheiro fiduciário — ou notas de banco. Papel particular é desempenhado pelos bancos centrais de emissão. É nesses bancos que se concentram os depósitos de ouro do país. Possuem o monopólio da emissão de notas de banco. Geralmente, os bancos centrais não realizam operações com industriais e comerciantes isoladamente, mas dão empréstimos aos bancos comerciais que, por sua vez, mantêm transação com os empresários. Dessa forma, os bancos centrais de emissão são os bancos dos bancos.
Concentrando as operações de crédito e de pagamento, os bancos contribuem para acelerar a rotação dos capitais e para reduzir a quantidade de dinheiro em espécie e os gastos com a circulação monetária. Ao mesmo tempo, a atividade dos bancos contribui para a centralização do capital, o aniquilamento dos pequenos e médios capitalistas, a intensificação da exploração dos operários e a espoliação dos artesãos. Os empréstimos hipotecários arruínam os camponeses devido ao fato de que os juros de tais empréstimos, absorvendo grande parte dos seus ingressos, conduzem suas economias a falência. A amortização da dívida não raro é feita mediante a venda dos bens e das terras dos camponeses, que caem sob o jugo dos bancos.
Concentrando todos os capitais monetários da sociedade, atuando como intermediários no crédito, os bancos constituem um aparelho específico de distribuição espontânea dos recursos entre os ramos da economia. Esta distribuição não é feita segundo as reais exigências de toda a sociedade, mas de acordo com os interesses dos capitalistas. O crédito propicia a ampliação da produção, mas esta ampliação choca-se cada vez mais com os estreitos limites da procura solvente. O crédito e os bancos intensificam o desenvolvimento da socialização da produção, mas o caráter social da produção entra mais e mais em agudo conflito com a forma capitalista privada de apropriação. Dessa forma, o desenvolvimento do crédito aguça as contradições do modo de produção capitalista e acentua seu caráter anárquico.
Com o crescimento da produção capitalista e o desenvolvimento do crédito, alcançaram ampla difusão as sociedades por ações, que são empresas pertencentes não a capitalistas isolados, mas a um grupo de capitalistas. A sociedade por ações é uma empresa cujo capital é formado pelas contribuições dos seus participantes (acionistas), que são proprietários de determinado número de ações, equivalente a soma de dinheiro invertida por cada um deles. A ação é um título que dá direito ao recebimento de parte da renda da empresa, de acordo com a quantia nela indicada.
As sociedades por ações surgiram ainda no começo do século XVII, mas só se tornaram amplamente difundidas a partir da segunda metade do século XIX, notadamente na indústria, nas ferrovias e nas atividades bancárias. Nos países capitalistas, hoje em dia, as sociedades por ações dominam a parte esmagadora da produção industrial. Nos Estados Unidos, o peso específico das sociedades por ações (corporations) na produção da indústria de transformação constituía 73,7%, em 1904, 87,7%, em 1919, e 92,6%, em 1939.
O desenvolvimento da grande produção capitalista entra em choque com as proporções limitadas dos capitais individuais. A formação de sociedades por ações, que agrupam capitais individuais, é uma das principais vias da centralização do capital, acelerando consideravelmente os processos de concentração da produção, da construção de grandes empresas, de ferrovias, de canais, etc.. Marx escreveu:
“O mundo estaria ainda sem ferrovias se tivesse necessitado de esperar que alguns capitais particulares crescessem o bastante para poder construir uma ferrovia. A centralização, ao contrário, por meio das sociedades por ações, construiu-as como que a um simples aceno de mão.”(62)
Ao realizar a centralização do capital, as sociedades por ações servem de forma por meio da qual o grande capital submete e utiliza em seu próprio proveito os recursos dos pequenos e médios capitalistas.
