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Primeira edição: Pravda, n° 49, 4 de março de 1923. Assinado: N. Lênin V. I. Lênin. Obras, 4.ª ed. em russo, t. 33, págs. 445/460
Fonte: A aliança operário-camponesa, Editorial Vitória, Rio de Janeiro, Edição anterior a 1966 - págs. 619-632
Tradução: Renato Guimarães, Fausto Cupertino Regina Maria Mello e Helga Hoffman de "La Alianza de la Clase Obrera y el Campesinado", publicado por Ediciones en Lenguas Extranjeiras, Moscou, 1957, que por sua vez foi traduzido da edição soviética em russo, preparada pelo Instituto de Marxismo-Leninismo adjunto ao CC do PCUS, Editorial Política do Estado, 1954. Capa e apresentação gráfica de Mauro Vinhas de Queiroz
HTML: Fernando Araújo.
Direitos de Reprodução: licenciado sob uma Licença Creative Commons.
No que se refere ao melhoramento do nosso aparelho estatal, a Inspeção Operaria e Camponesa (Rabkrin), a meu ver, não deve esforçar-se exageradamente no sentido da quantidade, nem apressar-se. Tivemos até agora tão pouco tempo para nos ocupar da qualidade do aparelho de nosso Estado, que seria legítimo cuidar de que sua preparação fosse especialmente rigorosa, preocupar-nos em concentrar na Rabkrin um material humano realmente moderno, isto é, que não esteja atrasado em relação aos melhores modelos da Europa ocidental. Naturalmente, esta é uma condição bastante modesta para uma república socialista. Mas os primeiros cinco anos causaram-nos bastante desconfiança e ceticismo. Nós, involuntariamente, somos inclinados a nos deixar influenciar por esta desconfiança e este ceticismo diante daqueles que, excessiva e levianamente falam, sem mais nem menos, por exemplo, da «cultura proletária»: para começar, bastaria que tivéssemos uma verdadeira cultura burguesa; para começar bastaria que soubéssemos prescindir dos tipos mais característicos de cultura pré-burguesa, isto é, de uma cultura burocrática ou feudal, etc. Nos problemas da cultura o mais prejudicial é a pressa, é querer abarcar tudo de uma só vez. Muitos dos nossos jovens literatos e comunistas deveriam gravar isto em sua memória.
Pois bem, no que se refere ao problema do aparelho estatal, devemos concluir da experiência anterior que seria melhor ir mais devagar.
Nosso aparelho estatal encontra-se em um estado tão lamentável, para não dizer detestável, que, em primeiro lugar devemos pensar profundamente na maneira de lutar contra suas deficiências, lembrando que as raízes destas encontram-se no passado, o qual, apesar de ter sido subvertido, não desapareceu por completo, não passou à situação de uma cultura pertencente a tempos remotos. Se coloco aqui a questão da cultura é porque nestas coisas deve ser considerado como atingido só aquilo que entrou na cultura, na vida diária, nos costumes. É entre nós, pode dizer-se que o que há de bom na organização social não foi pensado a fundo, não foi compreendido nem sentido, foi tomado superficialmente, não foi comprovado, nem experimentado, nem confirmado pela experiência, nem consolidado, etc. Naturalmente, não podia ser de outro modo em uma época revolucionaria e com a rapidez vertiginosa do desenvolvimento que, em cinco anos, levou-nos do tzarismo ao regime soviético.
É preciso reconhecer os erros em tempo. É preciso ter uma salutar desconfiança em relação a um movimento de avanço precipitado, em relação a toda jactância, etc., é preciso verificar e corrigir cada passo à frente que damos e proclamamos, a cada instante, e cujo caráter pouco firme, inconsistente e irracionável demonstramos logo em seguida. O mais prejudicial neste caso seria a pressa. O mais nocivo seria acreditar que sabemos algo, ainda que pouco, ou que, existe entre nós um número considerável de elementos para a organização de um aparelho realmente novo, que realmente mereça o nome de socialista, de soviético, etc.
Não. Em nosso país tal aparelho, e mesmo o número de elementos que o formam, é ridiculamente pequeno e devemos ter em mente que, para criá-lo, não se deve poupar tempo, que é preciso empregar nisso muitos, muitos e muitíssimos anos.
