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Nós estamos profundamente sensibilizados por nos concentrarmos entre vós, porque nós consideramos que vós, portugueses que trabalhais aqui, sois portugueses deslocados da vossa Pátria, mas vós, sois também objecto das nossas preocupações e a gente não vem aqui dizer palavras vãs.
Nós estamos aqui na vossa presença e assumimos na vossa presença as responsabilidades que temos assumido em relação ao nosso Povo, em relação ao Povo Português.
Estais aqui a ver-nos? Nós estamos aqui a falar-vos como falamos ao nosso Povo, na nossa terra, e várias coisas vos queríamos dizer.
Eu não tenho um discurso preparado. Isto vai ser difícil, à maneira que as ideias vão ocorrendo; tenho aqui uns apontamentos. A primeira coisa que eu vos queria dizer é que, quando estes nossos compatriotas e os filhos dos nossos compatriotas nos vieram aqui trazer os cravos e nós os abraçámos e até beijámos, nós tínhamos um certo pudor, porque beijos desses e festinhas dessas também faziam o Tomás, o Caetano e Salazar. É por isso que vocês não vêem os homens das Forças Armadas com esse estertor de amizade; essa amizade existe de facto no nosso coração, existia na madrugada do 25 de Abril e foi sob essa amizade em relação ao nosso Povo que nós jogámos toda a nossa vida.
Jogámos nós e tem-na jogado o nosso Povo nos momentos de dificuldade; nos momentos em que a reacção mais fortemente nos tem atacado. Nós não somos aqui mais do que os outros, nós somos apenas uns entre os outros e se nós não estivéssemos misturados com o Povo, e se não houvesse unidade entre o Movimento das Forças Armadas e o Povo nós não seríamos nada.
E isto que nós estamos a dizer não são palavras, não é literatura, não são palavras vãs. Vós tendes a obrigação e o direito de terdes os olhos postos em cima das nossas acções, verdes se somos verdadeiros ou falsos, julgardes os nossos actos, nós somos transparentes e estamos à frente. Ã frente, quer dizer, não estamos a comandar, nós estamos perante o nosso Povo, assumimos as nossas responsabilidades é vós é que julgareis, pois vós é que nos julgareis.
O nosso Povo vive hoje um raro momento da sua História. Poucas foram essas oportunidades que o nosso Povo tem tido na nossa História de realizar os seus mais profundos anseios. Foi em 1385, teve depois em 1820, teve em 1836, teve em 1910 e essas oportunidades e essas esperanças foram frustradas. É um dever de honra do Movimento das Forças Armadas, é um dever de honra do nosso Povo não deixar que mais uma vez as esperanças do futuro sejam frustradas.
E as nossas esperanças, as nossas esperanças não serão frustradas se o nosso Povo compreender que tem hoje o seu futuro, o seu destino nas suas próprias mãos e que as Forças Armadas são o seu melhor aliado.
O Portugal do futuro tem de ser construído por todos, por todos nós, os que estamos em Portugal e os que estão fora de Portugal, essa é a nossa responsabilidade, vós não podereis pensar que quem há-de construir o Portugal do futuro são aqueles tipos que lá estão no Terreiro do Paço. Não é assim que deveis pensar.
O nosso futuro terá que ser de facto criado pelo trabalho do nosso Povo, quer nas cidades, quer no campo, pelo trabalho dos homens, pelo trabalho das mulheres, pelo trabalho de todos, pelo trabalho das próprias crianças ao estudarem e ao aprenderem para serem no futuro homens conscientes, homens capazes de servirem os seus compatriotas, de saberem, de terem consciência, de serem letrados, de serem capazes de ser quadros, de serem trabalhadores afinados; essa é que é a nossa responsabilidade neste momento e, para isso, é absolutamente necessária uma coisa essencial, que é a unidade, a unidade de todos os trabalhadores; a unidade de todos os trabalhadores, acima das lutas partidárias.
O nosso futuro, o nosso futuro e o vencermos as duras dificuldades em que nos encontramos, passa por vencer a batalha da produção. É isso vital para o Povo Português, vencer na produção e a produção é feita com o trabalho dos portugueses. É esse o nosso primeiro dever, é o trabalho.
E porquê? Porque hoje o trabalho em Portugal tem outro significado. O trabalho que se desenvolve em Portugal é desenvolvido no sentido do futuro, da criação do futuro das classes trabalhadoras dos portugueses, O trabalho hoje em Portugal tem outro sentido, do que tinha antes do 11 de Março por exemplo, e é preciso que os trabalhadores tenham a consciência disso. Quando nós pedimos aos trabalhadores que polarizem toda a sua acção, precisamente no trabalho, nós não estamos a pedir sacrifícios a uns em benefício de outros, porquê nós já demos passos com as nacionalizações, que fizemos, com a nacionalização da Banca, com a nacionalização dos Seguros, com a nacionalização de sectores básicos da produção, bem como o arranque da Reforma Agrária, nós estamos a trabalhar para o futuro. O trabalho tem hoje um sentido diferente em Portugal, é isso que os trabalhadores devem ter bem presente, que trabalho tem hoje um sentido diferente em Portugal, que a sua liberdade passa por isso por unia grande consciência no trabalho e é preciso, portanto, que haja a maior unidade nos esforços dos trabalhadores, a unidade à volta dos interesses verdadeiramente nacionais. Todos nós, cada um de nós, cada um de vós, tem o direito e tem o dever de ter ideias políticas e de pertencer ao partido que queira pertencer.
