Os fura-greves da Revolução

J. V. Stálin

15 de outubro de 1917


Primeira publicação: “Rabótchi Put” (“O Caminho Operário”), n.° 37. 15 de outubro de 1917. Artigo não assinado.
Fonte: J. V. Stálin, Obras. Editorial Vitória, Rio de Janeiro, 1953, págs. 367-372.
Tradução: Editorial Vitória, da edição italiana G. V. Stálin - "Opere Complete", vol. 3 - Edizione Rinascita, Roma, 1951.
HTML: Fernando Araújo.
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É preciso “suprimir os soviets e os comitês”, dizia o kornilovista Kalédin na Conferência de Moscou, no meio de uma tempestade de aplausos dos cadetes.

É justo, respondia-lhe o conciliador Tsereteli, mas ainda é cedo, porque “não se podem tirar ainda esses andaimes enquanto o edifício da livre revolução (isto é, da contrarrevolução?) não estiver terminado ainda.”

Isso acontecia em princípios de agosto, na Conferência de Moscou, quando pela primeira vez começava a delinear-se o complô contrarrevolucionário de Kornílov e Rodzianko, de Miliukov e Kerenski.

O complô então “não teve êxito”: torpedeou-o a greve política dos operários de Moscou. Mas formou-se a coalizão de Tsereteli e Miliukov, de Kerenski e Kalédin, coalizão contra os operários e os soldados bolcheviques. Verificou-se além disso que essa coalizão era somente um anteparo atrás do qual se organizava um verdadeiro complô contra os soviets e contra os comitês, contra a revolução e as suas conquistas, o complô que estourou depois em fins de agosto.

Podiam saber os social-revolucionários e os mencheviques que, exaltando a coalizão com as “forças vivas” da Conferência de Moscou, trabalhavam para os conspiradores kornilovistas? Podiam saber os pequenos burgueses liberais do Dielo Naroda e os arautos do Izvéstia a serviço da burguesia que, “isolando” os bolcheviques e minando os soviets e os comitês, trabalhavam para a contrarrevolução, entravam para as fileiras dos fura-greves da revolução?

A revolta de Kornílov descobriu todas as cartas Revelou o caráter contrarrevolucionário dos cadetes e da coalizão com eles. Revelou todo o perigo que a aliança entre generais e cadetes constitui para a revolução: demonstrou de maneira nítida que se não houvesse os soviets no interior e os comitês na frente, órgãos contra os quais os defensistas haviam conspirado com Kalédin, a revolução teria sido esmagada.

É sabido que durante as horas graves da revolta de Kornílov os mencheviques e os social-revolucionários foram obrigados a colocar-se sob a proteção dos mesmos marinheiros de Kronstadt e dos soviets e comitês “bolcheviques” contra os quais haviam organizado a coalizão com os Kalédin e as outras “forças vivas”.

Era uma lição salutar e mais que persuasiva.

Mas... a memória humana é fraca. Principalmente a memória dos trânsfugas do Izvéstia e do timorato Dielo Naroda.

Passou-se pouco mais de um mês desde a revolta de Kornílov. Poderia parecer que a aventura de Kornílov tivesse terminado de uma vez por todas. Ao invés, “por vontade do destino” e de Kerenski, nesse curto prazo já conseguimos entrar na fase de uma nova aventura kornilovista. Kornílov “foi preso”, mas os cabeças da aventura de Kornílov estão no poder. A velha coalizão com as “forças vivas” está destruída, mas em compensação foi organizada uma nova coalizão com os kornilovistas: A Conferência de Moscou não se transformou no “Parlamento Longo”, como sonhava o hetman cossaco Karaulov. Mas em compensação foi criado o Antiparlamento propugnado por Kornílov, destinado a “substituir a velha organização dos soviets”. A primeira Conferência realizada pelos reacionários em Moscou desapareceu da cena, mas em compensação instalou-se há poucos dias em Moscou uma segunda Conferência de reacionários, cujo maior expoente, o latifundiário Rodzianko, declara abertamente

ele “ficará feliz se os soviets e a frota perecerem e Petrogrado for tomada pelos alemães”. O governo finge condenar Kornílov, mas na realidade prepara o “advento” de Kornílov, pondo-se de acordo com Kornílov e com Kalédin, procurando afastar as tropas revolucionárias de Petrogrado, aprestando-se a fim de fugir para Moscou, preparando a entrega de Petrogrado, trocando carícias com “os nossos valorosos aliados”, os quais estão impacientes por ver a hora da destruição da frota do Báltico, a tomada de Petrogrado pelos alemães e... a subida de Sir Kornílov ao trono...

Não será talvez evidente que estamos nas vésperas de uma nova aventura de Kornílov ainda mais ameaçadora que a primeira?

Não será talvez evidente que o momento exige de nós uma dupla vigilância e uma completa preparação para a luta?

Não será talvez evidente que agora mais do que nunca são necessários os soviets e os comitês revolucionários?