Que elementos possuímos para criar este aparelho? Somente dois: em primeiro lugar, os operários, entusiasmados com a luta em prol do socialismo. Estes elementos não estão suficientemente instruídos. Gostariam de dar-nos um aparelho melhor, mas não sabem como fazê-lo. Não podem fazê-lo. Ainda não alcançaram o desenvolvimento, a cultura indispensável para isto. É para isto é necessário precisamente cultura. Neste sentido não se pode fazer nada repentinamente, por assalto, com habilidade ou energia, ou com qualquer outra das melhores qualidades humanas. Em segundo lugar, temos alguns conhecimentos, alguma educação e instrução que são risíveis de tão escassos, em comparação com todos os outros Estados.
É neste sentido não se pode esquecer que ainda estamos muito inclinados a compensar estes conhecimentos (ou crer que podemos compensá-los) com a dedicação, a precipitação, etc.
Para renovar nosso aparelho estatal temos que, a todo custo, nos colocar como tarefa: primeiro, estudar, segundo, estudar, terceiro, estudar e depois cuidar de que a ciência não fique reduzida a letra morta ou a uma frase da moda (coisa que, não há porque ocultá-lo, ocorre com muita frequência entre nós), de que a ciência se converta efetivamente em nossa carne e osso, de que chegue a ser plena e verdadeiramente um elemento integrante da vida diária. Em uma palavra, não temos que exigir o que exige a burguesia da Europa ocidental, mas aquilo que é digno e conveniente para um país que pretende desenvolver-se como país socialista.
Concluindo esta exposição: devemos fazer da Rabkrin, instrumento destinado a promover a melhoria de nosso aparelho, um organismo realmente modelar.
Para que ela possa alcançar o nível adequado, é preciso ater-se à regra: mede sete vezes antes de cortar.
Para isso é preciso que o que exista de verdadeiramente melhor em nosso regime social seja aplicado à criação do novo Comissariado do Povo com o máximo de cuidado, reflexão e conhecimento.
Para isso é preciso que os melhores elementos de nosso regime social, ou seja, os operários avançados, em primeiro lugar, e, em segundo lugar, os elementos realmente instruídos — dos quais se possa dizer que não confiarão em palavras, nem dirão uma só palavra contra sua consciência — não temam confessar qualquer dificuldade nem temam luta alguma para alcançar o fim que conscienciosamente colocaram diante de si.
Há cinco anos estamos atarefados no melhoramento do nosso aparelho estatal, mas disso resultou somente uma movimentação que, depois de cinco anos, demonstrou apenas sua ineficácia, e mesmo sua inutilidade e nocividade. É, como toda movimentação, dava-nos impressão de trabalho, mas, em verdade, entorpecia nossas instituições e obstruía nossos cérebros.
É preciso, enfim, que tudo isso mude.
É preciso ter como norma: mais vale pouco em quantidade, mas bom em qualidade. É preciso seguir a regra: mais vale esperar dois, ou mesmo três anos, do que se apressar, sem qualquer esperança de conseguir um bom material humano.
Sei que esta norma será difícil de manter e aplicar à nossa realidade. Sei que a norma contrária tratará de abrir caminho valendo-se de mil subterfúgios. Sei que será preciso opor enorme resistência, que será preciso dar provas de uma perseverança diabólica, que neste sentido o trabalho será, pelo menos durante os primeiros anos, tremendamente ingrato; não obstante, estou convencido de que só por meio deste trabalho atingiremos nosso objetivo e que, somente depois de havê-lo atingido, criaremos uma república realmente digna de ser chamada soviética, socialista, etc., etc.
Provavelmente, muitos leitores terão julgado extremamente insignificantes as cifras que citava como exemplo em meu primeiro artigo.(1) Estou certo de que se poderiam apresentar muitos cálculos para demonstrar a insuficiência dessas cifras. Mas creio que acima destes e de toda espécie de cálculos temos que pôr uma coisa: o interesse por uma qualidade verdadeiramente modelar.