Mas os partidos progressistas, os partidos verdadeiramente progressistas e patriotas têm de se unir na construção do futuro de Portugal.
A nossa Revolução compreende as mais largas liberdades, nós não queremos um partido único, não foi para isso que fizemos o 25 de Abril, nós queremos é a unidade entre as forças do progresso, porque há muitos pontos comuns entre os diversos partidos e nós temos que trazer para cima aquilo que nos une e não aquilo que nos divide.
É a isso que tendes de estar bem atentos, tendes de estar bem atentos, atentos a quem vos une e a quem vos divide, porque quem nos une são os nossos camaradas, são os que estão connosco, quem nos divide, são aqueles que não estão connosco. Portanto, tendes de ser vigilantes, eu estou-vos a falar como se vos estivesse a falar lá em Portugal, vós tendes de ser vigilantes, vigilantes na defesa das conquistas da nossa Revolução. Como a podereis defender aqui? Esclarecendo os camaradas uns aos outros, não vos deixando dividir; séria extremamente inglório que os portugueses, já sacrificados por viverem fora e longe da sua Pátria ainda por cima se dividissem e não se unissem, precisamente, porque estão longe. Deveis fazer tudo pela vossa unidade e deveis ter presente o seguinte: que há muitos camaradas que estão divididos, mas é por falta de compreensão, por falta de lucidez, por não perceberem o que se está a passar e, então, o dever dos mais esclarecidos é chamar a atenção aos outros menos esclarecidos, com paciência e com firmeza. Vós deveis defender sempre a vossa unidade, não vos deveis impacientar, não volteis as costas uns aos outros, uni-vos e uni-vos.
Vós se estiverdes aqui unidos contribuireis para a defesa da Revolução, mesmo aqui tão longe onde estais; não vos deixeis dividir e tende atenção ao seguinte: muitos reaccionários e muitos fascistas portugueses fugiram de Portugal e vieram para o estrangeiro e estão entre vós. A reacção, aqueles homens, aqueles homens que dantes exploravam o povo português têm hoje o maior interesse em o dividir, em dizer mentiras sobre o que se passa na nossa Pátria. Em dizer que o Movimento das Forças Armadas pertence a este partido ou àquele partido, em que há partidos discriminados, em que não há liberdade em Portugal.
Anda-se agora a dizer, agitou-se agora aí uma campanha em que não havia liberdade de imprensa em Portugal. A reacção tem interesse e o maior interesse em nos dividir e nós temos verificado o seguinte: que cada vez são mais complicados e mais habilidosos os métodos, as maneiras, os modos que a reacção utiliza para nos dividir, para meter «cunhas» entre nós. Eles até querem dividir o Movimento das Forças Armadas. Às vezes começam assim a dizer: «O Coutinho vai tomar a Presidência da República ou o Coutinho vai ser Presidente do Conselho».
Pois bem, os elementos do Conselho da Revolução estão tão unidos entre si, como os dedos das suas próprias mãos; eu não vos venho aqui mentir.
Portanto, deveis ter sempre isto em atenção, quer dizer, preservar a vossa unidade e, para isso, deveis sacrificar-vos, deveis esclarecer os vossos camaradas, deveis gastar horas fora do vosso trabalho, deveis instruir-vos, deveis falar com as vossas mulheres, deveis desenvolver a vossa capacidade criadora, a vossa imaginação, como apoiar aquela Revolução, que lá em Portugal está a decorrer e de que amanhã os nossos filhos e nossos netos virão a beneficiar.
Isso deve ser, deve ser o motivo da vossa atenção, deveis debruçar-vos sobre esses problemas, porque depois do 25 de Abril, depois sobretudo, do 11 de Março, os portugueses, os portugueses são verdadeiramente portugueses, têm consciência do processo revolucionário em que estão inseridos, já não podem viver da mesma maneira.
A gente não pode chegar à tarde, ir para casa, meter-se nas pantufas, ver a televisão e estar-se nas tintas para os outros. Isso acabou.
Os patriotas, os verdadeiros patriotas e os verdadeiros nacionalistas — e hoje a palavra nacional e nacionalista tem um significado completamente diferente do tempo do fascismo — , os verdadeiros patriotas devem ter a consciência disso.
Mas eu compreendo que, neste momento, nem todos tenham a consciência disso, porque primeiro que nós tenhamos a consciência daquilo que se passa em nossa volta, para que se reflicta bem primeiro dentro de nós toda essa vida que se passa à nossa volta e a compreendamos, leva tempo, a todos nós leva tempo, por isso devemos ter compreensão para aqueles que estão menos interessados na vida da nossa Pátria hoje, devemos ter compreensão para esses e ajudá-los. E, então, se nós diariamente, fizermos qualquer coisa pela unidade, pela unidade dos camaradas, dos homens que trabalham fora da sua Pátria e se, diariamente, cada um de vocês fizer qualquer coisa assim, está a fazer assim qualquer coisa pela sua, nossa, Pátria.
É muito distorcida, nós verificamos que é distorcida, a realidade do que se passa em Portugal. Quando lá fordes, nas vossas férias, vós devereis procurar bem com os vossos olhos qual é a realidade do que se passa em Portugal. Deveis conversar com os vossos conterrâneos; evidentemente, que encontrareis pessoas que poderão não compreender a Revolução. Encontrareis pessoas que até estarão com medo da Revolução. Deveis estar preparados para isso. Porque a nossa Revolução...
O que significa Revolução?
