Conceitos Fundamentais de O Capital
Manual de Economia Política

I. Lapidus e K. V. Ostrovitianov


Livro oitavo: A acumulação do capital e a reprodução das relações capitalistas
Capítulo XX - Formas especiais da concentração na agricultura
106. Vantagens da grande produção agrícola sobre a pequena


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O estado atrasado da técnica agrícola e a estabilidade da pequena produção agrícola, em relação à pequena produção industrial, quererá significar que a grande produção capitalista não pode impor-se neste domínio?

Não é difícil nos capacitarmos, não obstante as particularidades que acabamos de mencionar, de que a grande produção capitalista é muito superior, na agricultura, à pequena e que a concentração da produção se produz também nos campos, ainda que mais lentamente do que na indústria.

A grande produção agrícola é muito mais econômica. Comparemos, em igualdade de superfície e de capital, as despesas de produção de dez pequenas explorações agrícolas e de uma grande. A grande perderá, evidentemente, menos terras cultivadas em limites e estradas do que as dez parcelas. Ora, a existência de um grande número de limites e de estradas acarreta perdas de sementes (porque forçosamente caem nas estradas e nos limites). A grande exploração realizará grandes economias na construção de edifícios. As dez pequenas fazendas deverão comportar dez habitações, dez depósitos, dez cavalariças, enquanto a sua grande concorrente se contentará com uma grande habitação,

um grande depósito, uma grande cavalariça. Sabe-se que a construção de um grande edifício se torna sensivelmente mais barato do que a de dez pequenas construções de capacidade correspondente. Enfim, a utilização de um grande edifício é muito mais econômica que a de dez pequenos. A prática ensina-nos que é preciso menos combustível, menos eletricidade, etc., para aquecer e iluminar um grande edifício do que a dez pequenos. Dá-se o mesmo na utilização de móveis e semoventes. A grande empresa poderá contentar-se com menos charruas, cercados, arreios, debulhadores, cavalos, etc., do que dez pequenas, estando em condições de utilizar mais rendosamente seus instrumentos de trabalho.

Um exemplo. No governo de Poltava (Ucrânia), há em média, para cem deciatinos(1) de terras cultivadas pelos pequenos cultivadores, à razão de um a três deciatinos por família, dez charruas e cinquenta cavalos. Não é preciso, para explorar os mesmos cem deciatinos nas empresas que dispõem de cinquenta deciatinos e mais, senão de quatro charruas e vinte cavalos, ou seja, dois e meio menos. A exploração de domínios mais extensos permite ainda maiores economias de gado e de máquinas.(2)

A grande agricultura tem sobre sua rival a vantagem de poder recorrer a máquinas mais aperfeiçoadas. Ora, as máquinas elevam grandemente o rendimento de trabalho na agricultura.

Para percebermos melhor isto, vejamos quantas horas de trabalho exige a debulhação de uma tonelada de cereais.

  HORAS
Trabalho realizado sem máquinas 104,0
Trabalho feito com a ajuda de uma debulhadora e de um cavalo 41,4
Trabalho feito com a ajuda de uma debulhadora e de um motor elétrico de 20 cavalos vapor 26,4
Trabalho feito com a ajuda de uma debulhadora aperfeiçoada, provida de um motor elétrico de 60 cavalos-vapor 10,5

As máquinas são quase inacessíveis à pequena produção. Primeiramente, porque sua aquisição exige grandes capitais de que o pequeno produtor em geral não dispõe; e, depois, porque as mais possantes não são de emprego vantajoso senão quando as proporções da exploração permitem utilizá-las mais ou menos totalmente.

Conforme a doutrina de Kraft sobre a produção agrícola, os instrumentos agrícolas não podem ser utilizados senão em razão das seguintes proporções nos cultivos:

Estes números mostram bem claro que somente as grandes explorações podem beneficiar-se com as excelências da técnica mais recente.

A grande produção pode também tirar muito melhor partido da mão-de-obra. Explorando muito mais operários, ela pode instituir entre eles uma certa divisão do trabalho.

Para a ceifa e para outros trabalhos em que é preciso ir depressa, o trabalho é mais rápido e melhor se tiver muitos operários. Por ocasião da ceifa, dois condutores, dois carregadores, dois ceifadores, dois jornaleiros e os outros no paiol ou na granja, fazem duas vezes mais trabalho do que o mesmo número de operários disseminados em várias fazendas.(4)

A grande exploração tem também sobre as pequenas a superioridade de poder empregar a mão-de-obra mais qualificada, os técnicos agrícolas, os agrônomos, o que está acima das forças dos pequenos cultivadores. Ora, a direção de um agrônomo provido de uma instrução científica é necessária à organização racional de uma exploração agrícola conforme a última palavra da técnica. Mas, para que as despesas de manutenção de um bom agrônomo sejam cobertas pelo rendimento do trabalho, é preciso que as dimensões da exploração permitam uma utilização completa das forcas deste colaborador científico. Isto só é possível nas grandes empresas, em relação com o caráter mesmo do cultivo.

Na Europa central, diz Kaustski, o cultivo intensivo de um domínio de 80 a 100 hectares pode absorver o trabalho de um especialista; no caso de um cultivo mais extensivo seriam precisos 100 a 125 hectares.(5)

A grande exploração agrícola não oferece menos vantagens em matéria de comércio e de crédito. O pequeno agricultor é obrigado a vender e comprar suas mercadorias em pequenas quantidades, o que ocasiona despesas muito mais elevadas do que a venda e a compra por atacado. Já estudamos as vantagens da concentração do capital comercial. Não assinalaremos aqui senão mais um traço que tem uma particular importância. É o considerável papel das despesas de transporte no valor dos produtos agrícolas. De um modo geral, as despesas de transporte ficam com a parte do leão entre as demais despesas da produção agrícola, mas está claro que estas devem ser mais consideráveis nas pequenas empresas do que nas grandes. O comércio de pequenas quantidades de mercadorias necessita por sua vez de intermediários que não deixam de se aproveitar da fraqueza econômica do pequeno agricultor, seu insuficiente conhecimento do mercado, sua necessidade de dinheiro, para se apropriar de uma importante parte de seu trabalho suplementar quando não é de uma parte de seu salário.

A grande exploração agrícola obtém mais facilmente crédito, e em melhores condições. O pequeno cultivador, tendo sempre carência de dinheiro, está sempre às voltas com dificuldades contínuas e acaba recorrendo aos usurários, que o escravizam. O grande proprietário territorial recorre, entretanto, aos bancos.

A grande produção oferece, pois, na agricultura, vantagens inestimáveis.

Eis porque o processo de concentração da produção, acompanhado da ruína dos pequenos produtores, prossegue inflexivelmente na agricultura, ainda que com mais vagar do que na indústria.

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Notas de rodapé:

(1) Um deciatino equivale a 1 hectare 0,92. (N. do T.). (retornar ao texto)

(2) GIGOUR: A organização das explorações comunistas na agricultura. Moscou, 1918. (retornar ao texto)

(3) C. KAUSTKI: A questão agrária. (retornar ao texto)

(4) C. MARX: O Capital, 1.° volume, t. II, pág. 215. (ed. A. Costos, Paris). (retornar ao texto)

(5) C. KAUSTKI: A questão agrária. (retornar ao texto)

Inclusão 16/06/2019