Considero que precisamente agora chegou, afinal, o momento em que devemos ocupar-nos de nosso aparelho estatal, como é devido, com toda a seriedade, o momento em que o traço talvez mais prejudicial neste trabalho será a pressa. Por isto, previno contra o aumento dessas cifras. Pelo contrário, a meu ver, neste caso é preciso ser extremamente comedido com as cifras. Falemos com franqueza. O Comissariado do Povo da Inspeção Operaria e Camponesa não goza atualmente da menor sombra de prestígio. Todos sabem que não há instituição mais desorganizada do que nossa Rabkrin e que, nas condições atuais, nada podemos pedir a este Comissariado. É preciso levar isto bem em conta, se verdadeiramente queremos enfrentar a tarefa de forjar, ao cabo de alguns anos, uma instituição que, em primeiro lugar, deve ser modelo; em segundo lugar, deve inspirar a todos absoluta confiança e, em terceiro lugar, deve demonstrar a todos e a cada um que está realmente justificado o trabalho de tão alta instituição quanto é a Comissão Central de Controle. A meu ver, devemos rejeitar imediata e irrevogavelmente, toda espécie de normas gerais sobre o número de empregados. Temos que selecionar os empregados da Rabkrin de modo especial e só por meio de provas rigorosíssimas. Com efeito, que sentido teria criar um Comissariado do Povo no qual o trabalho se realizasse de qualquer maneira, sem inspirar, outra vez, a menor confiança, e cuja palavra gozasse apenas de uma autoridade ínfima? Creio que nosso principal objetivo, dado o gênero de reorganização que ora nos propomos, é evitar isto.
Os operários que promovermos como membros da Comissão Central de Controle devem ser inatacáveis como comunistas, e creio que ainda será preciso que nos esforcemos durante muito tempo para ensinar-lhes os métodos e finalidades de seu trabalho. Além disso, como auxiliares neste trabalho, deverá haver um número determinado de pessoal de secretaria, o qual será submetido a uma prova tripla antes de ser designado para cada um dos cargos. Finalmente, os funcionários que decidirmos colocar imediatamente a título de exceção como empregados da Rabkrin devem reunir as seguintes condições:
Sei que estas exigências pressupõem condições extremamente severas e temo que a maioria dos «práticos» da Rabkrin as considere irrealizáveis ou as acolha com um sorriso de desprezo. Mas pergunto a qualquer dos atuais dirigentes da Rabkrin, ou às pessoas que estão em contato com ela, se me podem dizer em sã consciência que necessidade há, na prática, de um Comissariado do Povo como o da Inspeção Operaria e Camponesa. Creio que esta pergunta os ajudará a encontrar o sentido da medida. Ou bem não vale a pena ocupar-se com uma nova reorganização, das quais já tivemos tantas, de algo tão desengonçado como a Rabkrin, ou então é preciso colocar-se verdadeiramente como tarefa criar, em um processo lento, difícil e fora do comum, recorrendo a numerosas comprovações, algo realmente exemplar, capaz de impor respeito a todos e a cada um, e não só porque os títulos e hierarquias o exijam.
Se não vamos armar-nos de paciência, se não vamos dedicar a este trabalho vários anos, é melhor não iniciá-lo.
A meu ver, dos estabelecimentos que já criamos em quantidade — institutos superiores de trabalho, etc. — é preciso escolher um mínimo, ver se estão bem organizados, e só permitir que continuem funcionando se de fato estão à altura da ciência moderna e nos proporcionam todas as conquistas desta. Então, não será utópico esperar que, ao cabo de alguns anos, tenhamos instituição capaz de cumprir suas atribuições, isto é, trabalhar sistemática e inflexivelmente, gozando da confiança da classe operária, do Partido Comunista da Rússia e de toda a massa da população de nossa república, para melhorar nosso aparelho de Estado.
Poderiam começar desde já os trabalhos preparatórios neste sentido. Se o Comissariado do Povo da Inspeção Operaria e Camponesa estivesse de acordo com este plano de reorganização, poderia começar imediatamente a dar os passos preliminares para trabalhar de modo sistemático, até levá-la a bom termo, sem apressar-se e sem renunciar a reformar o que já estiver feito.
Qualquer decisão incompleta nesta questão seria extremamente prejudicial. Todas as normas para os empregados da Rabkrin que partirem de qualquer outra consideração, estarão, no fundo, baseadas nas antigas considerações burocráticas, nos velhos preconceitos, em tudo aquilo que já foi condenado, no que provoca o riso de todos, etc.