Revolução significa uma transformação muito profunda, modificações bastante profundas, modificações nas estruturas, nas organizações, nas empresas ao nível do Estado, etc.. Não significa andar aos tiros. Se for preciso, para defender a nossa Revolução andar aos tiros, nós andaremos aos tiros. Mas nós pretendemos fazer a nossa Revolução em paz e esta Revolução é única na História do Mundo e nisso podereis ter um grande orgulho de serdes Portugueses.
Onde é que já se viu fazer uma Revolução que levasse a transformações tão profundas como essas que têm sido feitas, apenas com quatro mortos? E, mesmo esses, não foram em combate. Isto é porque temos o nosso Povo ao lado do Movimento das Forças Armadas. Mas vós devereis ter, portanto, também muito cuidado na Informação. Vós e nós, nós também temos responsabilidade em mandar para cá uma Informação objectiva, isto é, uma Informação verdadeira, uma Informação que não desiluda, que não vos diga o contrário daquilo que se passa na vossa Pátria. Nós, Movimento das Forças Armadas, e o Governo Provisório também temos essa obrigação. Isso é outro ponto, é o ponto da Informação.
Nós não podemos assim falar, só assim, porque há também muitos franceses amigos de Portugal e que estão connosco. Mas o que estamos nós procurando? Nós estamos procurando caminhar para o futuro, para uma via de transição, para uma via de transição que nos leve ao socialismo, ao socialismo autêntico. É isso que estamos procurando fazer.
Estamos dando os primeiros passos nesse sentido. Esses passos são muito difíceis. Nós não podemos construir o socialismo, nem ninguém no Mundo de um dia para o outro. Nem podemos dizer em tal ano, em mil novecentos e tal, teremos o socialismo em Portugal.
Ninguém o pode dizer. Ele tem de ser construído pelo nosso próprio Povo, à medida do seu trabalho, à medida das lutas que vai desenvolvendo e, então, todos nós temos que amadurecer, quer dizer, temos que nos preparar política e ideologicamente. A nossa consciência tem que se ir preparando para os passos que vamos dando em frente. E a gente deve dar os passos em frente que possam ser compreendidos pelo nosso Povo, para que ele acompanhe em cada instante a sua Revolução. Nós não podemos dar passos em frente que não sejam compreendidos pelo nosso Povo. Ele tem que ir compreendendo, porque é ele que é o construtor dessa Revolução.
Eu gostava agora de falar-vos de certos aspectos que lançam a confusão em muitas cabeças, que não estão suficientemente esclarecidas.
Vamos agora ver uma coisa. O Movimento das Forças Armadas não deseja implantar nenhuma ditadura em Portugal. Se o desejasse fazer, já o tinha feito e o último dia em que o podia ter feito, foi no dia 11 de Março. Pois bem, nesse dia 11 de Março em que nós podíamos ter imposto um regime mais autoritário porque fomos atacados com acções violentas para nos destruir, nesse dia, numa Assembleia das Forças Armadas, que houve nessa própria noite, todos nós votámos que deveria haver eleições em Portugal, no dia em que estava marcado.
As eleições em Portugal foram um êxito.
E um êxito neste sentido: todo o nosso Povo, mais consciente ou menos consciente, quis afirmar, pela primeira vez na vida, que tinha direito a voto e todos lá foram para mostrar que eram homens.
Então nós tivemos essa votação maciça, que deixou a Europa estupefacta, porque eles julgavam que a gente andava para lá só em desordem, que não havia paz em Portugal. E mais, a reacção e os reaccionários procuraram por todos os meios, que as eleições fossem perturbadas. Primeiro, eles diziam: «os tipos do M.F.A. não querem fazer eleições, para continuarem com o poder na mão» e depois, quando viram a nossa firme vontade em as fazer, eles queriam, então, que elas não se pudessem realizar. Queriam fazer distúrbios, nesse dia, para dar lugar a uma desordem monumental em Portugal, para nos desacreditar perante o Mundo. Era isso o que a reacção queria fazer. Mas o Povo Português reagiu com enorme sentido de civismo. Foi para as eleições afirmar, ali, a sua vontade. Afirmar, digamos, afirmar-se como homem, era, sobretudo, esse o sentido. Quem ia ali pôr um voto, ia afirmar-se, ia a dizer: eu sou um português que também tenho direito a pronunciar-me sobre a vida do meu País.
Mas, é preciso explicar o significado das eleições para a Assembleia Constituinte. Ao longo do processo revolucionário, nós, e os partidos políticos portugueses, nós chegámos à conclusão, que não podíamos entregar imediatamente o poder aos partidos políticos. Nós chegámos a essa conclusão e não fomos só nós que chegámos a essa conclusão. Os próprios partidos políticos progressistas têm a noção de que, sem o apoio e sem a unidade das Forças Armadas, nada poderão fazer em Portugal.
Pois bem, isso foi entendido e, então, nós, em discussão, em conversa com os partidos políticos, com todos aqueles que quiseram conversar connosco, nós estabelecemos um pacto, isto é, umas regras para presidirem ao futuro dos passos do nosso País, durante um período transitório. Um período transitório foi fixado de três a cinco anos. Então, durante esse período transitório, o nosso País deverá ter instituições que, agora, vão ser elaboradas, pela própria Assembleia Constituinte. Deverá ter instituições que se adaptem à realidade do que se passa em Portugal.
