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«Sois, certamente, homens de espírito forte e terei de manifestar a V. Ex.ªs um apreço muito especial pela coragem e patriotismo demonstrado com a vossa abnegada aceitação de cargos governamentais em circunstâncias tão difíceis.
Não é simples ser membro de uma equipa governamental, cuja duração se exprime em dias.
Não é simples ser membro de um Governo de passagem que enfrentará, em horas, problemas cruciais como os de Timor e de Angola.
Não é simples ter fugazes responsabilidades máximas em sociedades tão assimétricas como capital e Norte, Setúbal e Açores.
Foi exactamente neste quadro pouco simples que V. Ex.ªS aceitaram os riscos políticos graves de ser governantes numa equipa que tem tão pouco de duração como muito de responsabilidade histórica.
Que o futuro vos compense dos riscos políticos assumidos, da manifesta coragem e abnegação demonstradas, das canseiras e dos esforços previsíveis: são esses os maiores desejos de um companheiro da mesma luta.
A nossa revolução oscila entre o pragmatismo consciente de uns e a militância idealista de outros.
Vivemos contradições que são génese da onda lamentável de violência que deflagrou no País.
São de luto e tristeza os sentimentos que sinto e exprimo ao conhecer os efeitos dramáticos de confrontações violentas entre filhos da mesma pátria.
Aceito adversários políticos que vivam uma emulação no ideal comum de construir uma sociedade melhor, mas rejeito homens que se considerem inimigos pelo simples facto de visualizarem soluções políticas diferentes na construção de uma pátria comum.»
Por seu turno, o primeiro-ministro Vasco Gonçalves, em resposta às palavras do Presidente Costa Gomes, afirmou que era com orgulho de patriota que assistia à tomada de posse dos novos membros do Governo na hora grave que a nossa revolução atravessa. Mais uma vez frisou que este Governo — o V Governo Provisório — «é um Governo constituído por patriotas honrados Que põem acima de qualquer interesse partidário ou pessoal os supremos interesses da Pátria.»
E acrescentou:
«Não é um Governo de carreiristas, de políticos profissionais», disse, «é um Governo identificado com a Revolução e disposto a consolidar a todo o custo as conquistas alcançadas com o 25 de Abril. É um Governo disposto a tomar as medidas necessárias à salvaguarda da nossa revolução mesmo que sejam impopulares.
O gesto destes homens, com os quais me sinto completamente identificado e que considero meus camaradas, é um gesto que pela sua grandeza moral se impõe a todos. É um gesto que serve de exemplo às nossas Forças Armadas, que contribui para o seu empenhamento revolucionário e para a sua unidade hoje tão posta em causa pelos inimigos da nossa revolução.
É um Governo à altura do momento que vivemos, é um Governo de socialistas nos actos e não só nas palavras, é, enfim, um Governo de patriotas.
Ninguém aqui, sr. Presidente da República, está agarrado ao lugar, mas todos estamos ligados a uma revolução que não queremos ver recuar e muito menos perder. Daí que não tenha sentido, e que cada vez o vá tendo menos, o centrar-se a presente crise à volta da figura do primeiro-ministro. Não é a figura do primeiro-ministro que se pretende abater, mas sim as ideias que ele defende. Com este ou outro primeiro-ministro empenhado na revolução, os nossos adversários não cessariam de mover os seus ataques à revolução e à democracia. Repito: não é uma questão de nomes o que está em causa. O problema é outro e a sua compreensão, bem como a compreensão geral da crise que atravessamos, terá de ir buscar-se à intensa luta de classes hoje vivida neste País.
Por isso, sr. Presidente, nem que fosse por um minuto apenas que este Governo tomasse posse, nem por isso os seus membros deixariam de o fazer, porque sabem e sentem que é essa a sua responsabilidade histórica. Responsabilidade que este Governo não enjeita, como se tem visto e como no futuro se verá. Nunca teve o Povo português um Governo tão revolucionário e tão coeso como este V Governo Provisório. Nunca o Povo português teve um Governo que, como este, estivesse tão empenhado na revolução e nos altos ideais que esta procura servir e atingir.
O Governo sentiu, depois da sua reunião com o Directório, que era urgente ultimar a sua constituição que esta tomada de posse hoje consagra, para melhor se poder dedicar às grandes tarefas que o aguardam, e que a nossa Pátria espera, a curto prazo, ver concretizadas.»
continua>>>Inclusão | 19/05/2019 |