Formalmente, o órgão supremo de uma sociedade por ações é a assembleia geral dos acionistas, a qual elege a diretoria, nomeia as pessoas para os cargos, examina e aprova as contas da empresa e resolve as questões mais importantes da atividade da sociedade por ações. Entretanto, o número de votos na assembleia geral é fixado de acordo com o número de ações, que dão direito de voto aos seus possuidores. Ao mesmo tempo, a maior parte das ações concentra-se em mãos dos grandes capitalistas. O número de ações pertencentes aos trabalhadores (da pequena burguesia ou da parte melhor remunerada dos operários) é insignificante. De fato, a sociedade por ações encontra-se inteiramente em mãos de um reduzido número de grandes acionistas. Uma vez que os pequenos e médios acionistas estão privados da possibilidade de exercer qualquer influência na marcha das coisas, o que se verifica na prática é que os grandes capitalistas não precisam ter senão menos de metade e frequentemente apenas um terço das ações para controlar a sociedade por ações. A quantidade de ações que dá aos seus possuidores a possibilidade de exercer a plena administração da sociedade denomina-se lote de controle das ações.
Tudo isto refuta as fantasias dos apologistas do capitalismo, segundo as quais as sociedades por ações trariam consigo, supostamente, a “democratização do capital”, a difusão das ações entre as massas populares e a transformação dos trabalhadores em capitalistas. Na realidade, o que se sucede é que com o desenvolvimento das sociedades por ações aumenta a dominação dos magnatas do capital.
Nos Estados Unidos, as vésperas da Segunda Guerra Mundial, nas 200 maiores sociedades por ações, 1% dos acionistas possuía 60% das ações. Em 1948, também nos Estados Unidos, apenas 5% da população adulta possuía ações e 97% das famílias operárias não tinham absolutamente ações ou quaisquer outros tipos de títulos.
O ingresso proporcionado pela ação ao seu possuidor denomina-se dividendo. As ações são compradas e vendidas por preço determinado, que se chama cotação das ações.
O capitalista, que compra ações, poderia depositar seu capital no banco e receber, digamos, 5% de juros. Entretanto, como tal ingresso não lhe satisfaz, ele prefere comprar ações, ainda que isto esteja ligado a um certo risco, mas, em compensação, lhe promete uma renda mais alta. Suponhamos que o capital em ações seja igual a 10 milhões de dólares, dividido em 20 mil ações, cada qual ao preço de 500 dólares e que a empresa tenha dado um lucro de 1 milhão de dólares. A sociedade por ações resolve destinar 250 mil dólares, do milhão de lucro, ao aumento das reservas do capital e distribuir os 750 mil dólares restantes como dividendo entre os acionistas. Em tal caso, cada ação proporciona ao seu proprietário uma renda, sob a forma de dividendo, de 37,5 dólares (750 mil dólares divididos por 20 mil ações), o que corresponde a 7,5% sobre o valor da ação.
Os acionistas procuram vender suas ações por um preço tal, que se fosse depositado no banco o dinheiro resultante da venda, lhe proporcionasse sob a forma de juro a mesma quantia que ele receberia sob a forma de dividendo.
Se uma ação de 500 dólares proporciona um dividendo de 37,5 dólares, então os acionistas procurarão vendê-la por 750 dólares, de vez que, depositando essa quantia no banco, que paga aos depositantes um juro de 5%, seu possuidor receberá 37,5 dólares, sob a forma de juro. Por outro lado, os compradores de ações, levando em conta o risco da inversão de capital na sociedade por ações, procuram comprar as ações o mais barato possível. A cotação das ações depende da magnitude do dividendo e do nível da taxa de juros. A cotação das ações eleva-se quando aumentam os dividendos, ou quando cai a taxa de juros; inversamente, essa cotação diminui quando se reduzem os dividendos ou quando a taxa de juros sobe.
A diferença entre a soma dos preços das ações, emitidas na fundação de uma empresa por ações, e a grandeza do capital efetivamente aplicado nesta empresa constitui o lucro de fundação. Se o capital anteriormente investido na empresa era igual a 10 milhões de dólares e ,a soma dos preços das ações emitidas igual a 15 milhões de dólares, nesse caso o lucro de fundação será de 5 milhões de dólares. O lucro de fundação constitui um dos meios mais importantes de enriquecimento dos grandes capitalistas.
Em consequência da transformação de uma empresa individual em sociedade por ações, há como que um desdobramento do capital, que passa a ter uma dupla existência. O capital efetivamente invertido na empresa, num total de 10 milhões de dólares, existe sob a forma de instalações fabris, depósitos, máquinas, matérias-primas, produtos acabados e, por fim, sob a forma de certa soma em dinheiro mantido na caixa da empresa ou numa conta corrente bancária. Ao lado, porém, deste capital real, com a organização da sociedade por ações surgem títulos de valor — ações no montante (como no exemplo precedente) de 15 milhões de dólares. Cria-se desse modo a aparência do apareci* mento de um novo capital real. Mas, na realidade, as ações são apenas um reflexo do capital efetivo da empresa. Ao mesmo tempo, as ações já têm uma existência independente da empresa: são compradas e vendidas, os bancos fornecem empréstimos garantidos por elas, etc..