Onde está a salvação da camarilha de Kornílov, onde está o baluarte da revolução que pode esmagar com toda a potência do movimento de massas o iminente ataque da contrarrevolução?

Certamente não no Antiparlamento servil!

Não será talvez evidente que a única salvação está nos soviets e nas massas dos operários e dos soldados que os seguem?

Não será talvez evidente que os soviets e somente os soviets estão destinados a salvar a revolução da contrarrevolução iminente?

Pareceria que o dever dos revolucionários venha a ser o de defender e reforçar essas organizações, de agrupar cm torno delas as massas operárias e camponesas, de ligar essas organizações em congressos regionais e de toda a Rússia.

Ao invés, os renegados do Izvéstia e do Dielo Naroda, esquecendo-se das “duras experiências” adquiridas durante a revolta de Kornílov, empenharam-se desde há alguns dias em desautorar os soviets, em perseguir os soviets, em sabotar os congressos dos soviets regionais e de toda a Rússia, em desorganizar e em destruir os soviets.

“A função dos soviets locais decai, diz o ‘Izvéstia’. Os soviets cessaram de ser a organização de todas as forças democráticas...

Queremos substituir a organização provisória dos soviets por uma organização da vida social, local e estatal, permanente, completa e multiforme. Quando esboroou-se a autocracia e com ela desapareceu todo o regime burocrático, edificamos os soviets dos deputados como barracas provisórias nas quais podia encontrar asilo toda a democracia. Agora no lugar das barracas constrói-se um edifício estável, de alvenaria, de construção nova, e naturalmente os homens saem um após outro das barracas para entrar na habitação mais cômoda à proporção que são construídos os vários andares.”

Assim fala o Izvéstia> órgão despudorado do Comitê Executivo Central dos Soviets, que arrasta a sua mísera existência graças à longanimidade dos soviets.

Os confusionistas do timorato Dielo Naroda, coxeando atrás do Izvéstia, sentenciam: é preciso torpedear o Congresso dos Soviets, porque nisso está a “salvação” da revolução e da Assembleia Constituinte.

Ouvistes? Os soviets revolucionários que derrubaram o tzarismo e eliminaram seus arbítrios são uma “organização provisória”. “Organização permanente e multiforme” é o servil Antiparlamento a serviço de Alexéev e de Kerenski. Os soviets revolucionários que dispersaram os destacamentos de Kornílov são “barracas provisórias”. “Edifício estável, de alvenaria” é o Antiparlamento, esse aborto kornilovista, destinado a mascarar com suas tagarelices a contrarrevolução que se mobiliza. Ali o frêmito da viva vida revolucionária, aqui o decoro e a “comodidade” do burocratismo contrarrevolucionário. Que há de surpreendente se os trânsfugas do Izvéstia e do Diélo Naroda apressaram-se a transferir-se das “barracas” do Instituto Smólny para o “edifício de alvenaria” do Palácio de Inverno, degradando-se de “líderes da revolução” a lacaios de Sir Alexéev?

É preciso suprimir os soviets, diz Sir Alexéev.

Faremos tudo quanto pudermos, responde o Izvéstia; terminai somente de construir o último “andar” do “edifício de alvenaria” do Palácio de Inverno e “nós” então destruiremos as “barracas” do Instituto Smólny.

É preciso substituir os soviets pelo Antiparlamento, diz Mister Adjemov.

Faremos tudo quanto pudermos, respondem-lhe do Diélo Naroda; deixai-nos antes sabotar o Congresso dos Soviets.

E eles agem assim nas vésperas de uma nova aventura kornilovista, quando a contrarrevolução já convocou seu congresso em Moscou, quando a camarilha de Kornílov já mobilizou suas forças organizando pogroms nos campos, provocando fome e desemprego nas cidades, preparando-se para torpedear a Assembleia Constituinte, reunindo abertamente suas forças no interior e na frente para um novo ataque contra a revolução.

Que é tudo isso senão uma traição aberta à revolução e às suas conquistas?

Quem são eles, senão infames fura-greves da revolução e das suas organizações?

Depois disso, como devem comportar-se para com eles os operários e os soldados organizados nos soviets, se esses senhores do Izvéstia e do Dielo Naroda durante as “horas graves” da futura aventura kornilovista dirigirem-se a eles “como antes”, “com a mão estendida do mendigo”, pedindo que os protejam da contrarrevolução?

Como é de uso, os operários levam para fora da fábrica os fura-greves numa carriola.(1)

Como é de uso, os camponeses expõem no pelourinho os fura-greves que traem a causa comum.

Não duvidamos de que os soviets encontrarão o meio de ferretear da maneira que o merecem os desprezíveis fura-greves da revolução e das suas organizações.


Notas de fim de tomo:

(1) Na época tzarista os operários, quando reentravam nas fábricas após uma greve, em sinal de desprezo carregavam os fura-greves numa carriola e os levavam a circular pelo pátio da fábrica, apontando-os ao escárnio dos companheiros. (retornar ao texto)

Inclusão: 18/02/2024