Publicado: em 24 de Julho de 1920 no n° 162 do Pravda e em 7 de Agosto de 1920 no nº 6 do Vestnik 2-go Kongressa Kommunistítchesogo Internatsionala.
Fonte: Obras Escolhidas em três tomos, Edições "Avante!", 1977, t3, pp 367-385.
Tradução: Edições "Avante!" com base nas Obras Completas de V. I. Lénine, 5.ª ed. em russo, t.41, pp. 215-235 e 241-247.
Transcrição e HTML: Manuel Gouveia
Direitos de Reprodução: © Direitos de tradução em língua portuguesa reservados por Edições "Avante!" - Edições Progresso Lisboa - Moscovo.
(Clamorosa ovação. Toda a sala se põe de pé e aplaude. O orador tenta falar, mas continuam os aplausos e as exclamações em todas as línguas. A ovação prolonga-se.) Camaradas, as teses sobre as questões relativas às tarefas fundamentais da Internacional Comunista foram publicadas em todas as línguas, e não representam nada de essencialmente novo (em particular para os camaradas russos), porque em grande medida alargam alguns traços fundamentais da nossa experiência revolucionária e as lições do nosso movimento revolucionário a uma série de países ocidentais, à Europa Ocidental. Por isso deter-me-ei no meu relatório um pouco mais, ainda que em breves traços, na primeira parte do meu tema, a saber: a situação internacional.
As relações económicas do imperialismo constituem a base de toda a situação internacional, tal como ela se apresenta agora. Ao longo de todo o século XX definiu-se por completo este novo estádio, superior e último, do capitalismo. Todos vós sabeis, naturalmente, que o traço mais característico e essencial do imperialismo consiste em que o capital atingiu proporções imensas. A livre concorrência foi substituída por um monopólio de proporções gigantescas. Um número insignificante de capitalistas pôde por vezes concentrar nas suas mãos ramos industriais inteiros; eles passaram para as mãos de uniões, cartéis, consórcios, trusts, frequentemente de carácter internacional. Deste modo, os monopolistas apoderaram-se de ramos inteiros da indústria sob o aspecto financeiro, sob o aspecto do direito de propriedade e, em parte, sob o aspecto da produção, não apenas em alguns países, mas em todo o mundo. Neste terreno desenvolveu-se o domínio, anteriormente desconhecido, de um número insignificante dos maiores bancos, de reis da finança, de magnatas da finança, que transformaram de facto até as repúblicas mais livres em monarquias financeiras. Antes da guerra, isto era abertamente reconhecido, por exemplo, por escritores que nada têm de revolucionários, como Lysis em França.
Este domínio de um punhado de capitalistas atingiu o seu pleno desenvolvimento quando todo o globo terrestre foi partilhado, não só no sentido da conquista das diversas fontes de matérias-primas e meios de produção pelos maiores capitalistas, mas também no sentido da conclusão da partilha prévia das colónias. Há 40 anos, a população das colónias era calculada em um pouco mais de 250 milhões de habitantes, que estavam submetidos a seis potências capitalistas. Antes da guerra de 1914, calculava-se que nas colónias havia já cerca de 600 milhões de habitantes, e, se juntarmos países como a Pérsia, a Turquia e a China, que então estavam já na situação de semicolónias, teremos em números redondos uma população de mil milhões, que era oprimida pelos países mais ricos, civilizados e livres, mediante a dependência colonial. E vós sabeis que, além da dependência jurídica estatal directa, a dependência colonial pressupõe toda uma série de relações de dependência financeira e económica, pressupõe toda uma série de guerras, que não eram consideradas guerras porque se reduziam frequentemente a uma carnificina em que as tropas imperialistas americanas e europeias, apetrechadas com as armas de extermínio mais aperfeiçoadas, massacravam os habitantes indefesos e desarmados dos países coloniais.
Desta partilha de toda a Terra, deste domínio dos monopólios capitalistas, desta omnipotência de um número insignificante dos maiores bancos - dois, três, quatro, no máximo cinco por Estado - nasceu, inevitavelmente, a primeira guerra imperialista de 1914-1918. Esta guerra foi feita para redividir todo o mundo. A guerra foi feita para determinar qual dos dois reduzidos grupos dos maiores Estados - o inglês ou o alemão - obteria a possibilidade e o direito de saquear, estrangular e explorar toda a Terra. E vós sabeis como a guerra decidiu esta questão a favor do grupo inglês. E em resultado dessa guerra temos uma agudização incomensuravelmente maior de todas as contradições capitalistas. A guerra lançou de repente uns 250 milhões de habitantes da Terra para uma situação equivalente à colonial. Lançou a Rússia, que conta cerca de 130 milhões, a Áustria-Hungria, a Alemanha e a Bulgária, nas quais há não menos de 120 milhões. Duzentos e cinquenta milhões de habitantes em países que, em parte, pertencem aos mais avançados, aos mais cultos e instruídos, como a Alemanha, e que tecnicamente se encontram ao nível do progresso contemporâneo. Pelo Tratado de Versalhes, a guerra impôs-lhes condições tais que povos avançados se viram na situação de dependência colonial, pois em virtude do tratado estão atados por muitas gerações e colocados em condições que nenhum povo civilizado conheceu. Eis o quadro do mundo: imediatamente depois da guerra, pelo menos 1250 milhões de seres humanos estão submetidos à opressão colonial, submetidos à exploração do capitalismo feroz, que se gabava do seu amor à paz, que tinha algum direito a gabar-se disso há cinquenta e cinco anos, quando a Terra não estava ainda repartida, quando o monopólio ainda não dominava, quando o capitalismo podia desenvolver-se de modo relativamente pacífico, sem colossais conflitos militares.
Actualmente, depois dessa época «pacífica», assistimos a uma monstruosa exacerbação da opressão, vemos o regresso a uma opressão colonial e militar ainda pior que a anterior. O Tratado de Versalhes colocou tanto a Alemanha como toda uma série de Estados derrotados numa situação que torna materialmente impossível a sua existência económica, numa situação de completa ausência de direitos e de humilhação.
Qual o número de nações que se aproveitou disso? Para responder a esta pergunta devemos recordar que a população dos Estados Unidos da América, que são os únicos que ganharam plenamente com a guerra e se transformaram inteiramente de um país que tinha uma grande quantidade de dívidas num país a quem todos devem, a sua população não ultrapassa os 100 milhões de habitantes. O Japão, que ganhou muito ao permanecer à margem do conflito europeu-americano e ao apoderar-se do imenso continente asiático, tem 50 milhões de habitantes. A Inglaterra que depois desses países ganhou mais que ninguém, conta com uma população de 50 milhões. E se juntarmos os jekstados neutrais, cuja população é muito pequena e que enriqueceram durante a guerra, obteremos, em números redondos, 250 milhões.
Aí tendes, deste modo, em traços gerais, o quadro do mundo como ele se apresentava depois da guerra imperialista. Mil duzentos e cinquenta milhões de habitantes das colónias oprimidas; países desmembrados como a Pérsia, a Turquia e a China; países que foram derrotados e lançados na situação de colónias. No máximo 250 milhões de habitantes para os países que ficaram incólumes na antiga situação, mas todos eles caíram sob a dependência económica da América e durante toda a guerra todos estiveram militarmente dependentes, porque a guerra abarcou todo o mundo e não permitiu que nenhum Estado se mantivesse verdadeiramente neutral. E, por último, temos um máximo de 250 milhões de habitantes nos países em que, naturalmente, apenas a camada superior, apenas os capitalistas se aproveitaram da partilha da Terra. O total é de cerca de 1750 milhões de habitantes, que constituem toda a população da Terra. Gostaria de recordar-vos este quadro do mundo porque todas as contradições fundamentais do capitalismo, do imperialismo, que conduzem à revolução, todas as contradições fundamentais no movimento operário, que conduziram à luta mais encarniçada contra a II Internacional, do que falou o camarada presidente, tudo isso está ligado à partilha da população da Terra.
