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Primeira Edição: Em Marcha, 9 de Dezembro de 1982
Fonte: Francisco Martins Rodrigues — Escritos de uma vida
Transcrição: Ana Barradas
HTML: Fernando Araújo.
Direitos de Reprodução: licenciado sob uma Licença Creative Commons.
Eu ainda espero passear um dia nesta Lisboa numa avenida Alfredo Dinis (Alex), tomar o metro numa estação Revolta da Armada, descansar num jardim Heróis do 18 de Janeiro. E acredito que, quando essas recordações soarem nas ruas de Lisboa, alguma coisa passará delas para o comportamento de todos nós. Será assim como a necessidade de cumprirmos a vontade daqueles que entregaram a vida pelo nosso futuro.
Vocês dirão talvez que mudar placas de ruas é o que menos custa. Mas não é tanto assim. Custa tanto que os ares de Abril, com todos os seus sonhos de vida nova, só tiveram força para mudar a ponte Salazar para ponte 25 de Abril e por ai se ficaram.
Não seria lógico que a Av. Infante Santo se tivesse transformado em Av. Humberto Delgado, por exemplo? Não deveria a Av. da Santa Joana Princesa, estafermo desconhecido, ter passado para Av. Maria Machado, professora primária e militante comunista heróica? Militão Ribeiro não deveria ter tomado o nome da R. António Maria Cardoso? Catarina Eufémia não merecia a Praça do Areeiro?
Mas não mereceu. Ficámos com a Av. Eng. Duarte Pacheco, ministro fascista que fez obras públicas a troco de pratos de sopa a presos e desempregados. Mas não foi possivel ganhar uma Alameda Bento Gonçalves, herói operário morto no Tarrafal. Estranho, muito estranho! O rei D. Carlos, opressor bêbado e devasso, lá continua com direito a uma avenida, mas o Manuel Buiça, que sacrificou a vida para nos livrar do tirano, ainda não ganhou direito nem sequer a um beco. Estranhíssimo!
A explicação, no entanto, é simples. O 25 de Abril não se atreveu a romper com o passado para não incomodar as forças da ordem. Receou que, atirando com os nomes dos lutadores populares à cara da burguesia, ela se enfurecesse. Esforçou-se por demonstrar o seu respeito aos valores estabelecidos. Querem uma radiografia politica do MFA? Vejam os nomes das ruas de Lisboa.
Acham talvez que estou a exagerar? É porque ainda não repararam como os valores culturais deles nos são impingidos como valores nacionais, democráticos, patrióticos, enquanto os nossos valores, os valores da cultura operária e popular revolucionária, são esquecidos, banidos, proibidos.
Chamar Comuna de Paris a uma praça, como isso seria “ideológico”, “demagógico", “partidário'! Mas chamar-lhe Praça do Ultramar — não é tão lógico, normal, educativo?
Eu bem me parecia que isto dos nomes das ruas mete muita luta de classes. Sempre a mesma história...
Observação: Tiro ao Alvo - Coluna de FMR no jornal Em Marcha e no jornal Política Operária.
Inclusão | 06/02/2018 |