18 de Janeiro de 1934, uma Bandeira dos Marxistas-Leninistas

Francisco Martins Rodrigues


Primeira Edição: Bandeira Vermelha
Fonte: Francisco Martins Rodrigues - Escritos de uma vida
Transcrição: Ana Barradas
HTML: Fernando A. S. Araújo.
Direitos de Reprodução: Licença Creative Commons licenciado sob uma Licença Creative Commons.

O fascismo, implantado em 1926, começa a defrontar-se, a partir de 1931, com uma reactivação do movimento operário e popular. Em 1931, verificam-se em Lisboa várias greves, enquanto na Marinha Grande se inicia o ciclo das greves vidreiras que vão perdurar até 1934. Em 1932, novas e impetuosas lutas se verificam, acompanhando a política repressiva, de miséria crescente e aumento do desemprego. A jornada internacional de luta contra o desemprego é acompanhada de grandes greves em Lisboa e na Margem Sul, estendendo-se até ao Alentejo, com a participação dos assalariados rurais.

À frente destas lutas encontra-se já o Partido Comunista Português, reorganizado em 1929, com Bento Gonçalves à cabeça. Mas a influência dos anarquistas, que dominavam o movimento operário até à implantação do fascismo, é ainda muito grande. Para responder à reactivação do movimento operário e popular o fascismo procura desferir contra ele novos e poderosos golpes. Em particular, os sindicatos tornam-se o alvo principal da ditadura terrorista do grande capital e dos latifundiários. O Estatuto do Trabalho Nacional e os restantes decretos que o acompanham, ao mesmo tempo que destroem a organização sindical existente (através da obrigação de os sindicatos terem a sua sede na cabeça de distrito), procuram submetê-la à organização corporativa fascista. O decreto, conhecido como o “decreto colete de forças”, depara com a oposição generalizada do movimento operário.

Assumindo um papel dirigente na luta contra ele, a CIS (Confederação Intersindical, ligada aos comunistas), logo em Agosto dirige uma circular a todas as Federações, Uniões e Sindicatos. Afirmando que “o decreto é inaceitável, deve ser repudiado e todos nos devemos unir para a luta contra ele”, a CIS propõe a constituição duma Frente única, que além da luta contra o “decreto colete de forças” e da liberdade sindical, fizesse o levantamento das reivindicações económicas, então sentidas pelo proletariado (jornada de 7 horas, salário mínimo, subsídio de desemprego, seguro contra a doença e invalidez, férias anuais e inclusão dos trabalhadores rurais em toda a legislação de carácter social). Apesar das resistências dos anarquistas e do papel conciliador face ao fascismo, assumido pela FAO (Federação das Associações Operárias controlada pelos socialistas), a Frente Única vem a constituir-se e, depois de vários adiamentos provocados pelos anarquistas da CGT, a greve geral contra a fascização dos sindicatos acaba por ser marcada para o dia 18 de Janeiro de 1934. Greve que assume o seu ponto mais alto na Marinha Grande, onde os operários vidreiros se apoderam da vila e implantam o soviete da Marinha Grande.

Para os comunistas, o movimento do 18 de Janeiro devia ser um amplo movimento de massas, passando pela realização de Assembleias Gerais em todos os Sindicatos, utilizando a legalidade em que aqueles ainda se encontravam e reforçando a unidade combativa da classe operária. Para os anarquistas, o movimento de 18 de Janeiro integrava-se no conjunto das acções reviralhistas, que através do golpe militar pretendiam derrubar o fascismo, pondo o movimento operário a reboque da burguesia republicana e dos seus interesses de classe.

Em consequência das concepções golpistas e anarquistas que dominavam o movimento operário, o 18 de Janeiro virá em grande parte a fracassar. Mas nas regiões onde se vinha assistindo a um ascenso do movimento operário, como era o caso da Marinha Grande, o movimento passa a fases superiores de luta e é ainda hoje um exemplo para os comunistas e os revolucionários.