É claro que os números citados só ilustram em traços aproximados, fundamentais, o quadro económico do mundo. E é natural, camaradas, que com base nesta partilha da população de toda a Terra tenha aumentado muitas vezes a exploração por parte do capital financeiro, dos monopólios capitalistas.
Não são só os países coloniais e vencidos que caem numa situação de dependência, no próprio interior de cada país vitorioso desenvolveram-se as contradições mais agudas, agravaram-se todas as contradições capitalistas. Mostrá-lo-ei em traços breves com alguns exemplos.
Tomai a dívida pública. Sabemos que as dívidas dos principais Estados europeus cresceram, de 1914 a 1920, pelo menos sete vezes. Citarei mais uma fonte económica, que assume uma importância particularmente grande: Keynes, diplomata inglês e autor do livro As Consequências Económicas da Paz, que, por encargo do seu governo, participou nas negociações de Paz de Versalhes, as observou directamente de um ponto de vista puramente burguês, estudou o assunto passo a passo, em pormenor, e, como economista, tomou parte nas conferências. Chegou a conclusões que são mais incisivas, mais evidentes e mais instrutivas que as de um revolucionário comunista, porque estas conclusões são as de um conhecido burguês, adversário implacável do bolchevismo, do qual ele, como filisteu inglês, tem uma ideia monstruosa, bestial e feroz. Keynes chegou à conclusão de que, com a Paz de Versalhes, a Europa e todo o mundo caminham para a bancarrota. Keynes demitiu-se, lançou o seu livro à cara do governo e disse: cometeis uma loucura. Citar-vos-ei os seus números, que no conjunto se reduzem ao seguinte.
Como se apresentam as relações de devedores e credores entre as principais potências? Converto as libras esterlinas em rublos-ouro, considerando 10 rublos-ouro por libra esterlina. Eis o que se obtém: os Estados Unidos têm um activo de 19000 milhões; o seu passivo é nulo. Antes da guerra eram devedores à Inglaterra. No último congresso do Partido Comunista da Alemanha, em 14 de Abril de 1920, o camarada Levi assinalava com razão no seu relatório que restavam duas potências que agora actuam independentemente no mundo: a Inglaterra e a América. Só a América ficou absolutamente independente do ponto de vista financeiro. Antes da guerra era devedora, agora é apenas credora. Todas as outras potências do mundo são devedoras. A Inglaterra caiu numa situação em que o seu activo é de 17000 milhões, e o passivo 8000 milhões, está já a meio caminho de se tornar devedora. Além disso, no seu activo figuram cerca de 6000 milhões que lhe deve a Rússia. Estão incluídos na dívida os fornecimentos militares que a Rússia recebeu durante a guerra. Há pouco tempo, quando Krássine, como representante do Governo Soviético russo, teve a oportunidade de conversar com Lloyd George sobre o tema dos tratados de dívida, explicou claramente aos cientistas e políticos, chefes do governo inglês, que, se pensavam cobrar essas dívidas, se encontravam num estranho erro. E o diplomata inglês Keynes já lhes tinha revelado esse erro.
Naturalmente, a questão não está só em que, e nem sequer consiste em que o governo revolucionário russo não quer pagar as dívidas. Nenhum governo poderia aceitar pagá-las, porque estas dívidas são um juro usurário sobre aquilo que já foi pago vinte vezes, e este mesmo burguês Keynes, que não sente qualquer simpatia pelo movimento revolucionário russo, diz: «É evidente que não se pode ter em conta essas dívidas.»
No que se refere à França, Keynes cita números deste género: o seu activo é de três mil e quinhentos milhões, o seu passivo de dez mil e quinhentos milhões! E este é o país de que até os franceses diziam que era o usurário de todo o mundo, porque as suas «poupanças» eram colossais, e o saque colonial e financeiro, que lhe tinham proporcionado um capital gigantesco, permitia-lhe conceder empréstimos de milhares e milhares de milhões, em particular à Rússia. Com estes empréstimos obtinha um lucro gigantesco. E apesar disso, apesar da vitória, a França caiu numa situação de devedora.
Uma fonte burguesa americana, citada pelo camarada Braun, comunista, no seu livro Quem Deve Pagar Dívidas de Guerra? (Leipzig, 1920), define da seguinte maneira a relação existente entre as dívidas e a riqueza nacional: nos países vencedores, na Inglaterra e na França, as dívidas representam mais de 50 % de toda a riqueza nacional. Quanto à Itália essa percentagem é de 60 % a 70 %, mas, como sabeis, estas dívidas não nos inquietam, porque pouco antes de aparecer o livro de Keynes tínhamos seguido o seu excelente conselho: anulámos todas as dívidas. (Aplausos clamorosos.)
Keynes não faz mais que revelar neste caso a habitual singularidade filistina: ao aconselhar a anulação de todas as dívidas, diz que, naturalmente, a França só ganhará, que, naturalmente, a Inglaterra não perderá muito, porque, de qualquer modo, não se poderia tirar nada da Rússia; a América perderá bastante, mas Keynes conta com a «generosidade» americana! A este respeito divergimos das concepções de Keynes e dos outros pacifistas pequeno-burgueses. Pensamos que para a anulação das dívidas terão de esperar por outra coisa e de trabalhar numa direcção um pouco diferente, e não na direcção que consiste em contar com a «generosidade» dos senhores capitalistas.
Ressalta destes brevíssimos números que a guerra imperialista criou também para os países vencedores uma situação impossível. A enorme desproporção entre os salários e a subida de preços indica-o igualmente. Em 8 de Março deste ano o Conselho Económico Superior, que constitui uma instituição que defende a ordem burguesa de todo o mundo contra a revolução ascendente, adoptou uma resolução que termina com um apelo à ordem, à assiduidade, à poupança, com a condição, naturalmente, de que os operários continuem a ser escravos do capital. Este Conselho Económico Superior, órgão dos capitalistas de todo o mundo, fez o seguinte balanço.
Nos Estados Unidos da América, os preços dos produtos alimentares subiram em média 120% enquanto os salários cresceram ali apenas 100%. Na Inglaterra, os produtos alimentares subiram 170%, os salários 130%. Na França, os preços dos produtos alimentares subiram 300%, os salários 200%. No Japão, os produtos alimentares subiram 130%, os salários 60% (confronto os números do camarada Braun na sua brochura atrás referida e os do Conselho Económico Superior dados pelo jornal Times(N199) de 10 de Março de 1920).
É claro que em semelhante situação o crescimento da indignação dos operários, o crescimento das ideias e do estado de espírito revolucionários, o crescimento das greves espontâneas de massas é inevitável. Porque a situação dos operários se torna intolerável. Os operários convencem-se pela sua própria experiência de que os capitalistas se enriqueceram imensamente com a guerra e lançam as despesas e as dívidas sobre os ombros dos operários. Recentemente o telégrafo informou-nos que a América quer deportar para cá, para a Rússia, mais 500 comunistas, para se desembaraçar desses «nocivos agitadores».