E o que é que se passa em Portugal? Há duas realidades fundamentais que temos de ter todos presentes e que nos ajudam a compreender o que vai na nossa Pátria. Uma é a existência do Movimento das Forças Armadas progressista, autónomo, que quer implantar o socialismo em Portugal. Outra realidade é a existência das Forças Populares, dos Partidos Políticos, as forças populares com os seus respectivos partidos, as forças trabalhadoras, os sindicatos, as associações, as cooperativas, etc.. Quer dizer, nós temos duas realidades. Temos uma realidade, digamos, da força militar, do braço armado do nosso Povo e temos outra realidade do Povo que não está fardado, mas quer o mesmo que o Povo que está fardado. Temos estas duas realidades. Então nós estabelecemos que a próxima Constituição vai ter duas Assembleias. Uma, que já existe, que é a Assembleia dos Delegados do Movimento das Forças Armadas, constituída por Oficiais, Sargentos e Praças e que representa a vontade do Movimento das Forças Armadas ao lado do seu próprio Povo. Essa é uma das Assembleias. A outra Assembleia há-de ser uma Assembleia Legislativa, livremente eleita pelo os partidos. Tudo foi livremente discutido. Temos lá as suas respostas, as suas respostas arquivadas, e que eles nos disseram que estão dispostos a honrar e nós acreditamos que eles as honrem, porque nós acreditamos na nossa palavra e nós temos que acreditar na palavra alheia até prova em contrário. Portanto, foi feito esse pacto, esse pacto estipulou essas duas Assembleias.
Vamos voltar agora às duas Assembleias.
Estas duas Assembleias, quando estiverem constituídas, reúnem-se e vão escolher, só os deputados dessas duas Assembleias, vão escolher, em nome do nosso Povo, porque têm mandato para isso, porque uma Assembleia já foi eleita pelo Povo e a outra foi eleita pelos Militares, que também são Povo, vão escolher o Presidente da República que deverá ser também o Presidente do Conselho da Revolução.
Eu esqueci-me de dizer uma coisa. A Assembleia dos Militares é presidida pelo Conselho da Revolução de que fazem parte: o Senhor Presidente da República, eu, o Senhor Almirante Coutinho; fazem parte desde o Senhor Presidente da República até um tenente, que nós lá temos. Temos um tenente no Conselho da Revolução. E esse tenente tem um voto, como tem um voto o Senhor Presidente da República. E nem por isso a disciplina é menor e o respeito é menor entre nós; antes pelo contrário, nós somos guiados pela disciplina consciente, pela disciplina consentida, não somos uns homens a cumprir uma ordem e a resmungar e aborrecidos contra o superior e a gente a dizer: este malandro e este..., ou assim ou assado, manda-nos fazer isto e tal. Entre nós não há disto, porque temos a tal disciplina consentida, essa disciplina consentida é aquela que melhor pode levar a todos os sacrifícios, incluindo o sacrifício da própria vida, essa disciplina consentida.
Então, então essa Assembleia elegerá o Presidente da República, que tem de ser um homem da confiança do Movimento das Forças Armadas e tem que ser um homem das Forças Armadas. Isso, está estabelecido no pacto. E para quê? Para que se garanta esta unidade Povo-Forças Armadas, no período transitório. Então, depois o Presidente da República nomeará um Primeiro Ministro, que tem de ser um homem da confiança do Movimento das Forças Armadas e da Assembleia Legislativa, ou seja, da Assembleia Popular. Esse Primeiro Ministro terá de prestar contas; constituirá depois o seu Governo. E como é que vai constituir o seu Governo esse Primeiro Ministro, depois? Ele vai constituir o seu Governo tendo em atenção a composição da Assembleia Legislativa e, tendo ainda em atenção, que certas pastas terão de ser forçosamente da confiança dos homens das Forças Armadas, para que o processo siga verdadeiramente para a frente. E quais são essas pastas? — Eu peço ao Senhor Almirante, que me corrija, se eu me enganar — são: as da Administração Interna, que é aquela que está ligada ao uso das polícias e das guardas Republicanas e tudo isso. Isso tem de estar nas mãos das Forças Armadas. Porque nós não desejamos, nós os Militares não desejamos voltar a ver, na nossa Pátria, um Governo, que se venha a servir das Forças Armadas, para dominar o seu próprio povo. Já tivemos essa experiência. Isso é preciso, isso deve estar muito bem claro na cabeça de todos os portugueses. Os Militares não consentirão mais, em servir de jogo em interesses, que não sejam os interesses da sua própria Pátria. E por isso, tomam sobre os seus ombros a responsabilidade da continuação do processo revolucionário, no mínimo, durante este período transitório, para que, no fim deste período transitório, possamos, então, ter democratizado já suficientemente a nossa Pátria, de modo que a possamos entregar de facto ao nosso Povo. Mas, nós não estamos dispostos, nem aceitamos, podem estar bem certos disso, não haverá Governos Civis, que venham a dominar as Forças Armadas e a servir-se delas, como se serviram delas o Salazar e o Caetano.
