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A Comissão Política do Conselho da Revolução apresentou na assembleia uma análise dos factos ocorridos no 1.º de Maio, a qual constitui o primeiro parecer oficial acerca dos incidentes que assinalaram as comemorações do Dia do Trabalhador.
Depois de expor os factos que antecederam o 1.º de Maio, com destaque para a aprovação da Lei Sindical — que consagra a unicidade sindical — pelo Conselho da Revolução, o documento expõe a seguir os episódios que estão na génese dos infelizes incidentes:
«1) A 30 de Abril, membros do Conselho de Revolução avistam-se com representantes da Intersindical, que os põem ao corrente dos seguintes factos:
a) Tinham sido convidados os seguintes partidos: P.S., P.C.P., M.D.P., F.S.P. e M.E.S.;
b) várias conversações haviam sido efectuadas entre a Inter e aqueles partidos, com vista à organização da manifestação, tendo surgido o seguinte impasse:
2) Os membros do Conselho da revolução emitiram a sua opinião de que a manifestação deveria ter sido anunciada pela Inter apenas aos trabalhadores, através das associações sindicais, sem convites aos partidos políticos, para evitar todos os atritos. Como, porém, tal procedimento já estava ultrapassado, considerou-se como viável a solução de não ser autorizado a falar nenhum representante dos partidos políticos.
3) Nessas condições, a Intersindical ficou de contactar de novo com os partidos convidados, a fim de lhes transmitir esta plataforma de actuação.
4) Averiguou-se, posteriormente, que os partidos aceitaram não usar da palavra, tendo, no entanto, o P.S. assumido a atitude unilateral de efectuar a sua concentração em local diferente do inicialmente acordado, e organizar a sua própria manifestação, apesar de destinada também ao Estádio 1.º de Maio.»
Entrando depois nos acontecimentos do P.S de Maio, o documento analisa-os da seguinte forma:
«1. O P.S. faz a sua concentração na Praça do Chile, conforme tinha decidido, unilateralmente, em relação aos restantes partidos participantes.
2. Forma-se, a partir da Alameda D. Afonso Henriques, a «cabeça» da manifestação. O dr. Mário Soares não segue nessa «cabeça». Um camarada do Conselho da Revolução refere que houve alguma dificuldade para impedir que na «cabeça» da manifestação fossem outras bandeiras que não fossem as da Intersindical.
3. O «grosso» da manifestação e a manifestação do P.S., partindo de locais diferentes, seguem trajectos diferentes para o Estádio 1.® de Maio, tendo surgido alguns «cruzamentos» e «interferências» entre estas duas manifestações e ainda outra — do P.P.D. — sem nenhumas consequências.
4. Quando a manifestação do P.S. chega ao Estádio 1.º de Maio — em último lugar — este não está cheio (no interior já se encontravam, inclusive, alguns núcleos sindicais afectos ao P.S.). Porém, a entrada está totalmente congestionada, não se conseguindo averiguar se voluntária se involuntariamente, facto que retarda a entrada da manifestação do P.S., onde segue o dr. Mário Soares.
5. A essa hora, antes da entrada no estádio do dr. Mário Soares, tinha já discursado um representante da Intersindical, tendo surgido vários apupos e palavras de ordem discordantes por parte de, pelo menos, um núcleo sindical do P.S. presente.
6. Após a sua entrada no estádio, quando já discursava o Primeiro-Ministro, o dr. Mário Soares não se dirige à tribuna, onde tinha lugar — admite-se que por lá se encontrar o representante da F.S.P. e pela atitude anteriormente assumida pelo P.S.
7. Depoimentos de camaradas referem a realização de um mini-comício, por parte de alguns dirigentes do P.S. presentes junto do dr. Mário Soares, durante o final do discurso do Primeiro-Ministro e o início do discurso do Presidente da República. São referidos nos depoimentos a utilização de um megafone ou de qualquer outro sistema de amplificação sonora.
8. Estes factos originaram a reacção de aderentes de outros partidos presentes, dando lugar à troca de palavras de ordem antagónicas, assobios, que perturbam e por vezes interrompem os discursos do Primeiro-Ministro e do Presidente da República.
9. Presenciando estes factos da tribuna, o furriel Barroso (E.P.A.M.) dirige-se ao local onde se encontra o dr. Mário Soares e faz-lhe notar a inconveniência das atitudes referidas. Retira-se e, logo a seguir, intervém o aspirante Fernandes (R.A.L. 1), que acaba por dizer ao dr. Mário Soares que aquele não era local para se discursar, e que o melhor seria entender-se com os dirigentes da Inter, na tribuna.
10. O dr. Mário Soares concorda, depois de conferenciar com o dr. Salgado Zenha, e dirige-se à tribuna, onde chega quase no final do discurso do Presidente da República, acompanhado por bastantes adeptos do seu partido.
11. Ao abrirem-lhe a porta da tribuna, o dr. Mário Soares indica ter sido chamado pelo M.F.A.
12. A entrada é-lhe impedida por um dirigente da Intersindical, com a alegação de que tinha ele sido responsável por atitudes divisionistas. Importa referir que o oficial responsável pela segurança da tribuna — major Campos Andrade — se declarou, nessa ocasião, contrário à entrada fosse de quem fosse na tribuna, temendo consequências desagradáveis para o Presidente da República, como por exemplo, a interrupção do seu discurso, motivada pela reacção da multidão.
13. O dr. Mário Soares retira-se, e abandona o estádio, já depois do discurso do Presidente da República.»
Entrando depois na análise política dos factos, o documento considera que estes se inserem numa perspectiva de política partidária entre o P.S. e o P.C., estando em jogo os seguintes factores:
A Comissão Política do C. R. considera depois que o P.S., «aproveitando o peso eleitoral obtido, joga ao «ataque», tendo o P.C.P. e a Intersindical adoptado uma táctica de «defesa» e «contra-relógio». E mais adiante:
«Sintomático deste «ataque» político é a manifestação realizada pelo P.S. no dia 2 de Maio, onde são repetidas as palavras de ordem do dia anterior, e outras, com o mesmo sentido político de «supremacia» eleitoral («Se isto não é o povo, onde está o povo?»). Independentemente de outras análises mais profundas, que se filiam nos motivos de desconfiança mútua P.C./P.S., e na interpretação exaustiva das reais intenções de qualquer um destes partidos no presente momento político português, o que importa é retirar destes factos a conclusão de que o grande prejudicado com estas atitudes é o processo revolucionário em curso, através da quebra da união das massas trabalhadoras e destas com o M.F.A.»
continua>>>Inclusão | 30/04/2019 |