Mas ainda que a América deportasse para cá não 500, mas 500000 «agitadores» russos, americanos, japoneses, franceses, isso nada modificaria, porque subsistiria esta desproporção dos preços, contra a qual eles nada podem fazer. E nada podem fazer porque a propriedade privada é ali rigorosamente protegida, porque para eles é «sagrada». Não se deve esquecer isto porque a propriedade privada dos exploradores só foi destruída na Rússia. Os capitalistas não podem fazer nada contra essa desproporção dos preços e os operários não podem viver com os antigos salários. Contra esta calamidade nada poderão fazer nenhuns velhos métodos, nenhuma greve isolada, nem a luta parlamentar, nem a votação, porque a «propriedade privada é sagrada», e os capitalistas acumularam tais dívidas que o mundo inteiro está dominado por um punhado de pessoas; entretanto as condições de vida dos operários tornam-se cada vez mais insuportáveis. Não há outra saída além da supressão da «propriedade privada» dos exploradores.
Na sua brochura A Inglaterra e a Revolução Mundial, da qual o nosso Mensageiro do Comissariado do Povo dos Negócios Estrangeiros(N200) de Fevereiro de 1920 publicou valiosos extractos, o camarada Lapínski indica que na Inglaterra os preços de exportação do carvão foram duas vezes maiores do que os previstos pelos círculos industriais oficiais.
No Lancashire chegou-se a uma subida de 400% no valor das acções. Os lucros dos bancos são da ordem dos 40% a 50% no mínimo, e é preciso ainda notar que quando se trata de determinar os lucros dos bancos, todos os banqueiros sabem ocultar a parte leonina dos lucros de tal modo que não os designam como lucros, mas os escondem sob a forma de prémios, percentagens, etc. Também aqui factos económicos indiscutíveis mostram que a riqueza de um ínfimo punhado de pessoas cresceu de maneira incrível, que um luxo inaudito ultrapassa todos os limites, ao mesmo tempo que a miséria da classe operária se agrava cada vez mais. Em particular, há que assinalar ainda a circunstância que o camarada Levi sublinhou com extraordinária clareza no seu relatório citado acima: a modificação do valor do dinheiro. O dinheiro desvalorizou-se em toda a parte em consequência das dívidas, da emissão de papel-moeda, etc. A mesma fonte burguesa que já citei, isto é, a declaração do Conselho Económico Superior de 8 de Março de 1920, calcula que na Inglaterra a depreciação da moeda em relação ao dólar é aproximadamente de um terço; em França e em Itália, de dois terços, e na Alemanha atinge 96%.
Este facto mostra que o «mecanismo» da economia capitalista mundial está a desintegrar-se por completo. Não é possível continuar as relações comerciais em que no capitalismo assenta a obtenção de matérias-primas e a venda dos produtos manufacturados; não é possível continuá-las precisamente pelo facto de que toda uma série de países se encontram submetidos a um só país, devido à modificação do valor do dinheiro. Nenhum dos países mais ricos tem a possibilidade de existir nem tem a possibilidade de comerciar porque não pode vender os seus produtos, não pode receber matérias-primas.
Resulta assim que a própria América, o país mais rico, ao qual estão submetidos todos os países, não pode comprar nem vender. E esse mesmo Keynes, que conheceu por dentro e por fora as negociações de Versalhes, é obrigado a reconhecer esta impossibilidade, apesar de toda a sua decisão inabalável de defender o capitalismo, apesar de todo o seu ódio ao bolchevismo. Seja dito de passagem, não creio que nenhum apelo comunista ou, de modo geral, revolucionário, possa comparar-se, quanto à sua força, às páginas de Keynes onde ele pinta Wilson e o «wilsonismo» na prática. Wilson foi o ídolo dos pequenos burgueses e dos pacifistas do tipo de Keynes e de uma série de heróis da II Internacional (e mesmo da Internacional «segunda e meia»(N1201)) que exaltaram os «14 pontos»(N202) e até escreveram «doutos» livros sobre as «raízes» da política de Wilson, esperando que Wilson salvaria a «paz social», reconciliaria os exploradores com os explorados e realizaria reformas sociais. Keynes pôs a nu com evidência como Wilson se revelou um tolo e todas estas ilusões se dissiparam ao primeiro contacto com a política prática, mercantil, e traficante do capital, na pessoa dos senhores Clemenceau e Lloyd George. As massas operárias vêem agora cada vez mais claramente pela experiência da sua própria vida, e os doutos pedantes poderiam vê-lo com a simples leitura do livro de Keynes, que as «raízes» da política de Wilson se reduziam apenas à estupidez clerical, à frase pequeno-burguesa e à total incompreensão da luta de classes.
De tudo isto decorrem de modo completamente inevitável e natural duas condições, duas situações fundamentais. Por um lado, a miséria e a ruína das massas cresceram de uma maneira inaudita, e sobretudo no que respeita a 1250 milhões de pessoas, isto é, 70% de toda a população da Terra. Trata-se dos países coloniais e dependentes, cuja população está privada de direitos jurídicos, países colocados «sob mandato» dos bandidos da finança. E, além disso, a escravidão dos países vencidos foi fixada pelo Tratado de Versalhes e pelos acordos secretos que existem em relação à Rússia, que por vezes têm, é verdade, tanto valor como os papelinhos nos quais se escreveu que devemos tantos e tantos milhares de milhões. Estamos perante o primeiro caso, na história mundial, de confirmação jurídica da pilhagem, da escravidão, da miséria e da fome de 1250 milhões de pessoas.
Por outro lado, em cada um dos países que se tornaram credores, a situação dos operários tornou-se insuportável. A guerra trouxe um agravamento sem precedentes de todas as contradições capitalistas, e nisso reside a fonte dessa profundíssima efervescência revolucionária que não pára de crescer, pois na guerra os homens eram colocados nas condições da disciplina militar, eram enviados para a morte ou colocados sob a ameaça da repressão militar imediata. As condições da guerra não davam a possibilidade de ver a realidade económica. Os escritores, os poetas, os padres, toda a imprensa não faziam mais que glorificar a guerra. Agora que a guerra terminou, as coisas começaram a ser desmascaradas. Foi desmascarado o imperialismo alemão com a sua Paz de Brest-Litovsk. Foi desmascarada a Paz de Versalhes, que devia ser a vitória do imperialismo mas se revelou como a sua derrota. O exemplo de Keynes mostra, entre outras coisas, como dezenas e centenas de milhares de pessoas da pequena burguesia, da intelectualidade, do número das pessoas simplesmente um pouco desenvolvidas e alfabetizadas da Europa e da América tiveram que tomar o mesmo caminho que tomou Keynes, que apresentou a sua demissão e lançou à cara do seu governo o livro que desmascarava este governo. Keynes mostrou o que se passa e se passará na consciência de milhares e centenas de milhares de pessoas quando compreenderem que todos estes discursos sobre a «guerra pela liberdade», etc., foram puro logro e que, em resultado da guerra, enriqueceu apenas um número insignificante, enquanto os outros se arruinaram e caíram na escravidão. Com efeito, o burguês Keynes diz que os ingleses, para salvarem a sua vida, para salvarem a economia inglesa, devem conseguir que se reiniciem as relações comerciais livres entre a Alemanha e a Rússia! Mas como consegui-lo? Anulando todas as dívidas, como Keynes propõe! Isto não é uma ideia apenas do douto economista Keynes. Milhões de pessoas chegam e chegarão a esta ideia. E milhões de pessoas ouvem os economistas inglesas dizer que não há outra saída a não ser a anulação das dívidas, que por conseguinte «malditos sejam os bolcheviques!» (que anularam as dívidas), e façamos um apelo à «generosidade» da América!! Penso que se deveria enviar, em nome do Congresso da Internacional Comunista, uma mensagem de agradecimento a estes economistas que fazem agitação a favor do bolchevismo.