Portanto, esse Governo, será responsável perante o Senhor Presidente da República e perante a Assembleia Legislativa, mas a responsabilidade última da condução do País estará a cargo do Conselho da Revolução que exerce a Presidência da Assembleia das Forças Armadas. Ora bem, isto foi o contrato, foi o compromisso de honra que nós assinámos com os partidos, e então, foi estabelecido o seguinte: as eleições para a Constituinte servem para arranjar homens que façam a nova Constituição de acordo com as regras gerais, que eu aqui vos disse, e que foram livremente aceites pelos partidos e que foram confirmadas pelo nosso Povo, porque o nosso Povo teve conhecimento antecipado, antes das eleições, o nosso Povo soube bem, porque foi publicado em todos os jornais, o compromisso de honra que foi assinado entre nós e os partidos e, portanto, quando o nosso Povo foi votar e votou no partido A, B ou C, ele sabia que esse partido se tinha comprometido com o Movimento das Forças Armadas a elaborar uma Constituição, que não permitisse, que as conquistas obtidas até hoje pela nossa Revolução fossem depois arrasadas, pela Assembleia Constituinte. Portanto, o objectivo deste acordo é garantir que na Constituição, na próxima Constituição, que vai ser elaborada pela Assembleia, que vai tomar posse no dia 2, na segunda-feira, é garantir que essa Constituição consagre na Lei, sem qualquer dúvida, as conquistas que já foram obtidas pelo nosso Povo e que estejamos ao abrigo de ter uma Assembleia Constituinte que chegasse lá e depois quisesse anular aquilo que se tinha feito. Portanto, a Assembleia Constituinte tem um finalidade: elaborar uma Constituição e fora destas linhas gerais, muito gerais que eu lhes disse, porque há outras coisas também estabelecidas na Constituição futura, como por exemplo, que não poderá ser aprovada nenhuma lei que contrarie todas as conquistas já alcançadas até hoje pelo Povo Português, portanto, não poderá ser aprovada nenhuma lei que vá contra as nacionalizações ou contra as medidas que estamos tomando na agricultura. Portanto, esses homens que vão para a Assembleia Constituinte têm uma função bem determinada e foi também estabelecido o seguinte: que o Governo Provisório, o Governo que já vinha do antecedente, continuaria com o seu trabalho e a sua missão e que, a Constituição e os votos da Assembleia
Constituinte, não teriam reflexo na constituição do Governo Provisório. 0 Governo Provisório continuaria no seu caminho, porque tem de ser um Governo operativo, porque tem de ser um Governo de campanha, de autêntica campanha, é uma espécie de Governo de guerra que não pode parar a sua actividade nem pode estar sujeito às questões partidárias, que levem um dia a ter um Governo e no dia seguinte a ter um Governo diferente. Isso não pode haver no nosso País. Portanto, é assim que se explica aquilo que faz confusão a algumas pessoas. Mas então, perguntareis «porque é que vocês uma vez que as eleições deram tantos por cento a tal partido, tantos por cento a outro partido e assim sucessivamente, porque é que vocês agora não mudam o Governo e não fazem isso tudo de acordo com as percentagens obtidas nas eleições?» Não fazemos, porque isso foi tudo convenientemente estudado de harmonia com os interesses superiores do País e foi previamente estabelecido no compromisso de honra entre nós e os partidos políticos.
É esta a razão por que há pessoas que fazem confusão, não compreendem isso, não percebem o que é, o que tem sido . o desenvolvimento desta nossa Revolução, as forças que estão nela empenhadas, não percebem que um Povo que está cinquenta anos debaixo do fascismo, no dia seguinte não acorda logo de maneira que se possa viver numa Democracia como outras que já têm uma certa estabilidade ao longo de anos; e percebemos que é preciso exercer uma actividade pedagógica, é preciso uma actividade de ensino. Nós, logo no dia 26 de Abril, quando eu tomei posse, eu pedi aos partidos que ensinassem ao nosso Povo o que era a democracia, que o preparassem para isso, que exercessem uma actividade pedagógica. Simplesmente, nós temos tido graves problemas a esse respeito. Tem havido lutas partidárias demais para uma jovem democracia como a nossa. E o Movimento das Forças Armadas está vigilante, e está atento e de maneira que, estabeleceu assim este período de transição durante o qual o Povo tem todos os direitos, todas as liberdades e todas as garantias. E durante o qual consolidaremos o nosso sistema, o nosso regime. Esta, digamos, é uma ideia que vós tendes de ter e até que tendes de explicar aos vossos amigos e aos vossos camaradas, nós até poderemos promover que sejam enviados muitos exemplares do pacto que foi assinado, para vós lerdes e verdes com os vossos próprios olhos, provavelmente, não fostes instruídos nisso, para verdes como foi assim que as coisas se estabeleceram.
Nós, o que é que pretendemos? Nós pretendemos estabelecer no nosso País um socialismo que tenha as maiores liberdades com a existência de partidos políticos livres, com a existência das garantias individuais, com a liberdade de imprensa em que não haja censura, etc.. E ao mesmo tempo, pretendemos que, no campo económico, o nosso Povo vá dominando a economia. E como é que ele há-de dominar a economia? O primeiro passo que foi dado foi nacionalizar os sectores principais da produção; mas nós não vamos nacionalizar tudo em Portugal, nós precisamos de uma aliança entre as classes trabalhadoras, entre os pequenos empresários e mesmo os médios empresários, que estejam dispostos a caminhar connosco para um futuro socialista em Portugal. Nós pensamos que as classes trabalhadoras devem também ter aliados, aliados na pequena burguesia e na média burguesia, mas o processo tem de ser conduzido, nas suas linhas principais, pela aliança entre o Movimento das Forças Armadas e as classes trabalhadoras. Então, nós fizemos nacionalizações, mas isso não chega, não é por escrever num decreto uma nacionalização que a economia passa logo a andar melhor. Não senhor; ela pode até mesmo ter dificuldades maiores a seguir. E porquê? Porque a economia estava organizada num certo sentido, estava organizada no espírito do lucro, era uma máquina montada, havia o patrão, havia os empregados. Aquilo girava num certo sentido. É claro que no nosso País, depois do 25 de Abril, desenvolveu-se uma luta aguda, entre diversos estratos sociais, entre os empresários e os empregados e os trabalhadores.
