Trabalho de Direcção
Resolução do Comité Central

Partido Comunista Brasileiro

Novembro de 1973


Fonte: Problemas Políticos do Movimento Comunista e Operário Internacional n.º 9; Editorial Avante!, Lisboa, 1976, págs: 127-166.
Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo.
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O Comité Central do PCB ao discutir seu trabalho de direcção, realizado nos dois anos e meio últimos, aprova o balanço apresentado pela Comissão Executiva, encaminhando-o como subsídio para o estudo das direcções intermediárias de nível estadual e como contribuição para o balanço da actividade do Partido a ser efectuado no prazo de um ano. Ainda, baseado nele, aprova a seguinte Resolução:

I — O Trabalho de Direcção do CC

1 — As condições políticas em que se realiza o trabalho de direcção são marcadas pelo agravamento da repressão fascista e imensas dificuldades objectivas. Por outro lado, o descontentamento crescente das massas possibilita o avanço do trabalho político da direcção e a resistência antifascista das mais amplas massas oferece elementos novos à actividade política e organizativa do Partido. Em face disso, devemos esforçar-nos, a fim de que as dificuldades e a repressão não sejam usadas como escudo à limitação da crítica, à redução do trabalho colectivo e à não execução de um plano de acção política.

2 — Nesse período, que começa em Março de 1971, com a aprovação da resolução anterior sobre O Trabalho de Direcção, foram elaboradas pela direcção central do Partido, entre outras, as seguintes resoluções: Directrizes para a Aplicação da Linha; Entendimento Político; Nota Sindical; Política de Agitação e Propaganda; análise sobre a política económica-financeira da ditadura; a situação da América Latina; sobre a Bacia do Prata; e a evolução das características do regime fascista imposto ao país. Também merecem destaque: a execução do PLACCONPE em seu primeiro ano; a melhoria das condições técnicas da Voz Operária; o equilíbrio e espírito de inciativa da direcção ao enfrentar a situação adversa e de repressão desencadeada contra nosso Partido no segundo semestre de 1972 e início do corrente ano.

3 — Na actividade do CC as dificuldades de reuni-lo regularmente tem prejudicado o trabalho de direcção. Assinalamos a actuação dispersiva da Comissão Executiva e do Secretariado na discussão de problemas políticos, ideológicos e organizativos, devido a sobrecarga de questões secundárias. Verificamos, também, elementos de dualidade de direcção dos órgãos dirigentes. O ponto de apoio da direcção central foi deslocado do conjunto das organizações intermediárias de nível estadual para os órgãos auxiliares, seccionando a actividade dirigente por frentes de trabalho. Além disso, ainda há elementos de descontinuidade em suas resoluções, e tem sido insuficiente o empenho para levar os resultados obtidos ao conjunto das organizações partidárias. A direcção não vive suficientemente as questões do movimento operário, camponês e popular. O trabalho de educação para o conjunto do Partido não foi planificado nem se cuidou devidamente da formação e capacitação dos quadros.

4 — Apesar de qualificarmos o actual regime político como fascista, deixamos, com frequência, de proceder levando em conta suas características. O aperfeiçoamento do aparelho repressivo exige, em escala crescente, que respeitemos, rigorosamente, as normas de segurança e não subestimemos a educação ideológica e a preparação Sistema,nça na medida em que intensifica seu trabalho junto às massas.

5 — O trabalho de direcção do CC possui sérias debilidades. Não se encontra suficientemente voltado para o Partido e para o estudo das questões da classe operária. O centralismo democrático é aplicado de maneira deformada. Sem dúvida, as incorrecções no trabalho do CC não são novas e resistem à superação. Possuem a força da inércia e se constituíram num verdadeiro sistema, numa barreira, que estão prejudicando o avanço qualitativo do trabalho de direcção. Identificar esse sistema de debilidades e organizar os meios de superá-lo constituem um desafio ao espírito revolucionário de nosso Partido.