Se por um lado a situação económica das massas se tornou insuportável, se, por outro lado, entre a ínfima minoria dos países vencedores omnipotentes se iniciou e se agrava a desintegração ilustrada por Keynes, realmente presenciamos o amadurecimento de ambas as condições da revolução mundial.
Temos agora diante dos nossos olhos um quadro um pouco mais completo de todo o mundo. Sabemos o que significa esta dependência em relação a um punhado de ricaços a que estão sujeitas 1250 milhões de pessoas colocadas em condições de existência impossíveis. Por outro lado, quando se ofereceu aos povos o tratado da Sociedade das Nações, em virtude do qual a Sociedade das Nações declara que pôs fim às guerras e que de futuro não permitirá a ninguém que quebre a paz, quando esse tratado, como última esperança das massas trabalhadoras de todo o mundo, entrou em vigor, isso foi para nós a maior vitória. Quando ele ainda não estava em vigor, diziam: é impossível não submeter um país como a Alemanha a condições especiais; quando houver um tratado, verão como tudo sairá bem. E quando o tratado foi publicado, os adversários furiosos do bolchevismo tiveram que renegá-lo! Quando o tratado começou a vigorar, verificou-se que o ínfimo grupo dos países mais ricos, esse «quarteto dos gordos» - Clemenceau, Lloyd George, Orlando e Wilson - foi encarregado de organizar as novas relações. Quando puseram em marcha a máquina do tratado, ela levou à desintegração total!
Vimo-lo nas guerras contra a Rússia. A fraca, a arruinada, a abatida Rússia, o país mais atrasado, luta contra todas as nações, contra a aliança de potências ricas e poderosas que dominam toda a Terra, e sai vencedora. Não podíamos opor forças em nada equivalentes, mas saímos vencedores. Porquê? Porque não havia sombra de unidade entre elas, porque cada potência actuava contra a outra. A França queria que a Rússia lhe pagasse as dívidas e se tornasse uma força temível contra a Alemanha; a Inglaterra desejava a partilha da Rússia, a Inglaterra tentava apoderar-se do petróleo de Baku e concluir um tratado com os Estados limítrofes da Rússia. Entre os documentos oficiais ingleses há um livro onde se enumera de modo extraordinariamente escrupuloso todos os Estados (contam-se 14) que, há meio ano, em Dezembro de 191 9, prometiam tomar Moscovo e Petrogrado. A Inglaterra assentava nesses Estados a sua política e emprestava-lhes milhões e milhões. Mas hoje todos esses cálculos fracassaram e todos os empréstimos se perderam.
Esta é a situação criada pela Sociedade das Nações. Cada dia de existência deste tratado é a melhor agitação a favor do bolchevismo. Porque os partidários mais poderosos da «ordem» capitalista mostram que, em cada questão, passam rasteiras uns aos outros. Pela partilha da Turquia, da Pérsia, da Mesopotâmia, da China, processa-se uma querela furiosa entre o Japão, a Inglaterra, a América e a França. A imprensa burguesa destes países está cheia dos mais furiosos ataques e das intervenções mais acerbas contra os seus «colegas» porque lhes tiram a presa diante do seu próprio nariz. Vemos o total desacordo que reina no topo entre este ínfimo punhado de países mais ricos. É impossível a 1250 milhões de pessoas, que representam 70% da população da Terra, viver nas condições de subjugação que o capitalismo «avançado» e civilizado quer impor-lhes. Quanto ao ínfimo punhado de potências riquíssimas, a Inglaterra, a América, o Japão (o Japão teve a possibilidade de saquear os países do Oriente, os países asiáticos, mas não pode ter qualquer força financeira e militar independente sem o apoio de outro país), estes 2 ou 3 países não estão em condições de organizar as relações económicas e orientam a sua política para fazer fracassar a política dos seus associados e parceiros da Sociedade das Nações. Daqui decorre a crise mundial. E estas raízes económicas da crise constituem a razão essencial do facto de que a Internacional Comunista consegue êxitos brilhantes.
Camaradas! Chegámos agora à questão da crise revolucionária como base da nossa acção revolucionária. E aqui é preciso, antes de mais nada, assinalar dois erros muito difundidos. Por um lado, os economistas burgueses pintam a crise com um simples «desassossego», segundo a elegante expressão dos ingleses. Por outro lado, os revolucionários procuram por vezes demonstrar que a crise não tem absolutamente qualquer saída.
Isto é um erro. Não existem situações absolutamente sem saída. A burguesia comporta-se como uma fera insolente que perdeu a cabeça, faz disparate atrás de disparate, agudizando a situação e acelerando a sua perda. Tudo isto é assim. Mas não se pode «demonstrar» que não há absolutamente alguma possibilidade de que adormeça uma certa minoria de explorados com determinadas concessões, de que esmague um movimento ou insurreição de uma determinada parte de oprimidos e explorados. Tentar «demonstrar» antecipadamente a ausência «absoluta» de saída seria pedantismo vão ou jogo de conceitos e palavras. Nesta questão e noutras parecidas só a prática pode ser a verdadeira «demonstração». O regime burguês atravessa em todo o mundo uma grandíssima crise revolucionária. Agora é preciso «demonstrar» com a prática dos partidos revolucionários que eles têm suficiente consciência, organização, ligação com as massas exploradas, decisão e habilidade para aproveitar esta crise para uma revolução com êxito, para uma revolução vitoriosa.
Foi principalmente para preparar essa «demonstração» que nos reunimos no presente congresso da Internacional Comunista.
Citarei, como exemplo de até que grau ainda reina o oportunismo entre os partidos que desejam aderir à III Internacional, até que grau o trabalho de outros partidos está ainda longe da preparação da classe revolucionária para aproveitar a crise revolucionária, citarei Ramsay MacDonald, chefe do «Partido Trabalhista Independente» inglês. No seu livro O Parlamento e a Revolução, dedicado precisamente às questões essenciais que agora nos ocupam também a nós, MacDonald descreve a situação mais ou menos no espírito dos pacifistas burgueses. Reconhece que há crise revolucionária, que cresce o estado de espírito revolucionário, que as massas operárias simpatizam com o Poder Soviético e com a ditadura do proletariado (notai que se trata da Inglaterra), que a ditadura do proletariado é melhor que a actual ditadura da burguesia inglesa.
Mas MacDonald continua a ser um pacifista e conciliador burguês até à medula, um pequeno burguês que sonha com um governo acima das classes. MacDonald reconhece a luta de classes apenas como um «facto descritivo», como todos os mentirosos, sofistas e pedantes da burguesia. MacDonald passa em silêncio a experiência de Kérenski e dos mencheviques e socialistas-revolucionários na Rússia, a experiência semelhante da Hungria, da Alemanha, etc, sobre a formação de um governo «democrático» e pretensamente acima das classes. MacDonald adormece o seu partido e os operários que têm a infelicidade de tomar este burguês por socialista e este filisteu por chefe com as palavras: «Sabemos que isto (isto é, a crise revolucionária, a efervescência revolucionária) passará, se acalmará.» A guerra, diz ele, causou inevitavelmente a crise, mas depois da guerra, ainda que não de repente, «tudo se acalmará»!
E assim escreve um homem que é chefe de um partido que deseja aderir à III Internacional. Temos aqui uma revelação de excepcional franqueza, e por isso tanto mais valiosa, daquilo que se observa com não menos frequência nas camadas superiores do partido socialista francês e do partido social-democrata independente alemão: não só saber, mas também querer aproveitar a crise revolucionária num sentido revolucionário, por outras palavras, não saber e não querer levar a cabo uma preparação verdadeiramente revolucionária do partido e da classe para a ditadura do proletariado.