E porquê? Porque os trabalhadores até ao 25 de Abril eram os trabalhadores mais mal pagos da Europa. Recebiam salários muito baixos e era graças a essa exploração desenfreada da nossa mão-de-obra que os grandes monopolistas faziam enormes fortunas. Seguiu-se uma luta grande entre os trabalhadores e os monopólios, que conduziu à situação actual.
Nós, agora, nacionalizamos e, então, metemos à frente das empresas nacionalizadas comissões administrativas, comissões de administração, que têm a confiança dos trabalhadores; são nomeadas pelo Governo com a confiança dos trabalhadores, quer dizer, os trabalhadores, de um modo geral, indicam os seus nomes ou, depois de estarem constituídas as comissões, dão o seu sancionamento. Simultaneamente, nós estamos desenvolvendo no seio das empresas a constituição de comissões de controlo da produção por parte dos trabalhadores, quer dizer, os trabalhadores têm comissões de controlo da produção interessadas em que sejam atingidos os níveis da produção, em como organizar a produção, em como melhorar a produtividade. Eu, o outro dia, estive numa fábrica, que é a Sorefame, em que os homens conseguem hoje fazer peças que antes faziam em cinco dias e fazem hoje em três dias; em dois dias e meio, três dias. Quer dizer, é preciso desenvolver o espírito criador dos nossos trabalhadores, quer no campo quer na cidade e coordenando e aproveitando todas as ideias válidas, caminhar para a frente, porque aqueles que estão directamente ligados à produção, às operações do trabalho, que trabalham, manualmente, ou mesmo que trabalham intelectualmente, todos os que estão directamente ligados à produção são esses que, de um modo geral, mais ideias criadoras têm para melhorar essa produção. E nós temos confiança nas potencialidades criadoras do nosso Povo, Ele foi reprimido e oprimido durante centenas de anos. Primeiro apanhou com a inquisição em cima, depois pouco se fez por ele no século passado. Seguiram-se cinquenta anos de fascismo, mas o nosso Povo tem um cérebro, as camadas populares e as mais baixas, mais baixas nesse sentido vulgar — não para nós, mas quer dizer, as camadas mais desfavorecidas, têm uma cabeça como as outras e, então, nós estamos apostados em desenvolver essas potencialidades criadoras, essas ideias e, nesse sentido, nós estimulamos os homens e nós estimulamos as mulheres, nós dizemos às mulheres: discutam também com os homens sobre como melhorar o trabalho nas fábricas, como produzir mais; não tenham acanhamento, não se envergonhem, não julguem que são inferiores aos homens e não tenham vergonha de ter ideias, não tenham acanhamento de algum tipo que apareça e diga assim: «esta mulher é estúpida», não tenham acanhamento disso.
As mulheres têm um grande espírito criador. Têm espírito criador como têm os homens. E na sociedade actual mesmo os homens que se julgam mais democratas, como eu, aqui o Senhor Almirante e outros, mesmo nós, como fomos educados em toda uma civilização em que a mulher estava num plano inferior ao homem, mesmo nós, temos de fazer os nossos exames de consciência para não abusarmos do trabalho das nossas mulheres. Portanto, isto é um caminho na indústria.
Depois procuraremos, estamos procurando articular essas comissões de trabalhadores com as comissões de administração e depois com o próprio Governo. Ao nível da agricultura, nós aprovámos uma nova lei do arrendamento rural, que é uma lei que liberta os rendeiros e os trabalhadores agrícolas, os pequenos e médios agricultores do domínio dos grandes proprietários, das grandes terras, das extensas e enormes terras e aprovámos os princípios de Reforma Agrária. Isto é muito importante que vocês saibam o que é que nós aprovámos. A gente aprovou o seguinte: que, quanto às terras de sequeiro, nós fazemos a reforma agrária a partir dos quinhentos hectares. Cada proprietário ficará ainda com quinhentos hectares, e, quanto às terras de regadio, serão cinquenta hectares. Nós pensamos dar estes passos, com segurança, não pensamos fazer coisas loucas e já vos dissemos que a própria reforma agrária vai levar alguns anos, escassos anos. Mas leva aí dois anos a pôr em execução, em todo o País. Ela vai levar esse tempo. Depois as terras que forem assim expropriadas, ficarão propriedade ou do Estado ou de Cooperativas dos trabalhadores. Os trabalhadores agrícolas têm desempenhado um grande papel. Os do Sul em empurrar esta Reforma Agrária.
Agora, quanto ao Norte. Quanto ao Norte a propriedade do Norte era diferente da propriedade do Sul. No Norte não há aqueles grandes latifúndios que há no Sul. Então no Norte há sobretudo, os pequenos agricultores e os médios agricultores. O pequeno agricultor é aquele que nunca recorre ao trabalho assalariado doutrem. Só trabalha ele, ou a sua mulher ou o seu filho. O médio agricultor é já um agricultor que, na sua propriedade, por vezes, mete um assalariado ou outro, mas não como regra, para contribuir, na altura do trabalho mais intenso, para que ele se realize. Aplica, sobretudo e, praticamente, a sua família. Ora nós respeitamos as propriedades dos pequenos agricultores e dos médios agricultores. Isso para nós é sagrado.
