Primeira publicação: “Rabótchi Put” (“O Caminho Operário”), n.° 3. 6 de setembro de 1917. Assinado: K. St.
Fonte: J. V. Stálin, Obras. Editorial Vitória, Rio de Janeiro, 1953, págs. 273-276.
Tradução: Editorial Vitória, da edição italiana G. V. Stálin - "Opere Complete", vol. 3 - Edizione Rinascita, Roma, 1951.
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A aventura de Kornílov não possui somente um aspecto negativo. Ela, como todo fenômeno da vida, possui também o seu aspecto positivo. A camarilha de Kornílov atentou contra a própria vida da revolução. Isso é fora de dúvida. Mas atentando contra a revolução e pondo em movimento todas as forças da sociedade, galvanizou concomitantemente a revolução: por um lado impeliu-a a dar provas de maior atividade e organização e por outro lado, iluminando a verdadeira natureza das classes e dos partidos, arrancou-lhes a máscara, ajudou a ver sua verdadeira fisionomia.
Deve-se à aventura de Kornílov haverem-se os soviets no interior e os comitês na frente, que estavam a ponto de sucumbir, num ápice reanimado e desenvolvido sua atividade.
Deve-se à aventura de Kornílov haverem todos agora começado a falar sobre a natureza contrarrevolucionária dos cadetes, inclusive os que ainda ontem buscavam “freneticamente” o acordo com os mesmos.
É fato que “depois de tudo quanto aconteceu” nem mesmo os social-revolucionários e os mencheviques julgam mais admissível a coalizão com os cadetes.
É fato que até o “diretório” dos cinco, formado por Kerenski, teve de dispensar os representantes oficiais dos cadetes.
Poder-se-ia pensar que a ruptura com os cadetes tenha se tornado um imperativo dos partidos “democráticos”.
Esse é o aspecto positivo da aventura de Kornílov. Mas, que significa romper com os cadetes?
Admitamos que os social-revolucionários e os mencheviques tenham “definitivamente” rompido com os cadetes na qualidade de membros de um determinado partido. Acaso isso significaria que eles romperam simultaneamente com a política dos cadetes na qualidade de representantes da burguesia imperialista?
Não, não significa isso.
Admitamos que na próxima conferência democrática de 12 de setembro os defensistas criem um novo governo sem cadetes e que Kerenski aceite essa solução! Significaria isso que eles romperam simultaneamente com a política dos cadetes porque estes são representantes da burguesia imperialista?
Não, não significa isso.
A república imperialista francesa oferece numerosos exemplos de como os representantes do capital, sem entrarem eles mesmos no gabinete dos ministros, ali “deixam entrar” “socialistas” pequeno-burgueses, para ficarem escondidos atrás dos bastidores e para saquearem sem obstáculos o país agindo pelas mãos de outrem. A história nos ensina como os figurões da alta finança francesa, colocando à frente do ministério “socialistas” (Briand! Viviani!) e mantendo-se por trás das cortinas, puseram em prática com êxito sua política de classe.
Também na Rússia é plenamente possível a existência de um ministério que, embora sem os cadetes, julgará necessário pôr em prática, como a única possível, a política dos cadetes, por exemplo por causa da pressão do capital aliado, do qual a Rússia tornou-se vassala, ou por outras circunstâncias.
É supérfluo dizer que no pior dos casos os cadetes não terão nada a objetar contra tal ministério, porque no fundo não tem importância quem põe em prática a política dos cadetes, contanto que seja posta em prática!
Evidentemente o centro de gravidade do problema não está nos homens que compõem o governo, mas na política deste.
Por isso quem quiser romper com os cadetes efetivamente e não só para salvar as aparências, deve antes de niais nada romper com a política dos cadetes.
Mas romper com a política dos cadetes significa romper com os latifundiários e transferir suas terras para os comitês camponeses, sem deter-se diante do fato de que essa medida infligirá um sério golpe a alguns bancos onipotentes.
Romper com a política dos cadetes significa romper com os capitalistas e instituir o controle operário sobre a produção e sobre a distribuição, sem deter-se diante do fato de que para realizar isso será preciso atentar contra os lucros dos capitalistas.
Romper com a política dos cadetes significa romper com a guerra de rapina e com os tratados secretos, sem deter-se diante do fato de que essa medida infligirá um sério golpe às camarilhas imperialistas aliadas.
Os mencheviques e os social-revolucionários podem aceitar esse rompimento com os cadetes?
Não, não podem aceitá-lo. De fato, cessariam de ser defensistas, isto é, fautores da guerra na frente e da conciliação das classes no interior.
Estando as coisas nesse pé, a que se reduz o barulho contínuo que os mencheviques e os social-revolucionários estão fazendo em torno do rompimento com os cadetes?
A nada mais que a um rompimento verbal com os cadetes!
O fato é que após o fracasso do complô de Kornílov, depois que foi desmascarada a natureza contrarrevolucionária do partido de Miliukov, o acordo aberto com esse partido tornou-se extremamente impopular entre os operários e os soldados: basta que os mencheviques e os social-revolucionários concluam esse acordo e num ápice perderão os últimos restos do seu exército passado. Por isso, ao invés de um acordo aberto devem concluir um acordo mascarado. Daí o barulho sobre o rompimento com os cadetes, no sentido de mascarar o acordo com os cadetes realizado por trás dos bastidores. Para salvar as aparências: abaixo os cadetes! Na realidade: aliança com os cadetes! Para salvar as aparências: governo sem cadetes; na realidade: governo pelos cadetes, patrícios e aliados, os quais ditam sua vontade que se resume na palavra de ordem: “O poder para os ricos.”
O que se conclui daí é que a Rússia entrou naquela fase do seu desenvolvimento político na qual se torna arriscada a conciliação aberta com a burguesia imperialista. Atravessando o período dos governos social-defensistas aos quais faltam os cadetes, porém que, isso não obstante, têm a tarefa de pôr em prática a vontade da burguesia imperialista.
O “diretório” constituído há poucos dias representa a primeira tentativa de criação de um governo desse feitio.
É de se julgar que a conferência marcada para 12 de setembro, se não se reduzir a uma farsa, tentará provavelmente criar esse governo “mais à esquerda”.
O dever dos operários de vanguarda é desmascarar esses governos aos quais faltam os cadetes e indicar às massas sua verdadeira substância cadete.