Chama-se capital fictício aquele existente sob a forma de títulos de valor que proporcionam ingressos aos seus proprietários. O capital fictício compreende as ações e as obrigações. A obrigação é um título de dívida, emitido por um banco, uma empresa ou pelo Estado e que dá ao seu proprietário um rendimento anual fixo. Os juros das obrigações dos empréstimos, do Estado, por exemplo, proporcionam aos proprietários dessas obrigações um ingresso fixo. As obrigações podem ser vendidas depois de transcorrido determinado prazo.
Diferentemente do capital efetivo, os títulos de valor, que constituem o capital fictício, não constituem valor em si mesmos; neles somente se reflete indiretamente o movimento do capital efetivo. O capital fictício pode aumentar ou reduzir-se sem que lenha havido a modificação correspondente no capital efetivo.
Com o desenvolvimento do capitalismo, o capital fictício cresce muito mais depressa do que o capital efetivo. Isto se explica pela tendência a redução da taxa de juros, o que acarreta a elevação das cotações dos títulos de valor e, consequentemente, o aumento da magnitude do capital fictício; explica-se, ainda, pela rápida propagação das sociedades anônimas e o aumento da quantidade de ações emitidas e também pelo acentuado crescimento do montante das obrigações dos empréstimos estatais.
Os dados seguintes testemunham a considerável inflação do capital fictício: a emissão de títulos de valor em todo o mundo capitalista era (em francos-ouro de antes da guerra) no período de 1881/1890, de 64,5 bilhões, em 1891/1900, de 100,4 bilhões, em 1901/1910, de 197,8 bilhões, e, em 1921/1930, de cerca de 600 bilhões.
Os títulos de valor (ações, obrigações, etc. ), são comprados e vendidos nas bolsas de valores. A bolsa de valores é um mercado de títulos de valor. Na bolsa, são registradas as cotações pelas quais são comprados e vendidos os títulos de valor em cada momento dado; de acordo com estas cotações também são realizadas transações fora das bolsas com títulos de valores, como por exemplo nos bancos, que desempenham importante papel na emissão de ações e obrigações, e no comércio de títulos. Nas bolsas de valores, os títulos são objeto de especulação, em relação com as oscilações de suas cotações, por sua vez decorrentes das variações da oferta e da procura dos títulos de valores. Sobre a oferta e a procura dos títulos influem não apenas as oscilações conjunturais de mercado, como também os acontecimentos políticos. Assim, o agravamento da tensão internacional provoca a elevação da cotação das ações de empresas produtoras de armamentos. E, inversamente, a diminuição da tensão traz consigo urna baixa na cotação das ações de tais empresas. Frequentemente, os que controlam as bolsas põem em circulação falsos rumores, com o fim de influir no sentido por eles desejado sobre a cotação das ações.
Nas especulações bolsistas, ocupam importante lugar as transações a prazo, o jogo na alta ou na baixa da cotação das ações dessas ou daquelas empresas.
Quem mais sofre com as especulações na bolsa são os pequenos possuidores de ações e outros títulos de valor, enquanto que os grandes capitalistas acumulam maiores fortunas. Devido a isto, as especulações na bolsa fazem uma redistribuição dos capitais entre os diferentes capitalistas. Uma vez que os grandes capitalistas e magnatas têm todas as vantagens no jogo especulativo, a especulação contribui para a centralização do capital, para o maior enriquecimento da cúpula capitalista e a ruína dos pequenos e médios proprietários.
A difusão do crédito e, em particular, das sociedades por ações transforma, cada vez mais, os capitalistas em recebedores de juros e dividendos, ao mesmo tempo em que a direção da produção é transferida para pessoas assalariadas — gerentes e diretores. Dessa maneira, acentua-se mais e mais o caráter parasitário da propriedade capitalista.
