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Nós indicamos várias vezes que, nas condições da economia soviética dirigida pela classe operária, que marcha para o socialismo(1), o salário deve elevar-se para assegurar o desenvolvimento geral e cultural desta classe.
Também já indicamos que convém ter em vista, no aumento dos salários na URSS, não somente os interesses do operário isolado, não somente os interesses imediatos, mas ainda e sobretudo as perspectivas da edificação socialista encarada para longos anos.
Que é que exige a edificação socialista? Não se pode concebê-la sem o crescimento da indústria soviética, sem a industrialização do país. Somente por este preço é que a vitória da organização baseada num plano pode ser definitiva na nossa economia; somente por este preço é que as necessidades crescentes do campesinato (e, de início, a necessidade de máquinas agrícolas indispensáveis à extensão da cooperação rural e à marcha do campo para o socialismo) podem ser satisfeitas.
A edificação do socialismo exige que as mercadorias criadas pela indústria estatal sejam produzidas em quantidades tão grandes e a preços tão baixos quanto possíveis, porque só assim é que elas serão acessíveis às grandes massas laboriosas.
O aumento do salário não é possível, nestas condições, senão quando o rendimento, ou mais exatamente, a eficiência do trabalho do operário aumenta simultaneamente.
Aonde se chegaria com efeito, se o salário aumentasse sem um aumento do rendimento do trabalho?
Quanto mais fosse a parte do produto de trabalho do operário tirada antecipadamente para seu consumo, sob a forma de salário, menos produtos suplementares ficariam para o Estado soviético, menos teria ele meios de ampliar a indústria estatal e satisfazer às outras necessidades da edificação socialista.
Quanto mais elevado é o salário — continuando invariável o rendimento do trabalho — maior é a despesa em dinheiro para cada unidade de mercadoria produzida pelo operário, e mais caro custará esta mercadoria ao próprio operário que a comprar (o que pode mesmo reduzir a nada o aumento do salário); de um lado, a alta dos preços das mercadorias inacessíveis ao camponês pode tornar difícil e precário o apoio dado pelos cultivadores à edificação do socialismo.
Um quadro inverso, entretanto, apresentar-se-á aos nossos olhos se o rendimento do trabalho aumentar: o operário pode retirar antecipadamente sobre a quantidade acrescida de produtos de seu trabalho, uma maior parte para a satisfação de suas necessidades imediatas; o produto suplementar deixado à disposição do Estado soviético cresceu, entretanto; e o mesmo aumento do rendimento do trabalho, ao diminuir o preço do produto, assegura seu escoamento nos campos e, de golpe, a solidez do bloco dos operários e camponeses, sem o qual seria impossível, na URSS, edificar o socialismo.
Mas, é preciso dizê-lo, no que concerne ao rendimento do trabalho, a situação está longe de ser brilhante. Se o operário soviético produz atualmente muito mais do que antes da guerra civil e da fome, o rendimento de seu trabalho não atingiu ainda plenamente o rendimento do nível de antes da guerra na Rússia dos tzares. Ora, o rendimento do operário russo era naquela época sensivelmente inferior (cerca de 4 vezes) ao rendimento do trabalho na Europa ocidental e na América.
De que maneira pode, na URSS, aumentar o rendimento do trabalho do operário? Sabemos que o rendimento do trabalho compreendido no sentido comum da palavra (o produto do trabalho de um operário num dia) deve ser, para mais justeza, dividido em duas partes:
O aumento da eficiência(2) do trabalho na sociedade soviética depende, naturalmente, antes de tudo, do aumento do rendimento do trabalho, no sentido próprio da palavra.
Como se pode obtê-lo?
Já sabemos que o desenvolvimento da técnica é a causa essencial do aumento do rendimento de trabalho na sociedade capitalista: introdução de novas máquinas, procura de novas fontes de energia e de matérias primas. No regime soviético este fator tem considerável importância.
A dependência em que se encontra o rendimento do trabalho, da técnica, faz-se sentir a cada passo: se o operário soviético produz, como já vimos, muito menos do que o operário ocidental ou americano, e se ele chega mesmo a produzir muito menos do que ele próprio produziu antes da guerra, é o atraso de nossa técnica uma das causas fundamentais.
A maior parte de nossas máquinas, longe de terem sido melhoradas no curso dos 10-12 últimos anos, têm-se deteriorado, porque nós ainda trabalhamos quase sempre com máquinas usadas antes da guerra e mal começamos (na atualidade parcialmente) a renovação das máquinas de nossas antigas fábricas e a organização de novas fábricas mais aperfeiçoadas.
Mas o fraco rendimento do trabalho não depende exclusivamente da qualidade das máquinas, depende em geral das condições de trabalho do operário: sabe- se, por exemplo, quanto mais uma empresa for iluminada, as máquinas melhor dispostas, melhor a ventilação, maior será o rendimento do trabalho para dado maquinário, etc., e não há necessidade de falar da qualidade dos instrumentos, dos óleos lubrificantes, etc.
