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Primeira Edição: Publicado pela primeira vez a 1 de Novembro de 1927 no n.° 250 do Pravda.
Fonte: Obras Escolhidas em Três Tomos, 1978, t2, pp 380-382, Edições Avante! - Lisboa, Edições Progresso - Moscovo.
Tradução: Edições "Avante!" com base nas Obras Completas de V. I. Lénine, 5.ª ed. em russo, t. 34, pp. 394-397.
HTML: Fernando A. S. Araújo
Direitos de Reprodução: © Direitos de tradução em língua portuguesa reservados por Edições
"Avante!" - Edições Progresso Lisboa - Moscovo, 1977
Camaradas! Ainda não tive possibilidade de obter os jornais de Petrogrado de quarta-feira, 18 de Outubro. Quando me comunicaram por telefone o texto completo da intervenção de Kámenev e Zinóviev no jornal Nóvaia Jizn, que não é do partido, recusei-me a acreditar. Mas verificou-se que não pode haver dúvidas, e sou obrigado a aproveitar esta oportunidade para fazer chegar esta carta aos membros do partido na quinta-feira à noite ou sexta-feira de manhã, pois seria um crime ficar calado perante o facto de tão inaudita acção de fura-greves.
Quanto mais séria é a questão prática, quanto mais responsáveis e «destacados» são os homens que actuam como fura-greves, tanto mais perigosa é a sua acção, tanto mais decididamente é preciso pôr na rua os fura-greves, tanto mais imperdoável seria vacilar por causa de quaisquer «méritos» passados dos fura-greves.
Imaginai! Nos círculos do partido sabe-se que o partido discute a questão da insurreição desde Setembro. Ninguém ouviu nada sobre nenhuma carta ou folha de nenhuma das pessoas citadas! Agora, poder-se-ia dizer que na véspera do congresso dos Sovietes, dois destacados bolcheviques manifestam-se contra a maioria e, evidentemente, contra o CC. Isto não é dito abertamente, e com isto o prejuízo para a causa ainda é maior, pois falar com insinuações é ainda mais perigoso.
Do texto da declaração de Kámenev e Zinóviev é perfeitamente claro que eles estiveram contra o CC, pois, de outro modo, a sua declaração não teria sentido, mas não é dito precisamente qual a disposição do CC que contestam.
Porquê?
A coisa é clara: porque o CC não a publicou. Que resulta daqui?
Sobre uma importantíssima questão candente, na véspera do dia crítico de 20 de Outubro, dois «bolcheviques destacados», na imprensa não partidária, e além disso precisamente no jornal que sobre esta questão está de mãos dadas com a burguesia contra o partido operário, atacam nesse jornal uma decisão não publicada do centro do partido.
Mas isto é mil vezes mais infame e milhões de vezes mais prejudicial do que todas as intervenções de Plekhánov na imprensa não partidária em 1906-1907, que o partido condenou com tanta dureza! Então tratava-se apenas de eleições, mas hoje trata-se da insurreição para a conquista do poder!
E sobre tal questão, depois da adopção de uma decisão pelo centro, contestar esta decisão não publicada perante os Rodzianko e os Kérenski, num jornal não partidário — poderá imaginar-se comportamento mais traidor, mais fura-greves?
Consideraria uma vergonha para mim se, por causa das estreitas relações anteriores com estes dois ex-camaradas, eu vacilasse em condená-los. Declaro abertamente que não os considero mais a ambos como camaradas e que lutarei com todas as forças, tanto perante o CC como perante o congresso, pela exclusão de ambos do partido.
Pois um partido operário, a quem a vida coloca cada vez com mais frequência frente a frente com a insurreição, não é capaz de resolver este difícil problema se disposições não publicadas do centro depois da sua adopção são contestadas na imprensa não partidária e se as hesitações e a confusão são introduzidas nas fileiras dos combatentes.