Em essência, o problema coloca-se da seguinte maneira:
Ou demonstrar agora que realmente aprendemos algo no domínio da construção do Estado (não é pecado algum aprender algo em cinco anos), ou demonstrar que ainda não estamos maduros para isso: e então não vale a pena começar o trabalho.
Creio que com o material humano de que dispomos não será falta de modéstia supor que já aprendemos o suficiente para reconstruir sistematicamente pelo menos um Comissariado do Povo. É verdade que este Comissariado do Povo deve orientar todo o nosso aparelho estatal em seu conjunto.
Anunciar imediatamente um concurso para a redação de dois ou mais manuais sobre a organização do trabalho em geral e especialmente sobre o trabalho administrativo. Pode tomar-se como base o livro de Iermanski, que já temos à mão, se bem que este autor, diga-se de passagem, caracteriza-se por sua simpatia manifesta para com o menchevismo e não serve para compor um manual adequado para o Poder Soviético. Também se pode tomar como base o livro recentemente publicado de Kerjentsev e, finalmente, podem também ser uteis alguns dos manuais parciais que possuímos.
Enviar algumas pessoas preparadas e conscienciosas à Alemanha ou à Inglaterra para recolher bibliografia e fazer estudos sobre esta questão. É digo Inglaterra no caso de não ser possível enviá-los aos Estados Unidos ou ao Canadá.
Nomear uma comissão encarregada de redigir um programa prévio para os exames dos candidatos a empregados da Rabkrin, bem como para os candidatos a membros da Comissão Central de Controle.
Estes trabalhos, e outros semelhantes, é claro, não deverão atrapalhar o trabalho do Comissariado do Povo, nem dos membros do Conselho da Rabkrin, nem do Presidium da Comissão Central de Controle.
Paralelamente a isto, será preciso designar uma comissão preparatória da eleição dos candidatos ao cargo de membros da Comissão Central de Controle. Espero que para este cargo se encontrem agora entre nós candidatos em número mais do que suficiente, tanto entre os colaboradores experimentados de todos os departamentos, como entre os estudantes de nossas escolas soviéticas. É bem duvidoso que seja justo excluir de antemão esta ou aquela categoria. Provavelmente, será preferível para tal departamento um pessoal variado, no qual temos que buscar numerosas qualidades reunidas, diferentes méritos unidos; por conseguinte, será necessário dedicar-se à tarefa de elaborar uma lista de candidatos. Por exemplo, o que menos seria de desejar é que o novo Comissariado do Povo se constituísse segundo um padrão único, suponhamos, do tipo de gente que caracteriza a burocracia, ou com exclusão de pessoas do tipo dos agitadores e de pessoas cujo traço característico é a sociabilidade ou capacidade de penetrar em círculos não muito habituais para este grupo de trabalhadores, etc.
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Creio que expressarei melhor meu pensamento se comparar meu plano com as instituições do tipo acadêmico. Os membros da Comissão Central de Controle, sob a direção de seu Presidium, deverão trabalhar de um modo sistemático no exame de todos os papéis e documentos do Birô Político. Ao mesmo tempo, deverão distribuir corretamente seu tempo entre os diversos trabalhos, no controle do expediente em nossos organismos, começando pelos menores e de base, e terminando com as instituições superiores do Estado. Por último, entre suas tarefas também se incluirá o estudo da teoria, isto é, da teoria da organização daquele trabalho ao qual pretendem dedicar-se, bem como exercícios práticos sob a orientação quer de antigos camaradas, quer de professores das escolas superiores de organização do trabalho.
Creio, entretanto, que de modo algum deverão limitar-se a este tipo de trabalhos acadêmicos. Ao par disto, deverão capacitar-se para trabalhos que me atreveria a chamar de preparação para a caça, não direi para a caça de malandros, mas algo no estilo, e de invenção de estratagemas destinados a dissimular suas campanhas, seus procedimentos, etc.