Ora, a situação da URSS, sob todos estes aspectos, está longe de ser excelente.
Qual é a causa?
Naturalmente, a causa está, — é preciso repeti-lo, — na instalação técnica das empresas: o capitalismo nos deixou fábricas — maquinário, iluminação, ventilação, oficinas — tudo pronto. Sem uma transformação radical dessas empresas, as condições de trabalho não podem ser profundamente modificadas. A má qualidade das matérias-primas explica-se, até certo ponto, pelo mau aparelhamento técnico das indústrias que as produziam.
Mas dai não decorre de maneira nenhuma que as condições e a organização do trabalho não possam ser modificadas, mesmo com o velho aparelhamento, no sentido do aumento do rendimento do trabalho.
A organização científica do trabalho, da qual já falamos, a propósito do sistema Taylor, pode desempenhar aqui um papel imenso: aplicado racionalmente, desembaraçado do que tem de negativo, de explorador, de especificamente capitalista, pode dar, desde já, resultados apreciáveis.
Em cada empresa, em cada indústria, os defeitos de organização ou de coordenação complicam o trabalho. Toda entrega de matérias-primas e de materiais, fora do tempo exigido, toda discordância entre funcionamento das diversas partes de uma empresa pode provocar grandes dificuldades para a produção. Mesmo os métodos de trabalho dos operários em muitos casos já envelheceram; o trabalhador faz movimentos supérfluos, irracionais, que de nada servem senão para fatigá-lo e constituem um gasto improdutivo do trabalho. Acontece, também, que os materiais, os instrumentos de trabalho que se usam, não tenham sido fornecidos a tempo ou estejam dispostos de tal maneira que, para utilizá-los, tenha de se perder tempo, ou, então, que os materiais e instrumentos sejam insuficientemente adaptáveis aos trabalhos, etc. Uma divisão das funções insuficientemente precisa provoca entre os operários perda de tempo com explicações, etc. O rendimento do trabalho ressente-se de que cada trabalhador cumpra várias modalidades de trabalho, com grande perda de tempo em trocar as ferramentas e materiais e adaptar as máquinas a tarefas modificadas.
Todos estes defeitos podem ser eliminados por uma organização racional: a economia soviética está colocada, neste ponto, em condições muito mais vantajosas que a economia capitalista, cujo desmembramento se opõe à eliminação de numerosos defeitos da produção; os capitalistas são obrigados, para coordenar a ação de várias empresas — o que é de grande importância na organização cientifica do trabalho — a se reunirem em conferências, congressos, que nem sempre levam aos resultados desejados, porque cada capitalista tem em vista, antes de tudo, seus interesses pessoais, este obstáculo não existe entre nós. Os serviços de organização científica do trabalho, criados pelo Estado e pelos sindicatos, em vez de servirem a capitalistas isolados, servem a toda a economia soviética. As empresas soviéticas têm à sua disposição os institutos técnico-científicos, tais como o Instituto Central do Trabalho de Moscou, que estudam as qualidades das matérias-primas, dão as indicações sobre as matérias mais apropriadas para tal ou qual trabalho, etc.
A unidade da economia soviética estatal cria condições particularmente favoráveis à normalização e à “estandardização” da produção. As diferentes peças das máquinas fabricadas por diversas empresas devem combinar entre si, ao ponto de poderem ser trocadas. Todas as empresas fabricam mercadorias determinadas, moldadas sobre um tipo definido, fornecendo, assim, sob um número ou sob uma denominação dada, uma mercadoria idêntica.(3)
A aplicação destas medidas pode aumentar ainda o rendimento do trabalho pela supressão das despesas ocasionadas pelos desenhos de diferentes projetos, pela fabricação de modelos, pela adaptação das peças não padronizadas, etc., e também porque torna fácil, quando uma peça de máquina se quebra, substituí-la por uma estandardização que diminua a perda de tempo das reparações e a duração da interrupção do trabalho da máquina.
É inútil dizer que todas estas medidas de organização racional da produção são aplicadas na URSS, com a participação ativa dos próprios operários(4), ao contrário do que acontece no regime capitalista. O êxito destas medidas está mais garantido porque os operários, participando diretamente da produção, são os melhores conhecedores dos defeitos(5).
Na luta pelo aumento da produção da indústria soviética estatal, não podemos nos contentar com a organização cientifica do trabalho, qualquer que seja a sua importância.
A organização científica do trabalho com uma técnica invariável tem limites que não podem ser ultrapassados.
O aperfeiçoamento da técnica da produção continua sendo, portanto, o nosso objetivo essencial.
Não se concebe a edificação do socialismo sem isso. O regime capitalista deve precisamente ceder passo ao socialismo, porque se tornou, como veremos em seguida, incapaz de fazer progredir a técnica. Quanto mais rapidamente se desenvolver nossa técnica, tanto mais rapidamente chegaremos ao socialismo.
