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Trata-se de um cheque de mil e dezasseis contos, quatrocentos e quarenta e sete escudos e cinquenta centavos, mas, mais do que os mil e dezasseis contos, este cheque mostra que vós, no momento particularmente grave da Nação, estais unidos na defesa dos interesses do povo português. Este momento é particularmente grave porque a reacção e o fascismo atacam e continuam a atacar e o fascismo e a reacção só poderão ser combatidos com uma forte unidade do Movimento das Forças Armadas, com uma forte unidade das forças populares e democráticas e com a unidade, que deve ser inquebrantável, entre o povo e o Movimento das Forças Armadas.
A unidade do Movimento das Forças Armadas é hoje uma condição histórica indispensável à sobrevivência da Revolução portuguesa. Mas essa unidade, que todos nós defendemos e pela qual lutamos arduamente todos os dias e todos os momentos — lutastes vós ao colherdes entre os vossos camaradas este dinheiro correspondente a um dia do vosso salário — essa unidade tem de se fazer a favor do povo português, é a unidade com os interesses do povo português; e entre as Forças Armadas devem desenvolver-se esforços no sentido de se ser unido, mas unido na defesa das conquistas revolucionárias depois do 25 de Abril, unido na consolidação dessas conquistas revolucionárias, unido com os interesses do povo português. Só assim tem significado a unidade do Movimento das Forças Armadas, só assim ela pode ser realizada. As Forças Armadas unem-se mas para a defesa dos legítimos, dos verdadeiros interesses do povo português, a defesa das conquistas alcançadas. E não foram poucas as conquistas alcançadas e que estamos em risco de ver perdidas. São todas essas liberdades e direitos individuais que conquistámos: a liberdade de associação, a liberdade de reunião, a liberdade de formação de partidos políticos, o pluralismo, o pluralismo partidário, a reforma agrária, a unidade sindical, as nacionalizações, o controlo da produção pelos trabalhadores, as novas relações de tipo democrático que se têm estabelecido, nas nossas próprias unidades, no seio do Exército, no seio da Marinha, no seio da Força Aérea. Devemos defender essas relações com todo o vigor do nosso entusiasmo e do nosso patriotismo. Pois tudo hoje está em risco. Eu interpreto a vossa vinda aqui como dizendo: presentes no momento em que a vossa Pátria tais riscos sofre. É um momento de patriotismo, é um momento de unidade nacional.
É preciso, acima de tudo, termos a consciência disto: é que o próprio Movimento das Forças Armadas, a sua justificação moral, estão ligados àquilo que ele tem feito até hoje na defesa dos interesses do povo português, em particular das classes mais desfavorecidas. Essa é que é a sua verdadeira grandeza moral e é essa que deve ser defendida ao transe, defendida quotidianamente, tenazmente, firmemente, por todos os militares que têm a honra de pertencer às nossas Forças Armadas, que têm a honra de vestir uma farda. A disciplina, o cumprimento do dever, são inseparáveis hoje na defesa da democracia, na defesa da revolução portuguesa.
No seio das Forças Armadas devemos lutar por que seja realizada essa unidade, entre todos, entre os camaradas. Não há ninguém que não deva lutar por isso, mas unidade no sentido do que eu disse. É a unidade a força do nosso povo, é a unidade na defesa das conquistas democráticas, é a unidade na defesa de tudo o que já se conquistou até hoje, do que aponta para o futuro, para a construção do socialismo em Portugal. São estas as bases da unidade que se deve formar dentro das Forças Armadas, a defesa dos interesses da nossa Pátria, a defesa da independência nacional. É isso que deve formar aquele espírito de corpo que deve existir entre homens que vestem uma farda; mas essa farda o que é que representa? Essa farda representa todas as responsabilidades que temos para com o nosso povo, para com a nossa Pátria. Só seremos dignos de vestir uma farda destas se estivermos à altura dessas responsabilidades.
