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A reprodução simples é mais uma hipótese teórica do que um fato real. Não a encontramos na realidade capitalista senão excepcionalmente, pois a sociedade capitalista baseia-se na reprodução ampliada. Vejamos como se cumpre o processo de realização na reprodução ampliada.
Esta supõe que uma parte da mais-valia é capitalizada, isto é, empregada, não no consumo do capitalista, mas no aumento da produção, em outros ternos, transformada em capital. É preciso comprar, com este fim, no mercado, a ferramenta adicional, as máquinas, as matérias primas, as matérias auxiliares e a força de trabalho. É preciso, por consequência, que os meios de produção, para servir à produção ulterior, tenham sido realmente produzidos.
Para acumular, é preciso transformar em capital uma parte do sobreproduto. Mas, a menos que se operem milagres, não se pode transformar em capital senão coisas que sejam utilizáveis no processo do trabalho, isto é, meios de produção, ou, ainda, as coisas de que o operário tenha necessidade para viver, isto é, meios de subsistência. Por consequência, é preciso que uma parte do sobretrabalho anual tenha sido consagrado em criar meios suplementares de produção e subsistência em excedente sobre a quantidade necessária à substituição do capital adiantado. Numa palavra, a mais-valia só é conversível em capital porque o sobreproduto de que ela é o valor já contém os elementos materiais do novo capital.(1)
Além dos meios adicionais da produção, é preciso uma quantidade adicional de força de trabalho.
Por seu próprio mecanismo, a produção capitalista tornou-se dependente do salário que lhe assegura a conservação e o crescimento. Estas forças adicionais, que todos os anos a classe operária lhe fornece em dr versos graus de idade, o capital tem apenas que as incorporar aos meios de produção adicionais já contidos na produção anual; e está feita a conversão da mais-valia em capital.(2)
O esquema da reprodução simples, que examinamos mais atrás, deriva da hipótese de que os meios de produção criados na secção I só são suficientes para a reconstituição do capital constante já colocado nas duas secções e que os meios de consumo criados na secção II só são suficientes para satisfazer as necessidades dos operários e capitalistas das duas secções. Nesta condições, não se pode falar de nenhum aumento de produção. Mesmo se os capitalistas da secção I se dessem à fantasia de empregar uma parte da mais-valia no aumento da produção, eles não o poderiam fazer, porque não encontrariam no mercado nem os meios de produção nem a força de trabalho adicionais.
O esquema de que nos servimos deve ser, portanto, modificado para que se torne possível a reprodução ampliada. Que modificações devem ser introduzidas aí? Se os capitalistas da secção I querem aumentar sua produção, ela deve ser bastante grande para que eles possam, não somente reconstituir seu capital constante nas proporções anterior (Ic), não somente satisfazer as necessidades da secção II em capital constante (IIc), mas ainda ter um certo excedente destinado ao aumento da produção. Este excedente não era possível no esquema precedente por que I v + I m era igual a IIc; em outros termos, os capitalistas da secção I trocavam todos os produtos que lhe ficavam depois da reprodução simples por meios de consumo de um valor igual a IIc. Agora, porém, eles devem guardar uma parte do produto restante depois da reprodução simples para aumentar sua produção; em outros termos, v + m deve ser maior na secção I do que na secção II (isto é, maior que a quantidade de produtos trocados entre as duas secções).
O esquema da produção aumentada deve, portanto, ser baseado na desigualdade seguinte:
Iv + IM > IIc
Se guardamos para a secção I os números dados no esquema precedente e se admitimos que os capitalistas desta secção empregam a metade de sua mais-valia no aumento da produção, obteremos, sempre segundo Marx, o esquema modificado seguinte:
Secção I, produção de meios de produção:
4.000 c + 1.000 v + 1.000 m = 6.000
Secção II, produção de meios de consumo:
1.500 c + 750 v + 750 m = 3.000
Os capitalistas da 1.º categoria dedicam, portanto, a metade de sua mais-valia, seja 500 milhões, ao aumento de sua produção. Estes 500 milhões devem servir para a compra de meios de produção e de força de trabalho, isto é, de elementos do capital constante e do capital variável.