Consideramos o empirismo um dos elementos negativos de nosso trabalho de direcção. É comum destacarmos o marxismo-leninismo como nossa ideologia, sem aprofundarmos, suficientemente, à luz daquela teoria, o estudo da realidade em que actuamos, e encararmos os factos como simples analistas políticos e não como dirigentes do Partido de vanguarda da classe operária. Uma ilustração significativa dessa debilidade em nosso trabalho de direcção é o facto de não termos elaborado, ainda, o Programa Máximo de nosso Partido.

6 — Para fazermos face às debilidades do trabalho de direcção, não é bastante enumerá-las. É necessário identificar suas origens, seus factores condicionantes, suas causas, quais as concepções que as alimentam e dificultam a superação das mesmas. Esta é uma tarefa difícil, que exige uma continuada elaboração colectiva. Factores históricos e sociais da formação da sociedade brasileira influíram na formação de nosso Partido e devem ser estudados, pesquisando-se as causas do sectarismo existente na grande maioria dos nossos militantes, a resistência ao trabalho de massas constante, a passividade e a supervalorização da expectativa dos grandes momentos através de vitórias fáceis e rápidas. Esses defeitos para serem superados exigem um tenaz esforço político e ideológico da direcção.

7 — O sistema do culto à personalidade provocou graves consequências em nosso Partido. Teve o seu florescimento em nossas fileiras favorecido pelas condições sociais do atraso político, da falta de organização das massas e da subestimação do Partido. Há outras causas e devem ser pesquisadas. A luta pela superação de sistema do culto deve ser permanente, apoiada no conhecimento adequado da teoria do Partido e na aplicação correcta de seus Estatutos.

8 — Outra causa de nossas falhas e deficiências no trabalho de direcção está nas concepções erróneas, alheias à nossa ideologia, convivendo com concepções correctas, marxistas-leninistas. O VI Congresso realizou uma análise de grande valor sobre a caracterização ideológica de nosso Partido, indicando, no processo revolucionário, a existência daquelas concepções erróneas de fundo pequeno-burguês e carácter golpista, que consiste em admitir a revolução como resultante da acção de cúpula e não como um fenómeno de massas. Essas concepções erróneas imprimem à nossa acção sentido imediatista de pressa pequeno-burguesa, desviam-nos da perspectiva da luta persistente pelos objectivos tácticos e estratégicos, consoante o processo de acumulação de forças e da conquista da hegemonia do proletariado. As principais concepções erróneas existentes dentro do Partido podem ser indicadas da seguinte forma:

  1. — A incompreensão de que a luta revolucionária se constitui, fundamentalmente, de grandes momentos. Não destaca seu carácter de processo, não entende que vivemos sob o fascismo e para vencê-lo temos pela frente uma luta dura e prolongada. Por outro lado, não leva, suficientemente, em conta, na nossa prática, que momentos de viragem poderão ocorrer.
  2. — A subestimação do papel das massas, em particular da classe operária, no processo revolucionário e o facto de subsistirem ilusões de que um regime democrático no Brasil possa ser outorgado por um general qualquer ou um grupo de políticos burgueses freiam o espírito de iniciativa na luta contra a ditadura fascista.
  3. — A subestimação do papel do Partido no processo revolucionário como a força imprescindível ao trabalho de consciencialização, mobilização e organização das grandes massas do nosso povo, principalmente da classe operária, leva a não o construirmos nas grandes empresas e concentrações proletárias.
  4. — A incompreensão do carácter do Partido como um organismo vivo, que estuda, acompanha e se emociona com os problemas da classe operária, das suas lutas e do movimento democrático em geral leva o militante a não entender que ele é um dirigente político e que sua iniciativa é necessária para a activação das organizações intermediárias e de base, isto é, para o êxito na aplicação da linha política e das resoluções do Partido.

