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Os meus inimigos polarizaram os ataques contra mim: é mais fácil, perante um povo que não está politicamente instruído. Concretizaram os ataques numa só pessoa contra a qual lançaram as maiores injúrias e mentiras — o que demonstra a qualidade de certos dirigentes do P.S.. Eu disse que não responderia a essas injúrias nem a essas calúnias. Não sou um político, sou um militar que tem ideias muito precisas sobre a vida da sua Pátria.
E por isso não separa a política da moral. Para mim, política e moral andam a par. Isto não convinha, evidentemente, a uma pessoa que estava na posição em que eu estava. Isso será talvez possível no futuro, dentro de alguns anos, numa sociedade em que os homens serão mais livres, em que não haja relações de exploração. Nesse momento, a política e a moral andarão a par. Hoje, provavelmente, não vivemos em condições que o permitam, mas eu não sou capaz de viver de outra maneira.
Insistiram muito em que eu estaria ligado ao P.C., porque eles sabem que em Portugal fazer uma política anticomunista é rentável, pois os sentimentos de anti- comunismo estão ainda profundamente enraizados no nosso povo.
Eu defendo e sempre tenho defendido que quem devia conduzir o processo rumo ao socialismo são as classes trabalhadoras em estreita ligação com o MFA.
O grupo dos Nove, que efectuou uma revolução de palácio, pensa de outra maneira. Entendem eles que nas condições hoje existentes em Portugal, e nomeadamente, porque não houve levantamento do proletariado no dia 25 de Abril, este processo pode ser dirigido pela pequena burguesia e mesmo por certas camadas da média burguesia, admitindo uma aliança com as classes trabalhadoras, mas mantendo estas à distância. Pela minha parte, penso que esta segunda hipótese não pode levar ao socialismo. Pode levar eventualmente a uma situação comparável à do Egipto ou da Líbia, mas não se trata da construção de uma sociedade socialista.
Penso que, se não houver uma luta firme dos trabalhadores, iremos para um regime de direita. E, a longo prazo, para o fascismo mesmo. Ou vamos para o socialismo ou vamos para o fascismo.
A situação actual do P.C.P. é extremamente complicada e difícil. Participando de uma maneira ou de outra no Governo, o P.C. entendeu que o inimigo principal não era a social-democracia, mas sim o fascismo. Esta ideia está na base da sua política. Mas uma questão que se põe e que se punha já no seio do V Governo é a de saber se devemos lutar pela realização dos objectivos socialistas ou se estamos numa fase na qual deve lutar-se prioritariamente contra o fascismo e a reacção.
Pessoalmente, penso que estas duas hipóteses quase se confundem.
Neste momento é muito difícil distinguir entre os sociais-democratas e os reaccionários de direita e os próprios fascistas, de tal modo se confundem. É esta a minha opinião em face das práticas dos diferentes grupos políticos. Quando vemos este jogo de alianças e de deixar andar, isto tem quase uma lógica inexorável que leva a uma situação que não podíamos ter previsto, O que eu digo é, evidentemente, discutível, mas pessoalmente é o que penso neste momento.
As razões desse caos têm que ser encontradas no tipo de capitalismo que tínhamos em Portugal, na acção que o capitalismo monopolista e a burguesia desenvolveram, particularmente até 11 de Março, contra as lutas muito agudas iniciadas pelo nosso povo.
Apesar disso, chegámos a um ponto em que o capital monopolista de Estado foi gravemente atingido, deixou de funcionar e tem de ser substituído por outras estruturas de funcionamento. E é aqui que começam as grandes dificuldades.
Quando começámos esta reconstrução, particularmente a partir do IV Governo Provisório, os inimigos de classe desenvolveram uma oposição a todas as medidas de saneamento da economia, pelo desencadear voluntário de crises políticas que conduzissem à criação de novos governos. O que atrasa as decisões urgentes que é preciso tomar. Assim, quando o P. S. abandonou o IV Governo foi justamente no momento em que se tinham começado negociações com os partidos para se tomarem medidas de austeridade que são necessárias no nosso contexto económico. Medidas de carácter impopular.
A isto há que acrescentar o boicote internacional que é uma realidade. Particularmente o boicote dos países do mundo ocidental.
Há, também, a falha do aparelho burocrático administrativo do Estado, onde se desenvolvem, também, as lutas de classe e dos interesses das pessoas. O conjunto de todos estes elementos explica, em grande parte, a situação em que nos encontramos...
Abriu o arquivo | 05/05/2014 |