Mesmo antes de haver surgido o capitalismo, apareceram sistemas monetários metalistas, nos quais o metal atua na condição de mercadoria-dinheiro. Os sistemas monetários metalistas dividem-se em bimetalistas, quando dois metais — a prata e o ouro — servem simultaneamente de equivalente universal e de padrão, e monometalista, quando esta função é desempenhada por apenas um dos dois metais mencionados. Nos primeiros estádios da desenvolvimento do capitalismo (séculos XVI/XVII), os sistemas monetários de muitos países eram bimetalistas. Em fins do século XIX, quase todos os países capitalistas adotaram o sistema monometalista, a base do padrão ouro para a circulação monetária.
Os traços fundamentais do sistema monometalista de padrão ouro são os seguintes: a livre cunhagem de moedas de ouro, a livre troca de outros signos monetários por moedas de ouro e a livre circulação do ouro entre os países. A livre cunhagem de moedas de ouro significa o direito de pessoas privadas de trocar, na casa da moeda, o ouro que possuam por moeda de ouro. Ao mesmo tempo, os donos das moedas podem transformá-las em lingotes de ouro. Estabelece-se, dessa forma, uma relação direta e íntima entre o ouro como mercadoria e as moedas de ouro. Sob este sistema, a quantidade de dinheiro em circulação ajusta-se espontaneamente as necessidades de circulação das mercadorias. Se algum dinheiro torna-se excedente, parte dele sai da esfera da circulação e é entesourado. Se, ao contrário, houver escassez de dinheiro, há uma transferência para a esfera da circulação: o dinheiro entesourado transforma-se em meio de circulação e meio de pagamento. Para atender as pequenas trocas no sistema monometalista, baseado no padrão ouro, são postas em circulação moedas inferiores, cunhadas em metal mais barato: prata, cobre, etc..
Como instrumento internacional dos cálculos das operações comerciais e financeiras, é utilizado o dinheiro universal, isto é, o ouro e seus representantes sob a forma de divisas dos diferentes Estados, notadamente aquelas divisas mais difundidas como meio de pagamento. A troca de divisas de um país pelas divisas de outro país é feita de acordo com a cotação das divisas. Denomina-se cotação das divisas o preço da unidade monetária de um país expresso em unidades monetárias de outros países.
Assim, por exemplo, em 1929 uma libra esterlina inglesa continha 113 gramas de ouro, ao passo que o dólar americano continha 23,22 gramas, isto é, a libra esterlina continha aproximadamente 4,87 vezes mais ouro do que o dólar. De acordo com esta relação entre a libra esterlina e o dólar era também estabelecida a cotação da divisa: então, uma libra esterlina era igual (com certas oscilações) a 4,87 dólares. Em 1948, uma libra esterlina era trocada por 4,03 dólares e em 1958 por 2,8 dólares.
Os cálculos para as operações de comércio exterior também podem ser feitos sem necessidade de recorrer-se ao ouro ou as divisas estrangeiras. Isto se consegue mediante o recurso as letras de câmbio, aos cheques e ao amplo emprego do sistema de clearing, em que são mutuamente compensadas as obrigações de pagamento.
Com a ampliação das relações de crédito e o desenvolvimento da função do dinheiro como meio de pagamento, apareceu e difundiu-se consideravelmente a moeda fiduciária, As letras de câmbio, notas de banco e cheques passaram a funcionar principalmente na qualidade de meios de pagamento. Se bem que as letras de câmbio não sejam dinheiro, podem, porém, servir de meio de pagamento mediante sua transferência de um capitalista para outro.
Os bancos emitem seus próprios títulos de dívida, que constituem moeda fiduciária e desempenham a função de meio de circulação e meio de pagamento. O principal tipo de moeda fiduciária são as notas de banco, ou bilhetes de banco, emitidos pelos bancos em troca de letras de câmbio por eles recebidas.
“O bilhete de banco não é senão uma letra de câmbio contra o banqueiro, pagável ao portador em qualquer tempo e que substitui para o banqueiro as letras de câmbio privadas.”(63)
Isto significa que, no final das contas, é a troca de mercadorias a base dos bilhetes de banco. A princípio, as notas de banco eram emitidas por diferentes bancos e por banqueiros isolados, mas com o correr do tempo sua emissão concentrou-se nos bancos de emissão.