Este é o mal fundamental de muitos e muitos partidos que actualmente abandonam a II Internacional. E é precisamente por isso que me detenho principalmente, nas teses que propus ao presente congresso, na determinação mais concreta e precisa possível das tarefas de preparação para a ditadura do proletariado.
Mais um exemplo. Recentemente publicou-se um novo livro contra o bolchevismo. Actualmente publicam-se na Europa e na América um número invulgar de livros deste género, e quantos mais livros se publicam contra o bolchevismo tanto mais forte e rapidamente crescem nas massas as simpatias por ele. Refiro-me ao livro de Otto Bauer Bolchevismo ou Social-Democracia?. Aqui se mostra para os alemães de forma evidente o que é o menchevismo, cujo papel vergonhoso na revolução russa foi suficientemente compreendido pelos operários de todos os países. Otto Bauer produziu um panfleto profundamente menchevique, apesar de ter ocultado a sua simpatia pelo menchevismo. Mas na Europa e na América é agora necessário difundir um conhecimento mais preciso do que é o menchevismo, pois este é um conceito genérico para todas as tendências pretensamente socialistas, sociais-democratas, etc., hostis ao bolchevismo. Para nós, russos, seria fastidioso escrever para a Europa sobre o que é o menchevismo. Otto Bauer mostrou-o de facto no seu livro, e agradecemos antecipadamente aos editores burgueses e oportunistas que o vão publicar e traduzir para diferentes línguas. O livro de Bauer será um complemento útil, se bem que original, para os manuais do comunismo. Tomai qualquer parágrafo, qualquer raciocínio de Otto Bauer e demonstrai onde está o menchevismo, onde estão as raízes das concepções que conduzem à prática dos traidores ao socialismo, dos amigos de Kérenski, Scheidemann, etc. - tal a pergunta que se poderia fazer com utilidade e êxito nos «exames» para comprovar se se assimilou o comunismo. Quem não pode responder a essa pergunta ainda não é comunista e é melhor que não ingresse no partido comunista. (Aplausos).
Otto Bauer expressou magnificamente toda a essência das opiniões do oportunismo mundial numa frase, pela qual - se pudéssemos mandar livremente em Viena - deveríamos erguer-lhe um monumento ainda em vida. O emprego da violência na luta de classes das democracias contemporâneas - disse Otto Bauer - seria uma «violência sobre os factores sociais da força».
Provavelmente isto parecer-vos-á estranho e incompreensível. É um modelo daquilo a que reduziram o marxismo, do grau de banalidade e defesa dos exploradores a que se pode levar a teoria mais revolucionária. Falta a variante alemã do espírito pequeno-burguês, e obtém-se a «teoria» de que os «factores sociais da força» são o número, a organização, o lugar ocupado no processo de produção e distribuição, a actividade e a instrução. Se um assalariado agrícola no campo e um operário na cidade exercem violência revolucionária sobre o latifundiário e o capitalista isso não é de modo nenhum ditadura do proletariado, não é de modo nenhum violência sobre os exploradores e opressores do povo. Nada disso. É «violência sobre os factores sociais da força».
Talvez o meu exemplo tenha saído um pouco humorístico. Mas a natureza do oportunismo contemporâneo é tal que a sua luta contra o bolchevismo assume um aspecto humorístico. Para a Europa e a América é da maior utilidade e premência incorporar a classe operária, tudo quanto nela há de pensante, na luta do menchevismo internacional (dos MacDonald, O. Bauer e Cª) contra o bolchevismo.
Aqui devemos colocar a questão de como se explica a solidez de semelhantes tendências na Europa e porque é que esse oportunismo é mais forte na Europa Ocidental do que no nosso país. Pois porque os países avançados criaram e continuam a criar a sua cultura com a possibilidade de viver à custa de mil milhões de pessoas oprimidas. Porque os capitalistas desses países recebem muito mais do que poderiam receber como lucros da pilhagem dos operários do seu país.
Antes da guerra calculava-se que três países riquíssimos, a Inglaterra a França e a Alemanha, tinham receitas anuais de 8 a 10 mil milhões de francos só da exportação de capitais para o estrangeiro, sem contar outras receitas.
E compreensível que desta bela soma se podem atirar quinhentos milhões, pelo menos, como esmola aos dirigentes operários, à aristocracia operária, como subornos de toda a espécie. E tudo se reduz precisamente ao suborno. Isto faz-se de mil formas diferentes: elevando a cultura nos maiores centros, criando estabelecimentos de ensino, criando milhares de lugarzinhos para os chefes das cooperativas, para os chefes das trade-unions e chefes parlamentares. Mas isto faz-se onde quer que existam as relações capitalistas civilizadas contemporâneas. E esses milhares de milhões de superlucros são a base económica em que se apoia o oportunismo no movimento operário. Na América, na Inglaterra, na França verifica-se uma obstinação incomparavelmente mais forte dos chefes oportunistas, da camada superior da classe operária, da aristocracia dos operários; opõem uma resistência mais forte ao movimento comunista. E por isso devemos estar preparados para que a libertação dos operários europeus e americanos desta doença seja mais difícil do que no nosso país. Sabemos que desde a altura da fundação da III Internacional se obtiveram êxitos enormes no tratamento desta doença, mas ainda não fomos até ao fim: a depuração dos partidos operários, dos partidos revolucionários do proletariado de todo o mundo da influência burguesa e dos oportunistas no seu próprio seio está ainda longe de ter terminado.
Não me deterei sobre a maneira concreta como devemos fazê-lo. Disso se fala nas minhas teses, que estão publicadas. A minha tarefa consiste em apontar aqui as profundas raízes económicas deste fenómeno. Esta doença prolongou-se e a sua cura demora mais do que os optimistas poderiam esperar. O nosso inimigo principal é o oportunismo. O oportunismo na camada superior do movimento operário não é socialismo proletário, mas burguês. Demonstrou-se na prática que os elementos dentro do movimento operário pertencentes à tendência oportunista são melhores defensores da burguesia que os próprios burgueses. A burguesia não poderia manter-se se eles não dirigissem os operários. Isso demonstra-o não só a história do regime de Kérenski na Rússia, isso demonstra-o a república democrática na Alemanha com o seu governo social-democrata à frente, isso demonstra-o a atitude de Albert Thomas em relação ao seu governo burguês. Isso demonstra-o uma experiência análoga na Inglaterra e nos Estados Unidos. E aqui que está o nosso inimigo principal, e precisamos de alcançar a vitória sobre este inimigo. Temos de sair do congresso com a firme resolução de levar até ao fim esta luta em todos os partidos. Esta é a tarefa principal.
Em comparação com esta tarefa, a correcção dos erros da tendência «de esquerda» no comunismo será uma tarefa fácil. Em toda uma série de países observamos o antiparlamentarismo, que é trazido não tanto por gente saída da pequena burguesia como apoiado por alguns destacamentos avançados do proletariado, devido ao seu ódio ao velho parlamentarismo, ao ódio lógico, justo e necessário à conduta dos parlamentares em Inglaterra, França, Itália, em todos os países. É preciso dar directrizes da Internacional Comunista, familiarizar mais de perto e mais estreitamente os camaradas com a experiência russa, com o significado do verdadeiro partido político proletário. O nosso trabalho consistirá em cumprir esta tarefa. E a luta contra estes erros do movimento proletário, contra estas insuficiências, será mil vezes mais fácil que a luta contra a burguesia que penetra sob a capa do reformismo nos velhos partidos da II Internacional e orienta todo o seu trabalho não no espírito proletário, mas no espírito burguês.