Ora, o desenvolvimento da técnica depende do fundo material de que se dispõe, isto é, antes de tudo, da quantidade de produtos suplementares criados pelo operário soviético para este fim. Também os interesses da edificação socialista exigem, no presente, o aumento da nossa produção, não somente pelo aumento do rendimento do trabalho, mas ainda pelo aumento da intensidade do trabalho.
O operário soviético, em relação à intensidade do trabalho, está muito atrás dos seus camaradas da Europa ocidental e da América. Em certa medida, isto explica-se pelas inferioridades de salário que recebe: quanto melhor vive o operário, mais ele consome e mais ele pode produzir. O melhoramento das condições materiais do operário soviético deve, portanto, conduzir a um aumento da intensidade do seu trabalho (evidentemente nos limites determinados, além dos quais o desgaste do organismo tornar-se-ia muito rápido).
Mas unicamente o aumento do salário, na nossa economia, não pode levar em linha reta a um aumento da intensidade do trabalho. É que, não obstante a brusca mudança do papel do operário na produção soviética (comparado ao seu papel na produção capitalista) certos operários ainda não tomaram consciência da transformação realizada. Em consequência do baixo grau de cultura das massas, que herdarmos do regime capitalista, e da existência do mercado e da semelhança exterior do salário soviético ao salário capitalista, é difícil eliminar as noções e hábitos adquiridos no curso de séculos de regime capitalista: também acontece que o operário soviético se esforça para obter salário mais elevado, sem refletir que ele próprio está interessado, na qualidade de membro da classe operária, de dar o mais possível ao Estudo soviético. Eis aí porque a disciplina nas nossas empresas estatais é muitas vezes insuficiente. Observam-se numerosas ausências, faltas sem justificativa, etc.
Os órgãos soviéticos (de acordo com os sindicatos) tiveram que pensar em dar, nas formas mesmas de salário, um estimulante ao operário.
Explica-se, assim, a existência na URSS de normas de produção e de trabalho por peças.
Ao contrário do regime capitalista, estas medidas não têm senão um caráter provisório; as normas de produção e o trabalho por peças tornar-se-ão supérfluos à proporção que a educação socialista do operário tenha eliminado seus antigos hábitos individualistas(6).
Desde já, porém, sua significação é completamente outra que a do regime capitalista. Seu objetivo é aumentar a produção da indústria estatal, tornando por isso mesmo possível a abolição de toda desigualdade.
Diversos aspectos destas pesadas formas de salário do regime capitalista aqui não existem: o produto do trabalho que excede a norma não é pago jamais a uma taxa inferior ao do produto constituinte da norma, e chega mesmo a ser pago demais. As férias pagas, a jornada de oito horas, as leis de proteção do trabalho, tendem a proteger o operário contra as consequências do trabalho intenso.
O aumento da intensidade do trabalho desempenhou papel relativamente grande em 1923-24, quando as empresas não trabalhavam ainda a pleno rendimento. Tendo sido obtidos sucessos apreciáveis na luta pela boa utilização do tempo do operário e, de maneira geral, pela disciplina do trabalho, observa-se, desde 1926, um novo desvio entre o aumento dos salários e o rendimento do trabalho. Este desvio explica-se em grande parte pela entrada na produção, em via de desenvolvimento, de operários cuja instrução profissional e disciplina deixam muito a desejar. A questão do aumento da intensidade do trabalho, ao mesmo tempo que o do seu rendimento, está de novo na ordem do dia. É preciso, contudo, reconhecer que a tensão do esforço da maioria dos velhos operários atinge aproximadamente o limite do possível (nas presentes condições). A intensidade do trabalho destes operários não poderá aumentar senão paralelamente ao desenvolvimento da cultura e da instrução do operário; a renovação do maquinário das empresas e a organização científica do trabalho continuarão, portanto, como tarefas essenciais.
Notas de rodapé:
(1) E que naturalmente arrasta consigo o campesinato. (retornar ao texto)
(2) Esta expressão nos parece mais adequada do que “rendimento do trabalho", que engloba o rendimento propriamente dito e a intensidade do trabalho. (retornar ao texto)
(3) Não importa que as variedades não sejam numerosas. O trabalho é facilitado bastante e as despesas da produção diminuem. (retornar ao texto)
(4) As “conferências da produção” têm grande importância. Nelas os operários informam sobre as falhas da produção. Essas conferências contribuem para aumentar no operário a convicção de que ele é o senhor da indústria soviética. (retornar ao texto)
(5) O grau de cultura da população desempenha relevante papel na luta pela organização racional da produção. Quanto mais culto o operário, já o dissemos, mais o rendimento do seu trabalho é elevado. Compreende-se, desde então, a imensa importância económica da luta pela cultura, começada pela revolução proletária. Mas o nível de cultura depende, por sua vez, da condição material. (retornar ao texto)
(6) É preciso, sobretudo, eliminar a mentalidade individualista dos novos operários industriais vindos do campo. (retornar ao texto)
Inclusão | 13/09/2018 |