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Sob a influência de fatores internos e externos, agravou-se a contradição entre a nação em desenvolvimento e o imperialismo norte-americano e seus agentes internos, que é a contradição principal na atual etapa histórica da sociedade brasileira.
Tornaram-se, assim, mais agudos os problemas ainda não resolvidos que dizem respeito a esta contradição. Com esta agravação, e em conseqüência da política econômico-financeira do governo federal, subordinada em questões essenciais aos interesses do capital monopolista norte-americano, pioraram as condições de vida do povo e acentuaram-se as demais contradições da sociedade brasileira.
O agravamento da contradição principal e das demais contradições é condicionado pela situação econômica, cuja conjuntura reflete, sob certos aspectos, os fenômenos de crise nos Estados Unidos.
Apesar das condições menos favoráveis, a economia nacional não cessa de desenvolver-se, o que se observa particularmente em alguns setores básicos, como os do petróleo, energia elétrica, siderurgia, construção de máquinas e autoveículos, que continuaram a crescer, absorvendo vultosos investimentos. Entretanto, as dificuldades que se vêm acumulando acentuam a desigualdade do desenvolvimento econômico. Já em 1957 a taxa de aumento da produção industrial foi a menor do último decênio. Grande parte da indústria de bens de consumo começou a manifestar então sinais de estagnação, chocando-se com os limites do mercado interno, cuja expansão, impulsionada pelo processo de industrialização e urbanização é, em sentido contrário, consideravelmente obstaculizada pelas sobrevivências feudais na estrutura agrária.
A economia nacional em conjunto sofre os efeitos da crise cambial provocada pela queda drástica nos preços e no volume de vendas externas do café. Considerando o período de janeiro a novembro de cada ano, o valor da exportação de café foi o seguinte, em milhões de dólares: 929,9 em 1956; 774,3 em 1957, e 635,7 em 1958.
A redução da receita de divisas originária do café pesa sobre nosso balanço de pagamentos, agravando o crônico déficit que decorre da crescente evasão de renda sob a forma de remessas de rendimentos do capital estrangeiro e pagamentos de fretes e seguros marítimos. Se em 1956, excepcionalmente, o balanço de pagamentos acusou um superávit de 166 milhões de dólares, a situação se inverteu em 1957 com um déficit de 204 milhões de dólares. Nos nove primeiros meses de 1958, o déficit do balanço de pagamentos já era de 176,5 milhões de dólares. Esta situação se torna particularmente crítica em virtude da necessidade de numerosas importações essenciais e dos vultosos pagamentos correspondentes a empréstimos e financiamentos, que recairão sobre o país neste e nos próximos anos. A aguda escassez de divisas, aliada à desvalorização interna do cruzeiro, provocou uma alta acima de 120% das cotações do dólar e de outras divisas no decurso do ano de 1958. Em conseqüência, sofreram rápida majoração os preços dos artigos importados, em sua grande maioria bens de produção, o que se refletiu nos preços dos artigos de produção interna, aumentando a pressão inflacionária e a carestia da vida. A elevação desenfreada dos custos de produção agrava a instabilidade da economia nacional, enquanto a carestia da vida impõe sacrifícios cada vez mais pesados às massas populares.
A situação no comércio exterior e no balanço de pagamentos revela, de maneira particularmente expressiva, o caráter dependente e ainda atrasado da economia nacional. Enquanto o comércio exterior se baseia num único produto agrícola e permanece amarrado a um mercado monopolista — o dos Estados Unidos —, a receita cambial de nosso país sofre todos os anos substancial sangria provocada pelo capital estrangeiro, sobretudo o norte-americano. O desenvolvimento econômico dos últimos vinte anos vem se processando nos quadros gerais desta dependência para com o imperialismo norte-americano. É inevitável, por isso, que o desenvolvimento se choque com os fatores de sua dependência, o que aprofunda, especialmente numa conjuntura de maiores dificuldades econômico-financeiras nacionais e internacionais, a contradição entre a nação brasileira e o imperialismo norte-americano e seus agentes internos.
Compreende-se, por conseguinte, que a oposição entre nacionalistas e entreguistas não pode atenuar-se, não pode ser superada pela conciliação, mas tende a contínuo aprofundamento. Esta oposição se manifesta no seio do governo atual, dado o caráter heterogêneo que assumiu e que conserva desde sua formação inicial.