Nas instituições da Europa ocidental tais proposições provocariam uma indignação inaudita, um sentimento de escândalo moral, etc., mas acredito que nós não nos burocratizamos a esse ponto. Entre nós, a Nep não teve ainda tempo de adquirir uma autoridade tal que nos sentíssemos injuriados com a ideia de que alguém pudesse ser caçado. A edificação de nossa República soviética é tão recente e há tanta mixórdia, que a ninguém ocorrerá sentir-se ofendido diante da ideia de que entre este montão de imundície possam ser efetuadas indagações por meio de alguns ardis, com ajuda de investigações dirigidas às vezes a fontes bastante longínquas ou por caminhos bastante sinuosos; e se isto passasse pela cabeça de alguém, certamente todos nós iríamos rir gostosamente.
Esperamos que nossa nova Rabkrin deixe de lado essa qualidade que os franceses chamam de pruderie e que nós chamaríamos ridícula hipocrisia ou petulância ridícula que, até o último extremo, faz o jogo de toda a nossa burocracia, tanto dos sovietes como do Partido. Diga-se de passagem, em nosso país costuma haver burocracia não só nas instituições dos sovietes, mas também nas do Partido.
Se antes disse que devemos aprender e aprender nas escolas superiores de organização do trabalho, etc., isto não significa, de modo algum, que eu compreenda esta «aprendizagem» em uma forma escolar ou que me limite à ideia de ensinar somente de maneira escolar. Espero que nem um só verdadeiro revolucionário suspeite de que renuncio a entender por «aprendizagem» alguma manobra zombeteira, alguma astúcia, artimanha ou algo nesse estilo. Sei que em um Estado ocidental, cerimonioso e sério, esta simples ideia provocaria verdadeiro horror, e nenhum funcionário respeitável concordaria em discuti-la. Mas acredito que ainda não estamos burocratizados a este ponto e que entre nós a discussão desta ideia não poderá provocar senão risos.
Com efeito, por que não unir o útil ao agradável? Por que não nos permitir uma brincadeira ou quase brincadeira, para descobrir algo ridículo, algo daninho, algo meio ridículo, meio nocivo, etc.?
Parece-me que nossa Rabkrin ganharia muito se levasse em conta estas considerações, e que a lista dos casos em que nossa Comissão Central de Controle ou seus colegas da Rabkrin obtiveram algumas de suas mais brilhantes vitórias será enriquecida com façanhas extraordinárias de nossos futuros «rabkrinistas» e colaboradores da Comissão Central de Controle em lugares que não é muito decoroso mencionar nos respeitáveis e cerimoniosos manuais.
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Como podem fundir-se as instituições do Partido com as dos sovietes? Não há aqui algo inadmissível?
Coloco estas perguntas não em meu nome, mas no daqueles a que me referi antes, ao dizer que há burocratas não só em nossas instituições dos sovietes, mas também nas do Partido.
Por que, pois, não fundir umas com as outras, se os interesses do trabalho o reclamam? Ninguém terá percebido ate agora que em um Comissariado do Povo como o de Negócios Estrangeiros tal fusão é de extraordinária utilidade e é praticada desde seu próprio início? Acaso não se discutem no Birô Político, do ponto-de-vista do Partido, muitos problemas, grandes e pequenos, sobre nossas «manobras», em resposta às «manobras» das potências estrangeiras, para evitar, por assim dizer, seus estratagemas, para não empregar uma expressão menos decorosa? Não é acaso esta união flexível do elemento soviético com o do Partido uma fonte de extraordinária força em nossa política? Creio que o que se justificou, o que se consolidou em nossa política exterior e já penetrou nos costumes de tal modo que não dá lugar a dúvidas, será adequado, pelo menos na mesma medida (e creio que será muito mais adequado), em relação a todo o nosso aparelho estatal. É é preciso levar em conta que a Rabkrin foi precisamente dedicada a todo o nosso aparelho de Estado, e suas atividades devem abarcar todas as instituições do Estado, sem qualquer exceção, tanto locais, como centrais, tanto comerciais, como puramente burocráticas, tanto de estudos, como de arquivos, teatrais, etc., em suma, a todas sem a menor exceção.
Por que, pois, para uma instituição de tão grande alcance, e para a qual, ademais, se requer extraordinária flexibilidade nas formas de atuação, por que não se pode admitir para essa instituição uma fusão peculiar da instituição de controle do Partido com a instituição de controle dos sovietes?
Eu não veria nisso qualquer inconveniente. Mais ainda: creio que esta fusão constitui a única garantia de um trabalho eficiente. Creio que qualquer dúvida a respeito parte dos rincões mais empoeirados de nosso aparelho estatal e que devemos responder a isso de uma única forma: com zombaria.