O que é que nós pretendemos? Nós aprovámos uma lei, que permite ao Estado avalizar os pedidos de empréstimo dos pequenos e médios agricultores, avalizar só com a sua pessoa; eles não precisam dum fiador. Avalizar pedidos desses até ao montante total para toda a população, de cinco milhões de contos. Quer dizer, um pequeno agricultor, um médio agricultor pode recorrer ao crédito agrícola sem para isso ter de empenhar a sua propriedade. Sem para isso ter que arranjar fiador, etc.. Nós pretendemos que os pequenos agricultores se unam e se unam em Cooperativas, que fiquem por exemplo com uma parte da propriedade para eles próprios a trabalhar e que a outra parte ponham em comum com os outros associados. Mas nós não obrigamos ninguém a isso. Tudo isto deve ser voluntário. Toda a ligação entre os pequenos agricultores ou entre os pequenos e os médios ou entre os médios, todas essas ligações, todas essas Cooperativas, que devem ser verdadeiras Cooperativas, em que todos tenham os mesmos direitos e não as Cooperativas que haviam no tempo do Estado Novo, que serviam para. cobrir o interesse dos «mandões», essas Cooperativas vão ser constituídas só com voluntários. Ninguém é obrigado a entrar para uma Cooperativa. «Só voluntários.»
Nós sabemos muito bem que os trabalhadores agrícolas são muito individualistas, são muito ciosos do seu trabalho, da sua propriedade. Mesmo ao nível dos assalariados agrícolas, as ideias do cooperativismo levam tempo a penetrar. Nós temos que fazer essa pedagogia. Ajudar a essas ideias do cooperativismo. Mas nós não forçamos ninguém a ligar-se a outrém. Nós preservamos o individualismo dos nossos camponeses. Não os obrigamos à força a ligarem-se a outros em Cooperativas. Se quiserem entram para a Cooperativa. Se não quiserem, não entram. O que nós esperamos é que, com o exemplo, ao verificarem, que é mais rentável, que tem mais interesse o trabalho conjunto, a ajuda mútua, a cooperação, então, eles vão vindo voluntariamente. E assim, transformamos a nossa agricultura, numa agricultura com base em Cooperativas, livremente constituídas pelos trabalhadores. Isto é uma verdade. É um ponto de honra nosso e se vos disserem o contrário, mentem. É o Conselho da Revolução que vos está aqui a dizer.
As Forças Armadas, já devereis ter sabido isso, estão desenvolvendo uma acção de dinamização cívica e cultural. Quer dizer, nós pensamos, isso vai ficar escrito na Constituição, que as Forças Armadas têm um grande papel no desenvolvimento da economia, da vida social e da vida cultural do nosso País. Então, nós temos equipas que percorrem ou que vão às aldeias. Nós começámos esse trabalho levando só palavras, pouco mais podemos levar do que só palavras, mas mesmo levando só palavras, nós levávamos o sentido da liberdade das consciências, do nosso Povo, da libertação em relação aos caciques locais, em relação aos mandões locais, em relação aos grandes senhores locais. Despertar o nosso Povo, para as nossas ideias, foi já alguma coisa que fizemos, embora no princípio só tivéssemos levado, ou pouco mais tivéssemos levado, do que palavras.
Mas nós estamos organizando e já lançámos acções de outro tipo; por exemplo, em Trás-os-Montes está a decorrer actualmente, uma sessão cultural levada a cabo por, — não posso precisar agora se é a Força Aérea, julgo que são os comandos em conjunto com a Força Aérea, — uma dinamização nesse sentido que leva, por exemplo, os médicos às aldeias, tem por exemplo, engenharia, tem máquinas de engenharia a trabalhar na construção de caminhos, tem acções que se desenvolvem no sentido de criar fontanários. Temos também um programa, um projecto, de levar electrificação a um milhão de portugueses, que não tem electricidade. Mas isto, não é de um dia para o outro. Nem estamos aqui a dizer palavras vãs. Não vos vimos dizer: vamos electrificar o País de um dia para o outro. Não, isto vai levar anos. Mas vamos lançar, vamos lançar essa obra. Já foi aprovada pelo Governo. Vão ser lançados os estudos. Isso irá à prática. É preciso uma coisa também, que nós não sejamos impacientes. As coisas não se constroem de um dia para o outro. Vós mesmos tendes essa experiência na vossa vida quotidiana. Eu sei que não estou a dar novidade nenhuma e, então, melhor ainda, ainda bem, que nós todos temos essa consciência, que as coisas não se podem fazer de um dia para o outro. Eu só me felicito por isso, isso significa que temos bem essa consciência. E precisamos que o nosso Povo tenha essa consciência, porque eu sei que é a prática quotidiana que leva a verdadeira confiança às pessoas, porque elas estiveram habituadas durante cinquenta anos a ouvir palavras, palavras e mais palavras. Mas o Movimento das Forças Armadas neste escasso ano que tem decorrido, tem demonstrado que não diz só palavras, que actua, actua nos actos, na prática e tem tomado decisões, que correspondem a transformações profundas da nossa sociedade; como foram as nacionalizações da Banca, dos Seguros e dos sectores básicos da produção.
Portanto, eu queria-vos dizer isto, que as Forças Armadas também vão colaborar na questão da Reforma Agrária, no lançamento da Reforma Agrária. Dos Conselhos da Reforma Agrária fazem parte elementos das Forças Armadas.
