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Primeira Edição: Em Marcha, 14 de Julho de 1982
Fonte: Francisco Martins Rodrigues — Escritos de uma vida
Transcrição: Ana Barradas
HTML: Fernando Araújo.
Direitos de Reprodução: licenciado sob uma Licença Creative Commons.
A televisão mostrou-nos há dias Mário Soares em missão no Médio Oriente. Ria com gosto ante aquilo que parecia ser uma boa chalaça de Begin, sentado à sua frente. À mesma hora, a artilharia israelita devastava os bairros populares de Beirute, reduzidos à fome e à sede.
Mas, atenção, nada de desconfiar! Soares estava ali em missão de paz da Internacional Socialista. Porque, saibam-no todos, Soares sofre muito com o drama dos árabes. Basta ver as suas declarações ao chegar a Lisboa.
Falou da invasão israelita, não para denunciar o estilo nazi da operação-relâmpago, mas para sublinhar a sua “vitória fulminante”. Mencionou a OLP, não para dizer que defende uma causa justa, mas para a dar como ‘‘militarmente destruída”. Apontou como objectivo da sua missão de paz, não a retirada do invasor israelita, mas “a retirada com honra e dignidade dos combatentes palestinianos de Beirute” (reparem bem no cinismo desta honra e dignidade). E, naturalmente, já não lhe sobejou tempo para falar do genocídio sionista sobre o povo palestino, dos brinquedos armadilhados para matar crianças, do emprego de gases e de outras miudezas do género. Mesmo assim, ainda conseguiu informar-nos de que o governo de Israel tinha ficado “muito surpreendido” pelo apoio dos Estados Unidos e pela falta de reacção da União Soviética. Quer dizer: a invasão foi puramente casual e de modo nenhum combinada!
Como pode dar Mário Soares um tão descarado apoio ao genocídios dos povos palestino e libanês e continuar a fazer-se passar por democrata, socialista e não sei que mais? Como pode comprometer-se de maneira tão afrontosa em serviços de lacaio do imperialismo alemão e americano, sem ser repudiado pelo seu partido?
A resposta é fácil. Soares joga, como sempre fez, no peso do facto consumado. Se Israel pode escravizar os palestinos e invadir um Estado vizinho sem que nada lhe aconteça, porque tem os EUA por trás, então o realismo político consiste em ajudar os bandidos difundindo as suas arrogantes exigências. Pode ser que, em paga, receba umas ajudas para voltar ao poder.
Este são realismo de Mário Soares devia fazer-nos reflectir. É que se a política da direita consiste em impor os seus factos consumados reaccionários, a esquerda só será esquerda se se atrever a responder-lhe com os seus próprios factos consumados, revolucionários. Há por ai muito quem o tenha esquecido.
Observação: Tiro ao Alvo - Coluna de FMR no jornal Em Marcha e no jornal Política Operária
Inclusão | 06/02/2019 |