Apoiado no movimento nacionalista, o setor nacionalista do governo tem defendido com sucesso, em alguns pontos essenciais, uma política correspondente aos interesses gerais da nação. Isto é patente na defesa dos minerais atômicos e, sobretudo, na manutenção do monopólio estatal do petróleo, cujo êxito, consubstanciado no progresso constante da Petrobrás, estimula a confiança do povo brasileiro em suas próprias forças. No que se refere ao café, continua em vigor, apesar de sérias vacilações, a política nacionalista de defesa de seus preços externos, em aliança com os demais produtores da América Latina, contra as manobras baixistas dos monopólios norte-americanos.
É inegável, todavia, que os elementos entreguistas se reforçaram ultimamente no governo, ocupando a maioria das posições-chave que dizem respeito à direção da política econômico-financeira, o que se tornou evidente sobretudo a partir da subida do Sr. Lucas Lopes ao Ministério da Fazenda, acolitado pelos srs. Roberto Campos, presidente do BNDE, e Garrido Torres, diretor executivo da SUMOC. Daí porque, embora contenha aspectos nacionalistas, a política econômico-financeira do governo tem acentuado as concessões ao imperialismo norte-americano, procurando fórmulas que conciliem os interesses exploradores deste último a um certo tipo de desenvolvimento econômico limitado e deformado, que só pode vir a aumentar a situação de dependência do país e lançar sobre as massas trabalhadoras o peso de maiores sacrifícios.
Esta tendência se manifesta mais claramente na conservação inalterada do estado de subordinação do comércio exterior aos monopólios dos EUA e no incremento de escandalosos favores ao capital estrangeiro. Enquanto as empresas nacionais se debatem com a elevação vertical dos custos de importação, com a quase impossibilidade de financiamentos externos e com as crescentes dificuldades de crédito, prossegue a política inaugurada pela instrução 113, que abre as portas à penetração do capital estrangeiro e conduz à desnacionalização de importantes setores de nossa indústria. Poderosas empresas imperialistas recebem grandes privilégios de órgãos governamentais como o GEIA e o GEICON, ganhando posições de domínio nas nascentes indústrias de autoveículos e de construção naval, tão necessárias ao progresso da economia brasileira.
As remessas de rendimentos do capital estrangeiro não têm limitação legal, embora o país se veja a braços com uma séria crise cambial. Pondo em prática recentes instruções da SUMOC, o governo se encaminhou francamente no sentido de uma reforma cambial que será prejudicial à industrialização e elevará ainda mais o custo da vida para as massas. Por iniciativa e empenho do governo, o Congresso aprova, na nova lei do imposto de renda, o dispositivo que permite a reavaliação bienal do ativo imobilizado das empresas, beneficiando diretamente trustes imperialistas como a Light e a Bond and Share. Igualmente em benefício de grandes empresas imperialistas foi recentemente abolido o monopólio estatal da importação de borracha.
O governo do Sr. Juscelino Kubítschek tomou em 1958 duas iniciativas, a que se esforçou para conferir transcendente envergadura. Nessas iniciativas — Operação Pan-americana e Programa de Estabilização Monetária —, reflete-se a orientação vacilante e contraditória do governo, tendente à conciliação com o imperialismo norte-americano.
A Operação Pan-americana manifesta abertamente, no próprio plano oficial, uma situação de crise da política exterior, seguida no após-guerra, de subordinação ao Departamento de Estado. O Sr. Juscelino Kubitschek procurou expressar na OPA as aspirações nacionais de luta contra o subdesenvolvimento e reclamou para os países latino-americanos, em suas relações com os Estados Unidos, igualdade de direitos na solução dos problemas internacionais, tomando assim uma atitude que se afasta das normas tradicionais da política exterior brasileira. É compreensível, por isso, o apoio que recebeu de alguns setores nacionalistas da burguesia.
Mas em seus princípios e em sua plataforma prática, a OPA pretende manter a política externa do país na dependência da política anti-soviética dos Estados Unidos e subordinar o desenvolvimento econômico do país à "ajuda" do imperialismo norte-americano. Nisto, precisamente, reside a contradição essencial da OPA: a ajuda é solicitada ao imperialismo norte-americano que é o principal causador do subdesenvolvimento da América Latina e que, por sua natureza intrínseca, não pode senão tender à exploração e à opressão.
Toda uma longa experiência demonstra que a concessão de créditos pelas instituições bancárias oficiais ou privadas dos Estados Unidos não se faz, geralmente, sem a imposição de duras exigências econômicas e políticas contrárias aos interesses dos países recebedores dos créditos. No caso de nosso país, sabe-se que a mais importante dessas exigências consiste na entrega do petróleo brasileiro aos trustes ianques.