Retirando os ensinamentos do movimento de 18 de Janeiro e em particular da implantação do soviete da Marinha Grande, José Gregório, no seu último escrito, antes de ser afastado do Secretariado do Comité Central do PCP, que é o início da sua transformação revisionista, afirmava:

  1. O levantamento armado correspondeu ao sentir da massa operária da Marinha Grande, foi a passagem a uma forma superior de luta que, tarde ou cedo, se coloca inelutavelmente às massas exploradas. No desenvolvimento das suas lutas contra o desemprego, por maiores salários, pela liberdade sindical, e pela liberdade política, os operários da Marinha Grande chegaram à compreensão da necessidade da insurreição armada. Por isso se lançaram nela com tanta audácia e deram o seu apoio firme a uma nova forma de poder revolucionário nunca experimentado no nosso país, o poder do soviete operário.
  2. O erro essencial do movimento foi terem-se preparado os operários só para a luta armada, não se ter compreendido que nesta fase superior continua a ser necessário associar a luta armada com a greve política e a luta de massas pelo conjunto das suas reivindicações. Isto revelou pouco amadurecimento político do Partido, a penetração no seu seio de ideias anarquistas e putchistas e levou à derrota do movimento.
  3. A organização local do Partido afirmou-se como o Estado-Maior do proletariado, soube forjar a unidade combativa dos operários de diversas tendências e conduziu-os à luta. As deficiências do Partido resultaram de não ter ainda assumido completamente o papel dirigente que lhe competia, de se ter subordinado ao ponto de vista sindicalista, o que deu lugar a manifestações de reformismo e burocratismo.
  4. Na execução do plano insurreccional, experiência inteiramente nova para o proletariado português, a organização do Partido não compreendeu o carácter prolongado e complexo da luta que encetava, não previu a hipótese de uma retirada ordenada para prosseguir a luta em novas condições.

Os renegados cunhalistas não conseguem disfarçar o pavor e o ódio contra-revolucionário que lhes infunde essa acção superior do nosso proletariado. Durante longos anos tentaram enterrá-la e fazê-la esquecer. Como o não conseguiram e como o prestígio do 18 de Janeiro cresce sem cessar entre as massas exploradas, agora os revisionistas passaram a reverenciá-lo hipocritamente, escondendo as suas lições, reduzindo-o a uma mera acção reivindicativa.

É o que acontece com O Diário de 18 de Janeiro de 1978 que, publicando um suplemento especial dedicado ao 18 de Janeiro, apenas acaba por dedicar uma página ao movimento de 18 de Janeiro de 1934. E aproveitando esta data para aumentar os seus lucros com a publicidade (dum suplemento de 12 páginas, 5 são integralmente preenchidas com publicidade de empresas da Marinha Grande), reduz, naquela página que dedica ao 18 de Janeiro de 1934, este movimento aos aspectos sindicalistas, que foram em grande parte ultrapassados pela heróica acção dos operários vidreiros. Para os revisionistas, a luta contra a ditadura fascista reduzia-se à simples ampliação das lutas reivindicativas e das pequenas lutas políticas, em vez de verem nessa luta um processo contraditório no qual tanto o povo golpeia os seus opressores, como estes intensificam a repressão. Hoje ainda, tal como se torna claro da sua recente luta contra o “esquerdismo”, com o qual pretendem atingir o nosso Partido e a UDP, a sua posição é a dos compromissos e acordos, mantendo a classe operária e o movimento popular na expectativa.

É assim que a luta do 18 de Janeiro de 1934 assume ainda maior importância, pelo exemplo que representa. E só elevando a acção popular a níveis superiores, que o governo de direita e a fascização da vida nacional poderão ser impedidos. Como forma de luta superior, o exemplo da Marinha Grande permanece vivo no coração e na prática dos operários portugueses. E nem o esquerdismo trotskizante, que reduz o 18 de Janeiro à greve geral revolucionária, nem o reformismo revisionista, o conseguirão fazer esquecer.


Inclusão 23/05/2018