Que os senhores Zinóviev e Kámenev fundem o seu partido com as dezenas de pessoas que se desnortearam ou com os candidatos à Assembleia Constituinte. Os operários não irão para esse partido, pois a sua primeira palavra de ordem será:
«aos membros do CC vencidos na questão do combate decisivo na reunião do CC é permitido irem para a imprensa não partidária atacar as disposições não publicadas do partido.»
Que construam eles próprios um tal partido; o nosso partido operário dos bolcheviques só ganhará com isso.
Quando se publicarem todos os documentos, manifestar-se-á de modo ainda muito mais claro o acto de fura-greves de Zinóviev e Kámenev. De momento, que os operários coloquem a seguinte questão:
«Suponhamos que a direcção de um Sindicato de Toda a Rússia decidiu, depois de um mês de discussão e por uma maioria superior a 80 por cento, que é necessário preparar uma greve, mas sem publicar por enquanto a data ou qualquer outra coisa. Suponhamos que dois membros, com o falso pretexto de terem uma 'opinião própria', começavam depois da decisão não só a escrever para grupos locais sobre a revisão da decisão mas também deixavam sair informações das suas cartas em jornais não partidários. Suponhamos que, finalmente, eles próprios atacavam a decisão em jornais não partidários, não obstante não estar ainda publicada, e começavam a denegrir a greve perante os capitalistas.
Pergunto se os operários vacilariam em excluir do seu meio semelhantes fura-greves?»
No que se refere à situação da questão da insurreição, agora, tão próximo o 20 de Outubro, não posso ajuizar de longe até que ponto a causa é prejudicada pela intervenção dos fura-greves na imprensa não partidária. É indubitável que o prejuízo prático causado é muito grande. Para reparar as coisas é preciso, em primeiro lugar, restaurar a unidade da frente bolchevique com a exclusão dos fura-greves.
A fraqueza dos argumentos ideológicos contra a insurreição será tanto mais clara quanto mais os pusermos à luz do dia. Há dias enviei ao Rabótchi Put um artigo acerca disto, e se a redacção não achar possível publicá-lo, certamente que os membros do partido conhecê-lo-ão através do manuscrito[N220].
Estes argumentos «ideológicos», se assim se pode dizer, reduzem-se a dois: primeiro, a «esperar» pela Assembleia Constituinte. Esperemos, talvez aguentemos — eis todo o argumento. Talvez apesar da fome, apesar da ruína, apesar de esgotada a paciência dos soldados, apesar dos passos de Rodzianko para a entrega de Petrogrado aos alemães, apesar dos lock-outs, talvez ainda aguentemos.
Quiçá e talvez, nisto reside toda a força do argumento.
Segundo, um pessimismo gritante. A burguesia e Kérenski têm tudo optimamente, nós temos tudo mal. Os capitalistas têm tudo maravilhosamente preparado, os operários têm tudo mal. Os «pessimistas» no que se refere ao aspecto militar do assunto gritam esganiçados, mas os «optimistas» calam-se, pois só aos fura-greves agrada revelar certas coisas a Rodzianko e Kérenski.
Tempos difíceis. Uma dura tarefa. Uma dura traição.
E apesar de tudo a tarefa será resolvida, os operários cerrarão fileiras, a insurreição camponesa e a impaciência extrema dos soldados na frente farão a sua obra! Cerremos mais estreitamente as nossas fileiras — o proletariado tem de vencer!
N. Lenine
Notas de fim de tomo:
[N219] A Carta aos Membros do Partido Bolchevique e a Carta ao Comité Central do POSDR(b) reflectem a luta de Lenine contra Zinóviev e Kámenev, que
tentavam torpedear a decisão do CC sobre a insurreição armada. Tendo sofrido uma derrota
na reunião do CC de 10 (23) de Outubro de 1917, na qual se discutiu a questão da
insurreição, no dia seguinte - 11 (24) de Outubro - Zinóviev e Kámenev dirigiram uma
declaração ao CC e uma carta, intitulada Acerca do Momento Actual, aos comités de
Petrogrado, de Moscovo, regional de Moscovo e regional da Finlândia do POSDR(b) e às
fracções bolcheviques do CEC dos Sovietes e do Congresso dos Sovietes da Região Norte.