Camaradas, para concluir deter-me-ei ainda num aspecto da questão. O camarada presidente disse aqui que o congresso merece a designação de mundial. Penso que tem razão, particularmente porque temos aqui não poucos representantes do movimento revolucionário dos países coloniais e atrasados. Isto é apenas um pequeno começo, mas o importante é que este começo se tenha já realizado. A união dos proletários revolucionários dos países capitalistas, dos países avançados, com as massas revolucionárias dos países onde não existe ou quase não existe proletariado, com as massas oprimidas dos países coloniais, dos países do Oriente, esta união está a realizar-se no presente congresso. E depende de nós - estou certo de que o faremos - consolidar esta união. O imperialismo mundial deverá cair quando a investida revolucionária dos operários explorados e oprimidos dentro de cada país, vencendo a resistência dos elementos pequeno-burgueses e a influência da insignificante camada superior constituída pela aristocracia operária, se unir com a investida revolucionária de centenas de milhões de homens que até agora permaneciam fora da história e eram considerados apenas como seu objecto.
A guerra imperialista ajudou a revolução, a burguesia tirou das colónias, dos países atrasados, do isolamento, soldados para participarem nesta guerra imperialista. A burguesia inglesa inculcava aos soldados da Índia a ideia de que os camponeses indus deviam defender a Grã-Bretanha da Alemanha, a burguesia francesa inculcava aos soldados das colónias francesas a ideia de que os negros deviam defender a França. Ensinaram-lhes o manejo das armas. É um conhecimento extraordinariamente útil, e por ele poderíamos expressar à burguesia o nosso profundo agradecimento, em nome de todos os operários e camponeses russos e em particular em nome do Exército Vermelho russo. A guerra imperialista arrastou os povos dependentes para a história mundial. E agora uma das nossas principais tarefas é pensar em como assentar a primeira pedra da organização do movimento soviético nos países não capitalistas. Os Sovietes são aí possíveis; não serão Sovietes operários, serão Sovietes camponeses ou Sovietes de trabalhadores.
É necessário muito trabalho, os erros serão inevitáveis, muitos serão os obstáculos com que se tropeçará nesse caminho. A tarefa fundamental do II Congresso consiste em elaborar ou traçar os princípios práticos, a fim de que o trabalho, que decorreu até agora de forma não organizada entre centenas de milhões de pessoas, decorra de forma organizada, coerente e sistemática.
Passou pouco mais de um ano desde o I Congresso da Internacional Comunista e já aparecemos como vencedores da II Internacional. As ideias soviéticas estão agora difundidas não só entre os operários dos países civilizados e não são só eles que as compreendem e conhecem. Os operários de todos os países riem-se desses sabichões - muitos dos quais se dizem socialistas - que com ar doutoral ou quase doutoral dissertam sobre o «sistema» soviético, como gostam de expressar-se os sistemáticos alemães, ou sobre a «ideia» soviética como se expressam os socialistas «guildistas» ingleses(N203); tais dissertações sobre o «sistema» e a «ideia» soviética não raramente tapam os olhos e a razão dos operários. Mas os operários rejeitam esse lixo pedante e empunham a arma oferecida pelos Sovietes. A compreensão do papel e da importância dos Sovietes difundiu-se agora também no Oriente.
Foi lançada a base para o movimento soviético em todo o Oriente, em toda a Ásia, entre todos os povos coloniais.
A tese de que o explorado deve sublevar-se contra o explorador e criar os seus Sovietes não é demasiado complexa. Depois da nossa experiência, depois de dois anos e meio de República Soviética na Rússia, depois do I Congresso da III Internacional, ela torna-se acessível para centenas de milhões de homens oprimidos pelos exploradores em todo o mundo. E se agora, na Rússia, nos vemos com frequência obrigados a concluir compromissos, a dar tempo ao tempo, pois somos mais fracos que os imperialistas internacionais, sabemos, em contrapartida, que 1250 milhões de homens da população do globo constituem essa massa cujos interesses nós defendemos. Mas somos ainda estorvados pelos obstáculos, os preconceitos e a ignorância, que a cada hora que passa vão sendo relegados para o passado, mas nós cada vez mais representamos e defendemos de facto estes 70% da população da Terra, essa massa de trabalhadores e explorados. Podemos dizer com orgulho: no I Congresso éramos, no fundo, apenas propagandistas, apenas lançámos ao proletariado de todo o mundo ideias fundamentais, apenas lançámos um apelo à luta, apenas perguntávamos: onde estão os homens capazes de seguir esse caminho? Agora temos em toda a parte um proletariado avançado. Em toda a parte há um exército proletário, ainda que por vezes esteja mal organizado e exija uma reorganização, e se os nossos camaradas internacionais nos ajudarem agora a organizar um exército único, nenhumas falhas nos impedirão de realizar a nossa obra. Esta obra é a obra da revolução proletária mundial, é a obra da criação da República Soviética mundial. (Aplausos prolongados.)
Camaradas, limitar-me-ei apenas a uma breve introdução, após o que o camarada Maring, que foi secretário da nossa comissão, apresentará um relatório pormenorizado sobre as modificações que fizemos nas teses. Depois dele tomará a palavra o camarada Roy, que formulou teses adicionais. A nossa comissão aprovou por unanimidade tanto as teses iniciais(1*), com as modificações, como as teses adicionais. Conseguimos deste modo chegar a uma completa unanimidade em todas as questões importantes. Farei agora algumas breves observações.
Em primeiro lugar, qual é a ideia mais importante, fundamental, das nossas teses? É a distinção entre nações oprimidas e opressoras. Nós sublinhamos esta distinção, em oposição à II Internacional e à democracia burguesa. Para o proletariado e para a Internacional Comunista tem particular importância na época do imperialismo constatar os factos económicos concretos e partir, ao resolver as questões coloniais e nacionais, não de postulados abstractos, mas dos fenómenos da realidade concreta.
O traço característico do imperialismo consiste em que, como podemos ver, todo o mundo se divide actualmente num grande número de nações oprimidas e num número insignificante de nações opressoras, que dispõem de riquezas colossais e de uma poderosa força militar. A enorme maioria da população da Terra, mais de mil milhões de homens, com toda a probabilidade mil duzentos e cinquenta milhões, se considerarmos que o número de toda a população da Terra é de mil setecentos e cinquenta milhões, isto é, cerca de 70% da população da Terra pertence às nações oprimidas, que ou se encontram numa dependência colonial directa ou são Estados semicolonialistas, como por exemplo a Pérsia, a Turquia e a China, ou que, depois de terem sido derrotadas pelo exército de uma grande potência imperialista, se viram numa forte dependência dela por força dos tratados de paz. Esta ideia da distinção, da divisão das nações em opressoras e oprimidas, atravessa todas as teses, não apenas as primeiras, que apareceram com a minha assinatura e foram publicadas anteriormente, mas também as teses do camarada Roy. Estas últimas foram escritas sobretudo do ponto de vista da situação da Índia e de outros grandes povos da Ásia oprimidos pela Inglaterra, e nisto reside a sua enorme importância para nós.
A segunda ideia que orienta as nossas teses reside em que, na actual situação mundial, depois da guerra imperialista, as relações entre os povos, todo o sistema mundial dos Estados, são determinados pela luta de um pequeno grupo de nações imperialistas contra o movimento soviético e os Estados soviéticos, à frente dos quais está a Rússia Soviética. Se perdermos isto de vista, não poderemos colocar correctamente nenhuma questão nacional ou colonial, mesmo que se trate do recanto mais afastado do mundo. Só partindo deste ponto de vista os partidos comunistas dos países civilizados, tal como os dos atrasados, poderão colocar e resolver correctamente as questões políticas.