II — A Justa Aplicação dos Princípios e Métodos

9 — A incorrecta aplicação dos princípios no trabalho de direcção é a um só tempo causa e efeito imediatos do sistema de debilidades apontado. Só teremos êxito na superação delas se adoptarmos, como primeiro passo, a rigorosa aplicação dos princípios da direcção científica que regem a vida de nossa organização marxista-leninista, ou seja:

  1. A iniciativa revolucionária. O Partido deve manter, em qualquer situação, o espírito de luta na aplicação da linha política, pois é isso que lhe dá o carácter revolucionário. A iniciativa é, particularmente, indispensável num país como o nosso, onde a extensão territorial e a repressão dificultam as comunicações entre os vários órgãos de direcção.
  2. — A justa combinação do trabalho legal com o ilegal, na situação da repressão fascista em que vivemos, impõe predominantemente, o carácter clandestino de nossa actividade partidária. Isso nos permitirá utilizar ao máximo as oportunidades do trabalho legal.
  3. — A direcção central deve tomar todas as medidas necessárias para estreitar suas relações com as organizações intermediárias e de base. Também é imprescindível aplicar um método correcto de trabalho e melhorar o conhecimento da teoria revolucionária, como medidas básicas para tomar mais colectivo o trabalho de direcção. É necessário que o conjunto de seus membros efectivos e suplentes tenha condições para desempenhar de maneira mais efectiva seu papel dirigente, através da normalização de suas reuniões, de um relacionamento mais dinâmico entre os órgãos restritos e o conjunto do CC e tomar mais constantes as consultas e discussões com os membros do CC. Outro requisito indispensável à aplicação do centralismo democrático, é o combate ao liberalismo que se manifesta na resistência ao controlo, no debilitamento da responsabilidade individual, sem dúvida o caminho mais fácil para o mandonismo.
  4. — A aplicação correcta da planificação e controlo contribui para combater o empirismo, ainda dominante no trabalho de direcção. A concentração do trabalho deve ser observada em todas as organizações nos níveis político, orgânico e ideológico, e no mesmo sentido dirigir os recursos e a propaganda. A definição de áreas de concentração deve ter um carácter dinâmico, aumentando ou diminuindo à medida que se desenvolve o trabalho, sem perder a visão do conjunto. O desenvolvimento da crítica e da autocrítica é indispensável ao trabalho. Na aplicação do controlo devemos organizá-lo de forma sistemática, considerando o realizado no local da organização como a sua forma principal. A prestação de contas não deve ser burocrática, omitindo-se, muitas vezes, o principal e enfatizando o secundário.

III — As Linhas de Acção do Trabalho Dirigente

10 — A correcção das actuais debilidades do trabalho de direcção será um processo, que envolve a mudança de elementos arraigados e já transformados em rotina na nossa maneira de agir e pensar. É imprescindível, para isso, fixar linhas de acção, combinadas com medidas exigidas pela realidade em desenvolvimento e sob estrito controlo do CC.

11 — A tarefa de defender e garantir o funcionamento do Partido e de sua direcção assume uma importância decisiva, para continuarmos avançando na superação de nossas falhas e deficiências.

12 — Linha de acção no plano ideológico - Elevar o nível de unidade ideológica e política do CC. Esta unidade deve consolidar-se a partir de um maior conhecimento teórico e prático de nossa realidade, aí compreendida a teoria do Partido. A realização do VII Congresso é excelente oportunidade para avançarmos neste terreno. Deve ser planificada uma ampla participação do CC na elaboração das Teses, incorporando todo o Partido neste trabalho. Intensificar o trabalho ideológico interno, visando, não apenas uma formação teórica e geral dos quadros, mas, igualmente, o combate às concepções erradas e já assinaladas pelo VI Congresso. A Voz Operária, como instrumento fundamental para essa actividade, deve aumentar sua difusão e corrigir suas debilidades com a ajuda de todo o Partido.

13 — Linha de acção no plano político - Fazer um balanço e actualizar as Directrizes para a Aplicação da Linha Política, tomando-as um centro de trabalho da direcção. Planificar o encaminhamento das tarefas definidas, principalmente no que diz respeito à organização e a mobilização das forças estratégicas básicas para a construção de uma ampla frente antifascista, de acordo com a resolução do CC Por Uma Frente Patriótica Contra o Fascismo.

14 — Linha de acção no plano orgânico - Realizar o trabalho de direcção apoiado nas organizações intermediárias do Partido em nível estadual, fundamentalmente, na concentração principal. Orientá-las na direcção do fortalecimento de suas organizações intermediárias e na construção e consolidação das organizações de base, principalmente nas de grande empresa.

Novembro de 1973.
Comité Central do Partido Comunista Brasileiro


Inclusão 14/10/2014