Nesta carta pronunciavam-se contra a resolução tomada pelo CC sobre a insurreição
armada. Não tendo recebido nenhum apoio na reunião alargada do Comité de Petrogrado
de 15 (28) de Outubro, na qual foi lida a sua carta, e na reunião ampliada do CC de 16 (29)
de Outubro, onde se pronunciaram novamente contra a insurreição armada, Zinóviev e Kámenev passaram à traição directa. Em 18 (31) de Outubro foi publicada no jornal
semimenchevique Nóvaia Jizn uma nota com o título I. Kámenev sobre a «Intervenção», na
qual Kámenev, em seu nome e no de Zinóviev, se declarava contra a insurreição armada,
revelando deste modo ao inimigo uma importantíssima decisão secreta do Partido. Nesse
mesmo dia Lenine escreveu a Carta aos Membros do Partido Bolchevique, e em 19 de
Outubro (1 de Novembro) a Carta ao Comité Central do POSDR(b). Nas suas cartas Lenine
estigmatizava este acto como uma traição à revolução, chamava fura-greves a Zinóviev e Kámenev e exigia a sua expulsão do Partido.
A carta de Lenine ao Comité Central do POSDR(b) foi discutida na reunião do CC de 20 de Outubro (2 de Novembro). Na discussão desta questão, Dzerjínski, intervindo em primeiro lugar, propôs «exigir a Kámenev o completo afastamento da actividade política». Em relação a Zinóviev alegou que este último se escondia da perseguição do poder e de qualquer modo não participava no trabalho do Partido. Na sua intervenção Sverdlov assinalou que o acto de Kámenev não podia de modo nenhum ser justificado, mas que o CC não tinha o direito de o expulsar do Partido. Propôs que se aceitasse a demissão de Kámenev do CC. Stáline interveio duas vezes na reunião do CC. Inicialmente propôs que se levasse a questão à discussão de um plenário do CC, e, quando a sua proposta não foi aceite, declarou na sua segunda intervenção que «a expulsão do Partido não é receita», e propôs obrigar Zinóviev e Kámenev a submeterem-se às decisões do CC, demitindo-os do CC. Este mesmo ponto de vista foi também expresso por Stáline nas colunas do jornal Rabótchi Put, numa nota Da Redacção publicada em 20 de Outubro (2 de Novembro), antes da tomada de decisão do Comité Central. Nesta nota Stáline escrevia que a rispidez do tom do artigo de Lenine (Carta aos Camaradas) não alterava, relativamente a Zinóviev e Kámenev, o facto «de que no fundamental continuamos a ser correligionários». A nota Da Redacção foi publicada por Stáline já depois da declaração de Kámenev no Nóvaia Jizn e de ter sido feita nas cartas de Lenine uma apreciação da conduta de Kámenev e Zinóviev.
O Comité Central aceitou a demissão de Kámenev do CC; Zinóviev e Kámenev foram colocados na obrigação de não fazer nenhumas declarações contra as decisões do CC e a linha de trabalho por ele traçado. Foi também decidido que nenhum membro do CC se pronunciasse contra as decisões tomadas pelo CC.
Lenine não esteve de acordo com a decisão do CC em relação a Zinóviev e Kámenev, e escreveu acerca disto uma carta a Sverdlov, na qual chamava compromisso a esta decisão. (retornar ao texto)
[N220] Trata-se do artigo Carta aos Camaradas, em que Lenine desmascarou toda a inconsequência dos «argumentos» de Kámenev e de Zinóviev, que se pronunciavam contra a insurreição armada. (retornar ao texto)
Inclusão | 12/02/2011 |