As proporções em que estes 500 milhões se dividirão em capital constante e capital variável dependem da composição orgânica do capital da secção 1, composição igual na nossa hipótese a 4.000 : 1.000; a relação do capital constante para o capital variável é, em outros termos, de 4 : 1. Supondo-se que as mesmas proporções sejam observadas no aumento da produção, 400 milhões serão gastos na compra de meios de produção e 100 milhões na compra de força de trabalho. Existem, então, no mercado, meios de produção adicionais para 400 milhões de francos? Nosso esquema supõe a afirmativa. Foram criados seis biliões de meios de produção. Quatro biliões serão absorvidos pela reconstituição do capital constante da secção I, 1.500 milhões para a reconstituição do capital constante da secção II. Fica um excedente de 500 milhões de meios de produção. 400 milhões irão para o aumento ulterior da produção. Ficará um excedente de 100 milhões a realizar, que deverá sem dúvida ser trocado por meios de consumo destinados aos operários, que o aumento da produção da secção I exigirá e cujo salário se elevará justamente a 100 milhões de francos.
Como serão realizados os meios de consumo produzidos na secção II? Passará para 1.500 milhões na 1.º categoria, em troca de meios de produção necessários à reconstituição de capital constante da secção II. 750 milhões de francos de meios de consumo servirão para satisfazer as necessidades dos operários ocupados nas indústrias da secção II. Ficarão a realizar 750 milhões, representando a mais-valia dos capitalistas da secção II. Uma parte dessa quantidade de meios de consumo — na medida de 100 milhões — será destinada à mão-de-obra adicional da secção I. Em troca destes 100 milhões de francos de meios de consumo, a II recebera meios de produção adicionais por uma soma igual. A existência destes meios de produção adicionais dá a possibilidade de aumentar igualmente a produção da secção II. Mas os meios de produção são em si mesmo insuficientes. É preciso também uma mão-de-obra adicional. A relação entre o capital constante e o capital variável nos ramos de indústria da secção I é de 2 : 1. Se os meios de produção desta secção aumentam de 100 milhões de francos, os meios de consumo destinados ao novo pessoal da indústria devem aumentar de 50 mihões. Estes meios de consumo devem ser tomados sobre os 750 milhões que constituem a mais-valia dos capitalistas da secção II. Destes 750 milhões, 100 milhões servirão para a compra de meios de produção adicionais, 50 milhões servirão para a compra de meios de consumo adicionais, e ficará um fundo de 600 milhões, que os capitalistas poderão empregar segundo suas próprias necessidades.
Nosso esquema apresenta-se, de agora em diante, da seguinte forma:
Secção I (produção de meios de produção). Valor primitivo da produção... | 4.000c + 1.000v + 1.000m = 6.000 |
Meios de produção e de consumo adicionais destinados ao aumento da produção pela capitalização de uma parte da mais-valia... | 400c + 100v = 500 |
Valor da produção depois do aumento... | 4.400c + 1.100v + 500m= 6.000 |
Secção II (produção de meios de consumo). Valor primitivo da produção... | 1.500c + 750v + 750m = 3.000 |
Meios de produção e de consumo adicionais destinados ao aumento da produção pela capitalização de uma parte da mais-valia... | 100c + 50v = 150 |
Valor da produção depois do aumento... | 1.600c + 800v + 600m = 3.000 |
Que nos ensina este esquema e que conclusões podemos tirar do que precede?
Notemos, desde já, que, se na reprodução simples o equilíbrio só é possível sob a condição de um desenvolvimento proporcional dos diversos ramos da economia, a reprodução ampliada confere a este desenvolvimento proporcional um caráter mais complexo: o aumento de um ramo da produção em certas proporções não é possível senão sob a condição de um aumento proporcional dos outros ramos. Não encontramos uma confirmação mais precisa da estreita interdependência dos diversos ramos de economia senão em fórmulas matemáticas.
Tratando da reprodução simples e da reprodução ampliada, apenas consideramos os casos elementares. Temos suposto, para simplificar, que a composição orgânica de capital continuaria invariável na reprodução ampliada. Se tivéssemos procurado dar um esquema mais complexo, onde se levasse em conta o fato bem conhecido de que a composição orgânica do capital se eleva ao mesmo tempo que aumenta a produção, o caráter mesmo das proporções entre os diversos ramos da economia nos teria aparecido mais complexo ainda. As coisas se complicariam ainda mais se nós tivéssemos em conta que a troca entre os diversos ramos de produção não se faz em espécie, mas em dinheiro. A realidade apareceria então infinitamente mais complexa do que os nossos esquemas.
Mas nós temos ocasião de verificar quanto o desenvolvimento rigorosamente proporcional das partes da economia é importante para o equilíbrio da sociedade capitalista. A menor perturbação desta proporcionalidade, a menor super-produção ou sub-produção, faz-se sentir imediatamente em toda a economia capitalista e perturba-lhe o equilíbrio.
Notas de rodapé:
(1) C. MARX: O Capital, 1.º vol, t. IV, pgs. 32 e seg. (ed. Costes, Paris). (retornar ao texto)
(2) Ob. cit. (retornar ao texto)
Inclusão | 10/06/2023 |