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Outra dúvida: Convém unir a atividade do estudo com a atividade do cargo? Parece-me que isto é não só conveniente, como necessário. Falando em termos gerais, chegamos a nos contagiar de toda uma série de preconceitos perniciosos e ridículos da organização estatal da Europa ocidental, apesar de nossa atitude revolucionaria diante da referida organização; e em parte fomos contagiados intencionalmente pelos nossos queridos burocratas, que alimentavam a má intenção de poder pescar nas águas turvas de tais preconceitos; e ele» pescavam tanto nessas águas turvas que somente aqueles dentre nós que estavam inteiramente cegos não viam quão amplamente se praticava essa pesca.
Em todo o domínio das relações sociais, econômicas e políticas somos «terrivelmente» revolucionários. Mas no terreno do respeito à hierarquia, da observância das formas e trâmites de ritual, nosso «revolucionarismo» é substituído amiúde por uma série das mais rançosas rotinas. Neste sentido, mais de uma vez se pôde observar um fenômeno sumamente interessante, ou seja, o de que, na vida social, o salto mais avançado para a frente se alia a um prodigioso temor diante da menor transformação.
É isto se compreende porque os passos mais audazes se fizeram em um terreno que há muito tempo constituía o patrimônio da teoria, em um terreno que era cultivado principalmente ou quase exclusivamente em teoria. O homem russo, diante da odiosa realidade burocrática que tinha diante de si, desafogava seu espírito com especulações teóricas de uma audácia extraordinária, razão pela qual essas especulações teóricas excessivamente audazes adquiriam entre nós um caráter particularmente unilateral. Conviviam entre nós, uma ao lado da outra, a audácia teórica nas especulações gerais e um surpreendente temor em relação às reformas administrativas mais insignificantes. Qualquer revolução agrária de grande alcance universal era elaborada com audácia sem precedentes em qualquer outro Estado, mas junto disso não havia imaginação suficiente para realizar uma reforma administrativa de décima categoria; não havia imaginação suficiente ou faltava paciência para aplicar a essa reforma os mesmos princípios gerais que haviam dado resultados tão «brilhantes» quando aplicados aos problemas gerais.
É por isso, nossa atual vida diária reúne em si, em grau surpreendente, traços de incrível audácia com a timidez do pensamento diante das menores mudanças.
Creio que não poderia ter sido de outro modo em qualquer revolução verdadeiramente grande, porque as revoluções verdadeiramente importantes nascem das contradições entre o velho, entre o que tende ao cultivo do velho, e a mais abstrata aspiração ao novo, que deve ser tão novo que não contenha nem um pingo do velho.
É quanto mais radical for a revolução, tanto mais prolongado será o período de tempo em que se manterão várias destas contradições.
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O traço geral de nossa vida consiste agora no seguinte: destruímos a indústria capitalista, tratamos de arrasar até seus fundamentos as instituições medievais, a propriedade agrária dos latifundiários, e sobre esta base criamos os pequenos e muito pequenos camponeses, que seguem o proletariado, porque têm confiança nos resultados de seu trabalho revolucionário. Não obstante, não nos será fácil nos mantermos somente com esta confiança até o triunfo da revolução socialista nos países mais desenvolvidos, porque os pequenos e muito pequenos camponeses, sobretudo durante a Nep, mantêm-se, por necessidade econômica, em um nível extremamente baixo de produtividade do trabalho. Além disso, a situação internacional fez com que a Rússia se veja agora precipitada para trás, a que, no conjunto, o rendimento do trabalho do povo seja hoje em nosso país bem menor do que antes da guerra. As potências capitalistas da Europa ocidental, em parte conscientemente, em parte de modo espontâneo, fizeram tudo o que estava a seu alcance para nos lançar para trás, para aproveitar os elementos da guerra civil na Rússia com o objetivo de arruinar o máximo possível o país. Precisamente nesta maneira de acabar a guerra imperialista viam, por certo, vantagens sensíveis: se não chegarmos a derrubar o regime revolucionário na Rússia, em todo caso dificultaremos seu desenvolvimento em direção ao socialismo; mais ou menos assim raciocinavam aquelas potências e, do seu ponto-de-vista, não podiam raciocinar de outro modo. Como resultado, obtiveram êxito parcial em sua tarefa. Não conseguiram derrubar o novo regime criado pela revolução, mas tampouco lhe deram a possibilidade de ter um avanço tal que pudesse justificar os prognósticos dos socialistas, um passo que permitisse a estes desenvolver com colossal rapidez as forças produtivas, desenvolver todas as possibilidades que, em suma, dariam como resultado o socialismo, demonstrar a todo o mundo claramente, com toda a evidência, que o socialismo encerra forças gigantescas e que a humanidade passou agora para uma nova fase de desenvolvimento, que traz em si possibilidades extraordinariamente brilhantes.