A emissão de bilhetes de banco possibilita fornecer a crescente circulação mercantil os meios de circulação e pagamento, sem que seja necessário aumentar a quantidade de dinheiro metálico. No sistema de circulação monetária, que tem como padrão o ouro, os bilhetes de banco podem ser trocados em qualquer tempo por ouro ou por outro dinheiro metálico. Em tais condições, os bilhetes de banco circulam em paridade com as moedas de ouro e não podem depreciar-se, uma vez que, além da garantia creditícia, também têm a garantia metálica. Com o desenvolvimento do capitalismo, com o aumento da circulação mercantil e do crédito, verifica-se uma diminuição relativa da quantidade de ouro em circulação. O ouro é cada vez mais acumulado nos bancos centrais de emissão, sob a forma de fundos de reserva. Uma série de países capitalistas empreenderam a política de criação de depósitos de ouro a fim de fortalecer suas posições no comércio exterior, para apoderar-se de novos mercados e para preparar e travar guerras. O ouro em circulação passou a ser substituído por bilhetes de banco e depois também por papel-moeda. Se a princípio os bilhetes de banco eram geralmente permutáveis por ouro, posteriormente começaram a ser emitidos bilhetes não permutáveis. Além disso, os bilhetes de banco iam perdendo sua base mercantil: eram emitidos para cobertura de déficits orçamentários e de gastos militares dos Estados burgueses. Tal coisa significava, de fato, a transformação dos bilhetes de banco em papel-moeda.
Como já vimos, o papel-moeda surgiu tendo como ponto de partida a função do dinheiro como meio de circulação. O papel-moeda emitido pelo Estado não é permutável por ouro e representa o dinheiro metálico de pleno valor em sua função de meio de circulação.
A partir da Primeira Guerra Mundial (1914/1918), a maioria dos países capitalistas passou a adotar o sistema de circulação de papel-moeda. Atualmente, nenhum país mantém em circulação dinheiro em moedas de ouro. Nos grandes países burgueses contemporâneos a massa de dinheiro em circulação cresceu várias vezes mais do que o aumento operado na produção e na circulação mercantil. As classes governantes dos Estados capitalistas utilizam-se da emissão de bilhetes de banco não permutáveis, de papel-moeda e de divisas desvalorizadas, como meios de exploração suplementar e espoliação dos trabalhadores.
Isto se manifesta de modo particularmente claro na inflação. Caracteriza-se a inflação pela presença, nos canais da circulação, de uma massa excedente de papel-moeda depreciado pela elevação dos preços das mercadorias, pela queda do salário real dos operários e empregados e pela acentuação da ruína dos camponeses. Com a inflação, lucram os capitalistas e latifundiários em consequência da queda do salário real dos operários industriais e agrícolas. Os Estados burgueses valem-se da inflação como meio para fazer a guerra econômica contra outros países e pela posse de novos mercados. Não raro, a inflação proporciona lucros complementares aos exportadores, que compram mercadorias em seus países com dinheiro depreciado e de baixa cotação e vendem as mesmas mercadorias no estrangeiro, recebendo divisas fortes. Ao mesmo tempo, a inflação provoca a desorganização na vida econômica e a indignação das massas. Isto obriga os Estados burgueses a introduzir reformas a fim de fortalecer o sistema monetário e estabilizar a moeda.
O tipo mais difundido de reforma monetária é a desvalorização. A desvalorização é a baixa oficial da cotação do papel-moeda em relação a unidade monetária metálica, seguida da troca do velho papel-moeda desvalorizado por uma quantidade menor do novo dinheiro. Assim, na Alemanha, em 1924, o antigo dinheiro depreciado foi trocado por um novo dinheiro, expresso em marco-ouro, de acordo com a seguinte cotação: um trilhão de marcos por um marco.
Numa série de casos, a desvalorização não é acompanhada pela troca do antigo dinheiro por um novo dinheiro.
As reformas monetárias nos países capitalistas são realizadas em prejuízo dos trabalhadores, mediante o aumento dos impostos e a redução do salário real.
Notas de rodapé:
(62) K. Marx, O Capital, t. I, 1955, pp. 633/634. (retornar ao texto)
(63) K. Marx, O Capital, t. III, 1955, pp. 417. (retornar ao texto)
Inclusão | 22/03/2015 |