Em terceiro lugar, gostaria de sublinhar particularmente a questão do movimento democrático-burguês nos países atrasados. Esta foi precisamente a questão que suscitou algumas divergências. Discutimos sobre se, do ponto de vista dos princípios e da teoria, era ou não correcto declarar que a Internacional Comunista e os partidos comunistas devem apoiar o movimento democrático-burguês nos países atrasados; em resultado desta discussão chegámos à decisão unânime de que deve falar-se de movimento revolucionário nacional em vez de movimento «democrático-burguês». Não resta a menor dúvida de que qualquer movimento nacional só pode ser democrático-burguês, pois a massa principal da população nos países atrasados é constituída pelo campesinato, que representa as relações capitalistas burguesas. Seria utópico pensar que os partidos proletários, se é que eles podem surgir em geral em tais países, são capazes de aplicar nestes países atrasados uma táctica comunista sem manter determinadas relações com o movimento camponês e sem o apoiar na prática. Mas aqui foram feitas objecções de que se falássemos de movimento democrático-burguês se apagaria qualquer diferença entre os movimentos reformista e revolucionário. Entretanto, nos últimos tempos esta diferença manifestou-se nos países coloniais e atrasados com inteira clareza, porque a burguesia imperialista procura com todas as forças implantar o movimento reformista também entre os povos oprimidos. Entre a burguesia dos países exploradores e a dos coloniais verificou-se uma certa aproximação, pelo que, muito frequentemente - e talvez mesmo na maioria dos casos - a burguesia dos países oprimidos, apesar de apoiar os movimentos nacionais, luta ao mesmo tempo de acordo com a burguesia imperialista, isto é, juntamente com ela, contra todos os movimentos revolucionários e as classes revolucionárias. Na comissão isto foi demonstrado de forma irrefutável, e nós considerámos que a única coisa correcta era ter em atenção esta diferença e substituir em quase toda a parte a expressão «democrático-burguês» pela expressão «revolucionário-nacional». O sentido desta mudança consiste em que nós, como comunistas, só devemos apoiar e só apoiaremos os movimentos libertadores burgueses nos países coloniais nos casos em que esses movimentos sejam verdadeiramente revolucionários, em que os seus representantes não nos impeçam de educar e organizar num espírito revolucionário o campesinato e as amplas massas de explorados. Mas se não existirem essas condições, os comunistas devem lutar nestes países contra a burguesia reformista, à qual também pertencem os heróis da II Internacional. Nos países coloniais existem já partidos reformistas, e os seus representantes dizem-se por vezes sociais-democratas e socialistas. A distinção mencionada foi aplicada a todas as teses, e penso que graças a isto o nosso ponto de vista está agora formulado de um modo mais preciso.
Quereria fazer a seguir outra observação sobre os Sovietes camponeses. O trabalho prático dos comunistas russos nas colónias anteriormente pertencentes ao tsarismo, em países tão atrasados como o Turquestão e outros, colocou perante nós a questão de como devem ser aplicadas a táctica e a política comunistas em condições pré-capitalistas, pois o traço característico mais importante destes países é o facto de neles dominarem ainda as relações pré-capitalistas, e por isso não se pode sequer falar ali de um movimento puramente proletário. Nestes países quase não há proletariado industrial. Apesar disto, também ali temos assumido e devemos assumir o papel de dirigentes. O nosso trabalho mostrou-nos que nestes países é preciso vencer dificuldades colossais, mas os resultados práticos do nosso trabalho mostraram também que, apesar destas dificuldades, se pode despertar nas massas a aspiração a um pensamento político independente e a uma actividade política independente também lá onde quase não há proletariado. Este trabalho foi mais difícil para nós do que para os camaradas dos países da Europa Ocidental, pois o proletariado na Rússia está sobrecarregado pelo trabalho estatal. Compreende-se perfeitamente que os camponeses, que se encontram numa dependência semifeudal, possam assimilar muito bem a ideia da organização soviética e realizá-la na prática. É igualmente claro que as massas oprimidas, exploradas não só pelo capital mercantil mas também pelos feudais e por um Estado que assente sobre bases feudais, podem também aplicar esta arma, este tipo de organização nas condições em que se encontram. A ideia da organização soviética é simples e pode ser aplicada não só às relações proletárias mas também às relações camponesas feudais e semifeudais. A nossa experiência neste domínio não é ainda muito grande, mas os debates na comissão, nos quais participaram alguns representantes de países coloniais, demonstraram-nos de um modo inteiramente irrefutável que nas teses da Internacional Comunista é necessário assinalar que os Sovietes camponeses, os Sovietes dos explorados são um instrumento útil não só para os países capitalistas, mas também para os países com relações pré-capitalistas, e que a propaganda da ideia dos Sovietes camponeses, dos Sovietes de trabalhadores, em toda a parte, tanto nos países atrasados como nas colónias, é um dever incondicional dos partidos comunistas e dos elementos que estão dispostos a criar partidos comunistas; e lá onde as condições o permitam devem tentar imediatamente a organização de Sovietes do povo trabalhador.
Abre-se aqui perante nós um domínio muito interessante e importante de trabalho prático. A nossa experiência geral neste aspecto não é ainda muito grande, mas pouco a pouco iremos acumulando cada vez mais materiais. É indiscutível que o proletariado dos países avançados pode e deve ajudar as massas trabalhadoras atrasadas e que o desenvolvimento dos países atrasados poderá sair da sua etapa actual quando o proletariado vencedor das repúblicas soviéticas estender a mão a essas massas e puder prestar-lhes apoio.
Sobre esta questão travaram-se na comissão debates bastante vivos não só em ligação com as teses assinadas por mim, mas mais ainda em ligação com as teses do camarada Roy, que ele defenderá aqui e em relação às quais foram adoptadas por unanimidade algumas emendas.
A questão foi colocada do seguinte modo: poderemos considerar correcta a afirmação de que o estádio capitalista de desenvolvimento da economia nacional é inevitável para os povos atrasados que estão agora a libertar-se e entre os quais se observa agora, depois da guerra, um movimento na via do progresso? Respondemos negativamente a esta questão. Se o proletariado revolucionário vitorioso realizar entre eles uma propaganda sistemática e os governos soviéticos forem em sua ajuda com todos os meios de que dispõem, é errado supor que o estádio capitalista de desenvolvimento é inevitável para os povos atrasados. Em todas as colónias e países atrasados devemos não só formar quadros independentes de combatentes, organizações partidárias, não só realizar uma propaganda imediata pela organização de Sovietes camponeses e procurar adaptá-los às condições pré-capitalistas, mas a Internacional Comunista deve estabelecer e fundamentar teoricamente a tese de que os países atrasados, com a ajuda do proletariado dos países avançados, podem passar ao regime soviético e, através de determinadas etapas de desenvolvimento, ao comunismo, evitando o estádio capitalista de desenvolvimento.
Não é possível indicar antecipadamente os meios necessários para isto. A experiência prática no-los sugerirá. Mas está firmemente estabelecido que a ideia dos Sovietes é uma ideia familiar a todas as massas trabalhadoras dos povos mais afastados, que estas organizações, os Sovietes, devem ser adaptadas às condições de um regime social pré-capitalista e que o trabalho dos partidos comunistas nesta direcção deve começar imediatamente em todo o mundo.