Como tentativa de conciliação de certas reivindicações nacionalistas aos interesses do imperialismo norte-americano, a OPA não superou a crise da política exterior. Ao mesmo tempo, porém, o lançamento da OPA veio criar dificuldades aos círculos dirigentes de Washington, colocando na ordem do dia a questão das relações desiguais dos Estados Unidos com a América Latina, e tornou mais viva na opinião pública brasileira a aspiração a uma política exterior verdadeiramente nova, orientada no sentido da paz, do progresso econômico e da completa emancipação nacional.
O Programa de Estabilização Monetária, apresentado pelo ministro Lucas Lopes, constitui um conjunto de medidas de nítida inspiração norte-americana. Medidas idênticas estão sendo aplicadas em outros países, como na Argentina e no Paraguai, a conselho, segundo se declara oficialmente, do Fundo Monetário Internacional, representando condições para a concessão de novos empréstimos. A orientação do Programa do ministro Lucas Lopes objetiva, fundamentalmente, criar condições que permitam maiores aplicações de capital estrangeiro, sobretudo no que se refere às facilidades para as remessas de seus rendimentos. Este o sentido das medidas propostas, aberta ou veladamente, como a reforma cambial com a desvalorização do cruzeiro, a compressão de importações essenciais e a quase proibição de financiamentos externos para o capital nacional, a concessão de diversas prioridades e privilégios ao setor de exportação, etc. Ao mesmo tempo, faz o Programa uma série de propostas de contenção da inflação através de maiores sacrifícios lançados sobre as massas (aumento de impostos indiretos, congelamento de salários e vencimentos) e da redução da taxa de crescimento da economia nacional (diminuição dos investimentos públicos e violenta restrição de crédito).
Recebido com protestos pela classe operária, pelo funcionalismo e pelas massas populares em geral, que sofrem os efeitos da carestia da vida, o PEM foi também severamente criticado pelos órgãos representativos da burguesia, sobretudo no que se refere à restrição de crédito e ao aumento do imposto de renda.
Apesar da inoperância de suas medidas contra a inflação que se acelerou extraordinariamente nos últimos meses, e embora já tenha sido obrigado a fazer às massas concessões contrárias ao esquema do PEM, o governo insiste na sua aplicação, já tendo obtido do Congresso os aumentos de impostos pleiteados e dado novos passos para uma reforma cambial contrária aos interesses nacionais.
O governo do Sr. Juscelino Kubitschek tenta prosseguir no caminho da conciliação com o imperialismo norte-americano. Por esse caminho, porém, não será solucionada a contradição principal, que continua objetivamente se aprofundando.
Aumentam as condições favoráveis à ampliação da frente única nacionalista e ao desenvolvimento das lutas de massas. Novos e novos setores do povo brasileiro adquirem consciência da necessidade de lutar pela emancipação nacional, contra o imperialismo norte-americano. A defesa aberta das teses entreguistas se torna cada vez mais difícil perante a opinião pública. O sentido dos acontecimentos não é, portanto, favorável ao entreguismo, apesar de todos os esforços dos seus agentes para desorientar e ganhar certos setores do movimento nacionalista. Ao contrário, o sentido dos acontecimentos favorece objetivamente a ampliação e a coesão cada vez maior da frente única nacionalista e democrática.
Com o agravamento das dificuldades econômico-financeiras e a acentuação, na política do governo, de tendências à conciliação e à capitulação diante do imperialismo norte-americano, torna-se mais viva no povo brasileiro a consciência da necessidade de lutar pela conquista de um governo nacionalista e democrático. Esta consciência se traduz de diversas maneiras, na luta para alterar os rumos do atual governo, exercendo pressão para alcançar modificações na sua política e na sua composição.
Os fatos comprovam o que afirmou nossa Declaração de Março de 1958: "A política do governo do Sr. Juscelino Kubitschek não atende aos interesses nacionais e às aspirações populares em questões essenciais, contendo, entretanto, aspectos positivos de caráter nacionalista e democrático. À medida em que os aspectos negativos da atuação do governo se tornam mais evidentes, acentua-se a luta por modificações em sua composição e em sua política em sentido favorável aos interesses nacionais e populares."
III - A Luta de Massas por um... >>>
Inclusão | 13/06/2006 |