O sistema das relações internacionais é atualmente tal que um dos Estados da Europa, a Alemanha, vê-se avassalado pelos Estados vencedores. Por outro lado, diversos Estados, por certo os mais antigos do Ocidente, acham-se, graças à vitória, em condições de poder aproveitar essa vitória mesma para fazer às suas classes oprimidas uma série de concessões que, se bem que insignificantes, retardam o movimento revolucionário nesses países, criando uma aparência de «paz social».
Ao mesmo tempo, muitos outros países — o Oriente, a Índia, a China, etc. — viram-se definitivamente arrancados de sua trilha, precisamente em virtude da última guerra imperialista. Seu desenvolvimento orientou-se definitivamente pela via geral do capitalismo europeu. Nesses países começou a mesma efervescência que se observa em toda a Europa. É para todo o mundo está claro agora que eles entraram em um processo de desenvolvimento que não pode deixar de conduzir à crise de todo o capitalismo mundial.
Assim, pois, neste momento, encontramo-nos diante da seguinte questão: poderemos manter-nos com a produção de nossos pequenos e muito pequenos camponeses, em nosso estado de ruína, até que os países capitalistas da Europa ocidental levem a termo seu desenvolvimento em direção ao socialismo? Mas eles levarão a termo seu desenvolvimento em direção ao socialismo de um modo diferente do que esperávamos anteriormente. Não o levam a termo por um processo gradativo de «maturação» do socialismo em seu seio, mas por meio da exploração de uns Estados pelos outros, por meio da exploração do primeiro entre os Estados vencidos na guerra imperialista, juntamente com a exploração de todo o Oriente. Por outro lado, o Oriente incorporou-se de maneira definitiva ao movimento revolucionário, graças precisamente a esta primeira guerra imperialista, vendo-se arrastado definitivamente à órbita geral do movimento revolucionário mundial.
Qual é a tática que este estado de coisas impõe a nosso país? Evidentemente, a seguinte: devemos manifestar extrema prudência para conservar nosso poder operário, para manter sob sua autoridade e sob sua direção nossos pequenos e muito pequenos camponeses. Temos de nosso lado a vantagem de que todo o mundo já passa agora a um movimento que deve gerar a revolução socialista mundial. Mas também nos encontramos diante do inconveniente de que os imperialistas conseguiram dividir todo o mundo em dois campos, e esta divisão se complica pelo fato de que a Alemanha, país de desenvolvimento capitalista realmente avançado e culto, vê-se a braços com infinitas dificuldades para se levantar. Todas as potências capitalistas do chamado Ocidente cravam nela suas garras e não permitem que ela se levante. É, por outro lado, todo o Oriente, com suas centenas de milhões de trabalhadores explorados, reduzidos ao último extremo, foi posto em condições tais que suas forças físicas e materiais não podem sequer ser comparadas com as forças físicas, materiais e militares de qualquer dos Estados da Europa ocidental, que são muito menores.
Podemos livrar-nos da próxima colisão com estes Estados imperialistas? Podemos esperar que as contradições internas e os conflitos entre os Estados imperialistas prósperos do Ocidente e os Estados imperialistas prósperos do Oriente nos darão, pela segunda vez, uma trégua, igual à que nos deram da primeira vez, quando a cruzada da contrarrevolução da Europa ocidental, destinada a apoiar a contrarrevolução russa, fracassou em virtude das contradições existentes no campo dos contrarrevolucionários do Ocidente e do Oriente, no campo dos exploradores orientais e dos exploradores ocidentais, no campo do Japão e dos Estados Unidos?