Quereria apontar ainda a importância do trabalho revolucionário dos partidos comunistas não só no seu próprio país, mas também nos países coloniais, e particularmente entre as tropas utilizadas pelas nações exploradoras para manter submetidos os povos das suas colónias.
O camarada Quelch, do Partido Socialista Britânico, falou sobre isto na nossa comissão. Disse que o operário inglês da base consideraria uma traição ajudar os povos escravizados nas suas insurreições contra o domínio inglês. É verdade que o estado de espírito jingoísta(N205) e chauvinista da aristocracia operária da Inglaterra e da América representa um enorme perigo para o socialismo e um fortíssimo apoio da II Internacional, que estamos aqui perante a maior traição dos chefes e dos operários pertencentes a essa Internacional burguesa. Na II Internacional também analisaram a questão colonial. O Manifesto de Basileia também falava nisto de modo absolutamente claro. Os partidos da II Internacional prometeram actuar revolucionariamente, mas não vemos nos partidos da II Internacional e, suponho, também entre a maioria dos partidos que saíram da II Internacional e desejam entrar na III Internacional, um verdadeiro trabalho revolucionário nem ajuda aos povos explorados e dependentes nas suas insurreições contra as nações opressoras. Devemos declará-lo alto e bom som, e isto não pode ser refutado. Veremos se será feita alguma tentativa para o refutar.
Todas estas considerações serviram de base às nossas resoluções, que, indubitavelmente, são demasiado longas, mas acredito que, apesar de tudo, serão úteis e contribuirão para o desenvolvimento e para a organização de um trabalho verdadeiramente revolucionário nas questões nacional e colonial, o que constitui a nossa tarefa principal.
Notas de rodapé:
(N198) O II Congresso da Internacional Comunista, realizado na Rússia Soviética em 19 de Julho - 7 de Agosto de 1920, assentou os fundamentos programáticos, tácticos e organizativos da Internacional Comunista. O congresso foi inaugurado em Petrogrado. A partir de 23 de Julho, as suas sessões realizaram-se em Moscovo. Participaram no congresso 169 delegados com direito de voto e 49 com voto consultativo, representando 67 organizações de 37 países. Além de representantes dos partidos e organizações comunistas de 31 países, tomaram parte nos trabalhos do congresso representantes do Partido Social-Democrata Independente da Alemanha, dos partidos socialistas da França e da Itália, dos «Operários Industriais do Mundo» (Austrália, Inglaterra, Irlanda), da Confederação Nacional do Trabalho da Espanha e doutras organizações. Na primeira sessão do congresso, Lénine apresentou o relatório sobre a situação internacional e as principais tarefas da Internacional Comunista. Noutras sessões, pronunciou o discurso sobre o partido comunista, apresentou o relatório sobre as questões nacional e colonial, fez um discurso sobre o parlamentarismo bem como sobre outras questões. Lénine tomou parte activa nos trabalhos da maioria das comissões do congresso. As ideias da obra clássica de Lénine A Doença Infantil do «Esquerdismo» no Comunismo serviram de base às resoluções do congresso. O congresso aprovou como resolução sobre a primeira questão as «Teses sobre as tarefas fundamentais do II Congresso da Internacional Comunista» redigidas por Lénine. O papel do partido comunista na revolução proletária e as relações entre o partido e a classe operária foram duas das principais questões do congresso. Na resolução aprovada «sobre o papel do partido comunista na revolução proletária», redigida coma participação directa de Lénine, o congresso apontou para o facto de o partido comunista ser a arma principal na luta pela libertação da classe operária. As teses de Lénine foram aprovadas como resoluções do congresso sobre as questões nacional-colonial e agrária. O congresso aprovou as 21 condições de admissão na Internacional Comunista, elaboradas por Lénine, o que tinha grande significado para a criação e o fortalecimento de partidos de novo tipo no seio do movimento operário dos países capitalistas. (retornar ao texto)
(N199) The Times: diário fundado em Londres em 1785; dos maiores jornais conservadores da burguesia inglesa. (retornar ao texto)
(N200) Mensageiro do Comissariado do Povo dos Negócios Estrangeiros da RSFSR, (Véstnik Naródnogo Komissariata pó Inostránnim Delám-RSFSR): revista, órgão do Comissariado do Povo dos Negócios Estrangeiros, publicado em Moscovo de 20 de Junho de 1919 a Junho de 1922. (retornar ao texto)
(N201) Trata-se da organização internacional dos partidos e dos grupos socialistas centristas que estava naquele período em processo de formação. Esses partidos e grupos, pressionados pelas massas revolucionárias, tinham deixado a II Internacional. Esta associação, conhecida como «Internacional II e meia» ou «Internacional de Viena» (nome oficial: «Associação Internacional dos Partidos Socialistas») foi constituída aquando da conferência que teve lugar em Viena, em Fevereiro de 1921. Criticando em palavras a II Internacional, os chefes da Internacional II e meia praticavam, de facto, uma política oportunista e cisionista entre a classe operária em todas as questões mais importantes do movimento proletário, e procuravam utilizar a associação criada para se oporem à influência cada vez maior dos comunistas sobre as massas proletárias. Em Maio de 1923, a II Internacional e a Internacional II e meia uniram-se e fundaram a chamada Internacional Operária Socialista. (retornar ao texto)
(N202) «14 pontos»: «Programa de paz» demagógico apresentado pelo presidente dos EUA, Wilson, em Janeiro de 1918. (retornar ao texto)
(N203) Socialistas «guildistas», socialismo «guildista»; corrente reformista no seio das trade-unions inglesas, que surgiu nas vésperas da Primeira Guerra Mundial. Os socialistas «guildistas» negavam o carácter de classe do Estado, semeavam entre os operários ilusões acerca da possibilidade de libertação da exploração sem a luta de classes, advogavam a criação, na base das trade-unions existentes, de associações especiais de produtores, as chamadas «guildas», tendo em vista entregar a direcção da indústria a estas organizações agrupadas numa federação. Desta maneira, os socialistas «guildistas» pensavam criar, pouco a pouco, a sociedade socialista. Depois da Revolução Socialista de Outubro, os socialistas «guildistas» levaram a cabo a sua propaganda de modo especialmente activo, tentando opor a «teoria» do socialismo «guildista» às ideias da luta de classes e da ditadura do proletariado. Na década de 1920, o socialismo «guildista» perdeu toda a influência sobre a classe operária da Inglaterra. (retornar ao texto)
(N204) A comissão sobre as questões nacional e colonial foi formada pelo II Congresso da Internacional Comunista. Faziam parte dessa comissão 20 membros, representantes de Inglaterra, Áustria, Bulgária, Hungria, Alemanha, Holanda, Índia, Indonésia, Irão, Irlanda, China, Coreia, México, Rússia, EUA, França, Turquia e Jugoslávia. O seu trabalho foi dirigido por Lénine. A comissão iniciou os seus trabalhos em 25 de Julho de 1920, tendo discutido as teses de Lénine sobre as questões nacional e colonial, teses essas que foram submetidas em 26 de Julho ao exame do congresso. Além disso, na comissão sobre as questões nacional e colonial e nas sessões plenárias do congresso foram debatidas as teses suplementares apresentadas por Manabendra Nat Roy. (retornar ao texto)
(1*) Ver Obras Escolhidas de V. I. Lénine em 3 Tomos, t.3, pp. 351-356. (N.Ed.) (retornar ao texto)
(N205) Jingoísmo: chauvinismo militante, defesa da política agressiva e imperialista; esse termo provém da palavra intraduzível jingo, do refrão de uma canção chauvinista inglesa dos anos 70 do século XIX. (retornar ao texto)