Por outro lado, eu queria-vos falar em dois assuntos, que estão no vosso pensamento e que vos preocupam. Um, são as ocupações das casas. Ora tem havido e tem-se verificado ocupações selvagens de casas. O Governo e o Movimento das Forças Armadas lutam contra isso. E pode-se afirmar que não há casas de emigrantes que estejam, neste momento, ocupadas. Se há alguma, se algum de vós tem conhecimento de alguma que esteja ocupada, é dizer-me para eu saber isso. (Interrupção a dizer que há ocupadas). Então devem vir dizer-nos, onde é que elas estão ocupadas, em que localidade, para que nós tratemos disso, porque nós sabemos que houve casas de emigrantes que foram ocupadas. Devem vir dizer-nos isso. É para isso que nós aqui estamos. Houve casas de emigrantes, que foram ocupadas, mas foram logo rapidamente desocupadas. Eu sei, por exemplo de um caso concreto disso. E isto significa civilização da parte do nosso Povo, porque o nosso Povo sabe muito bem que a casa do emigrante não é a casa do especulador. É a casa que ele criou, e que ele construiu com o suor do seu rosto, do trabalho no estrangeiro. E isso também é um compromisso cujo cumprimento vocês podem exigir ao Movimento das Forças Armadas. O Movimento das Forças Armadas assegura as casas dos emigrantes, combate tudo o que seja ir ocupar casas dos emigrantes e todos os casos que saibam, façam chegar ao nosso conhecimento.
Outra coisa que eu vos quero dizer é aquilo que respeita aos depósitos, ao dinheiro, às remessas.
Eu quero-vos chamar a atenção do seguinte: que aqueles elementos da reacção, aqueles que hoje lançam a confusão entre vós e que vos dizem que o vosso dinheiro não está acautelado, eram precisamente aqueles mesmos que utilizavam o vosso dinheiro, embora o entregassem também nos seus destinatários, mas entretanto iam trabalhando cora ele na dominação do nosso próprio Povo. Eram os banqueiros que o utilizavam.
Nós nacionalizámos a Banca, mas nós ao nacionalizarmos a Banca e os Seguros, nós respeitamos o capital estrangeiro. Nós não bolimos no capital estrangeiro. Cabe na cabeça de alguém que um Governo de gente honrada fosse ficar com o dinheiro das remessas que mandassem para o nosso País? Que crédito teria esse Governo em relação ao seu próprio Povo? Pensem ao menos nisso e, quando os procurarem dividir e, insidiosamente, lhes mentirem sobre isso, vocês raciocinem. Mas, como é que seriam aqueles homens, que estão lá em Portugal? Então como é que eles poderiam entrar numa política dessas? Qual seria o crédito que teriam junto do seu próprio Povo? Amanhã esse próprio Povo revoltar-se-ia. E como é que eles têm esse apoio do Povo? Como é que os soldados, marinheiros, que estão no Movimento das Forças Armadas e eles não são também do Povo fardado? Como poderíamos nós fazer isso? Somos os primeiros a garantir o dinheiro aos próprios estrangeiros. Nós nacionalizámos a Banca precisamente, para que a nossa economia não fosse para a ruína, porque estava sendo arruinada, precisamente, pelos detentores dos bancos.
Nada mais me resta dizer-vos. Quer dizer, eu gostaria de dizer mais coisas, mas a hora vai adiantada. Eu por enquanto... Aquele senhor, aquele camarada, aquele compatriota está dizendo que, por enquanto, eu só falei no Governo. Eu tinha estado digamos aqui, dando uma satisfação a vocês, é um Governo. Há cinquenta anos vocês não tinham um Governo que viesse aqui falar com vocês... Eu queria-vos dizer o seguinte: eu tenho aqui alguns apontamentos sobre os emigrantes. Eu penso que os emigrantes também participaram, indirectamente, na Revolução do 25 de Abril. Como? Pelas suas necessidades de vida. Ao rejeitarem as condições que lhe eram oferecidas no seu próprio País. Depois ao contactarem com novas formas de organização ao receberem outros salários aqui, fora no estrangeiro, ao voltarem às suas terras com outros costumes já. Com mais dignidade humana até, vocês também influenciaram, lá nas vossas terras, o nosso próprio Povo a receber de braços abertos o 25 de Abril.
Ao nível da cooperação com a EFTA e com o Mercado Comum o Governo está desenvolvendo acções para que a situação dos trabalhadores emigrantes portugueses se aproxime, o mais possível, e atinja os mesmos níveis de segurança de salários, de regalias, de direitos, que os trabalhadores autóctones do próprio país.
Há um outro problema, que nos preocupa, que é o portuguesismo dos vossos filhos. O nosso portuguesismo passa pela nossa língua e a gente tem que continuar a falar a nossa língua, tem que ensinar aos nossos filhos a nossa língua, tem que cultivar a nossa língua-pátria. A língua, que aprendemos no berço, isso também é uma preocupação do Governo, que a língua portuguesa seja difundida entre os filhos dos emigrantes.
Hoje houve durante o dia uma reunião com um senhor que trabalha no Secretariado da Emigração e com numerosos representantes de emigrantes. Eu julgo que essa reunião durou todo o dia, hoje. Esse senhor poder-vos-á, mais em pormenor, dizer algumas coisas sobre essas acções que estamos tentando sobre os emigrantes.
Mas basicamente são estas: igualdades de condições de trabalho e de segurança e, por outro lado, o ensino da língua-pátria. É claro que, o ensino da língua-pátria passa pelas escolas e pelo ensino, no estrangeiro, da nossa própria língua.
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