A meu ver, é preciso responder a esta pergunta levando em conta que a solução depende aqui de muitíssimas circunstâncias, e só se pode prever o desenlace da luta em seu conjunto com base no fato de que o próprio capitalismo, afinal de contas, ensina e educa para a luta a imensa maioria da população do mundo.
O desenlace da luta depende, em última análise, do fato de que a Rússia, a índia, a China, etc. constituem a imensa maioria da população. É precisamente esta maioria da população é que se incorpora, nos últimos anos com inusitada rapidez, à luta por sua libertação, de modo que, quanto a isso não pode haver sequer sombra de dúvida sobre o desenlace definitivo da luta mundial. Neste sentido, a vitória definitiva do socialismo está plena e absolutamente assegurada.
Mas o que nos interessa não é esta inevitabilidade da vitória final do socialismo. O que nos interessa é a tática que nós, Partido Comunista da Rússia, que nós, Poder Soviético da Rússia, devemos seguir para impedir que os Estados contrarrevolucionários da Europa ocidental nos esmaguem. A fim de assegurar nossa existência até o choque militar seguinte entre o Ocidente imperialista contrarrevolucionário e o Oriente revolucionário e nacionalista, entre os Estados mais civilizados do mundo e os Estados atrasados à maneira oriental, que, entretanto, constituem a maioria, é preciso que esta maioria tenha tempo de civilizar-se. A nós também falta civilização para passar diretamente ao socialismo, embora tenhamos para isso as premissas políticas. Temos que adotar a tática que se segue, ou seja, aplicar para nossa salvação a política seguinte.
Devemos tratar de construir um Estado no qual os operários conservem sua direção sobre os camponeses, no qual conservem a confiança destes e no qual, pela aplicação do mais severo regime de economia, seja eliminado das relações sociais o menor indício de gastos supérfluos.
Devemos reduzir nosso aparelho estatal, economizando o máximo. Devemos eliminar dele todos os indícios de gastos supérfluos, que nos ficaram em tão grande quantidade da Rússia tzarista, de seu aparelho burocrático capitalista.
Não será isto o reino da mediocridade camponesa?
Não. Se conservarmos a direção da classe operária sobre os camponeses, obteremos a possibilidade, por meio de um regime de economia levado ao grau superlativo em nosso Estado, de conseguir que toda a poupança, por menor que seja, se destine ao desenvolvimento de nossa grande indústria mecanizada, para o desenvolvimento da eletrificação, da extração hidráulica do carvão, para a construção da central hidrelétrica do Volkhov, etc.
Nisto, e somente nisto, reside nossa esperança. Só então estaremos em condições, falando em sentido figurado, de nos apear de um cavalo para montar outro, isto é, de desmontar o mísero cavalo camponês, o cavalo do mujique, o cavalo do regime de economias estabelecido para um país camponês arruinado, para montar um cavalo que o proletariado busca e não pode deixar de buscar para si: o cavalo mecanizado da grande indústria, da eletrificação, da central hidrelétrica do Volkhov, etc.
É assim que combino em meu pensamento o plano geral de nosso trabalho, de nossa política, de nossa tática, de nossa estratégia com as tarefas da Rabkrin reorganizada. Nisto reside para mim a justificação dos cuidados excepcionais, da atenção extraordinária que devemos dar à Rabkrin, elevando-a a uma altura excepcional, dando-lhe uma direção, com direitos de Comitê Central, etc.
Esta justificação consiste em que só depurando ao máximo nosso aparelho, reduzindo ao máximo tudo o que não seja absolutamente indispensável, nos manteremos com segurança. É além disso, estaremos em condições de nos manter, não ao nível de um país de pequenos camponeses, não ao nível desta estreiteza generalizada, mas a um nível que se eleva e avança contínua e ininterruptamente em direção à grande indústria mecanizada.
Eis aqui as elevadas tarefas que imagino para a nossa Rabkrin. Eis porque planejo a fusão nela da cúpula mais autorizada do Partido com um Comissariado do Povo «comum».
2 de março de 1923
Notas de rodapé:
(1) V. I. Lênin, Como Temos que Reorganizar a Rabkrin. Obras Escolhidas em dois tomos. ed. em espanhol, págs. 1057/1062. (Nota da Compilação) (retornar ao texto)