Exorto-vos para que, nas vossas unidades, luteis tenazmente pela união de todos os camaradas, mas no sentido do progresso, no sentido da liberdade nacional, no sentido da independência nacional.
Deveis combater, com veemência, com tenacidade, tudo o que sejam divisionismos que queiram introduzir dentro das Forças Armadas; as lutas partidárias que, nelas se reflectem, tanto e tão mal têm feito no seio das nossas Forças Armadas.
Há várias maneiras de combater a revolução e uma das maneiras mais eficazes de combater a revolução é dividir o Movimento das Forças Armadas, pois é ele que é o garante das conquistas revolucionárias. Pois se o dividirem com campanhas que são lançadas de fora, com campanhas de boatos, com campanhas de mentiras, com campanhas de falta de esclarecimento, sem a consciência dos próprios militares, isso é cómodo para aqueles que querem dividir o Movimento das Forças Armadas. Mas nós vamos ter a atenção presente nessa actuação e devemos defender, tenazmente, intransigentemente, com o maior patriotismo tudo o que conquistámos até agora. Conquistámos isso em ligação estreita com o povo português. Essa unidade com o povo português é um factor indispensável à vitória desta revolução, como é indispensável o factor da unidade no seio das Forças Armadas, e eu interpreto a vossa presença, aqui, como tal, como dizendo: pronto. E respondendo, firmemente, às questões, aos gravíssimos problemas que o nosso País vive hoje; e o primeiro, o mais grave desses problemas é o neofascismo, é a ameaça da reacção, a ameaça de perda das liberdades e daquilo que conquistámos depois do 25 de Abril. E vós tendes um grande papel a desempenhar nisto, vós e nós, todos os que somos militares, todos os que temos a honra de pertencer ao Movimento das Forças Armadas.
O povo está com os olhos em nós. Não podíamos, de um momento para o outro, ter transformado a Pátria, ter realizado todas as esperanças que as pessoas têm quando há uma revolução, ao julgar que no dia imediato se lhes abre o mundo, que se lhes abre o céu, que tudo vai ser radioso. De maneira nenhuma. Uma revolução é sempre um passo muito difícil na vida dos povos, muito duro; representa sempre um trabalho para o futuro, para as gerações futuras, e não para as gerações presentes. É um trabalho de homens que se sacrificam pelo futuro dos seus filhos e dos seus netos, pelo futuro da sua Pátria. A revolução não é nenhuma brincadeira, as opções que se tomam não são brincadeiras, não as podemos fazer de ânimo leve. Isto é profundamente grave: as nossas atitudes, as nossas opções. O facto de pertencermos ao Movimento das Forças Armadas é profundamente grave; deve impregnar todas as nossas acções e sempre em todas elas a unidade que devemos defender como aquilo de mais sagrado que interessa hoje ao povo português: a unidade na defesa dos interesses do povo português.
Não há unidade por qualquer preço, nem unidade de qualquer maneira, nem a falsa unidade, mas há a unidade bem concreta e bem prática que se traduz numa acção diária, quotidiana, permanente, tenaz, sacrificada até ao último sacrifício, se assim for necessário, pela defesa dos sagrados interesses do povo português, que são os interesses da revolução que desencadeámos em 25 de Abril, que são aquilo que conquistámos daí até agora e que temos hoje a obrigação de consolidar e de defender para que possamos, de facto, construir a tal sociedade que ambicionamos, a sociedade que nos leva a nós, a vós, a todos nós a estarmos presentes num momento desta gravidade e a termos a noção que, de facto, todos os esforços sejam feitos dentro do seio das Forças Armadas, pelo esclarecimento dos nossos camaradas, pelo combate à mentira, à calúnia, pelo brio e pela honra militar, pela dignidade, pela ética militar. Esse combate tem de ser, neste momento, travado por nós na defesa das liberdades do povo português, na defesa da independência nacional.
Início da páginaAbriu o arquivo | 05/05/2014 |