Conceitos Fundamentais de O Capital
Manual de Economia Política

I. Lapidus e K. V. Ostrovitianov


Livro sexto: O capital emprestado e o crédito. Moeda e crédito e papel moeda
Capítulo XIII - Moeda de Crédito e Papel-Moeda
69. O poder aquisitivo do papel-moeda


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Esses caracteres particulares do papel-moeda têm consequências que nós devemos estudar, comparando novamente o papel-moeda com a moeda de crédito.

É limitada a emissão bancária de crédito? E como? É, evidentemente, limitada pela quantidade de títulos reais de crédito que o banco receberá em troca desses documentos. Se a quantidade de títulos bancários aumenta de 10 milhões de francos, é que o banco recebeu títulos comerciais reais por essa soma; isso significa que o volume de negócios do país aumentou nessa proporção. O aumento da quantidade de títulos bancários na circulação é, pois, regulado pelo estado geral da economia e pela procura de dinheiro que resulta da circulação de mercadorias.

Eis porque precisamente a troca da moeda de crédito contra ouro é assegurada, eis porque o poder aquisitivo da moeda de crédito será em geral definido pelo da moeda-ouro; em outros termos, poder-se-á comprar com títulos bancários tantas mercadorias quantas se compraria com a mesma quantia em ouro. O mesmo não se dá com o papel-moeda emitido pelo Estado independentemente das necessidades reais da circulação de mercadorias e em proporções correspondentes às necessidades do Estado quando as suas despesas ultrapassam a sua receita.

Pode o papel-moeda, nessas condições, ter uma capacidade de compra igual à da moeda-ouro?

Isso depende da importância das emissões e da necessidades de dinheiro como meio de circulação da economia.

A soma de dinheiro necessária à circulação de um país num momento dado é uma grandeza definida. Ela depende, antes de tudo, do valor da massa das mercadorias em circulação no mercado e do tempo de circulação da moeda (ou de seus substitutos); quanto maior for o valor das mercadorias, mais dinheiro será necessário. Quanto mais rápida for a rotação da moeda, menos dinheiro será necessário. Mas é preciso deduzir da soma de dinheiro necessária num momento dado as mercadorias vendidas a crédito.

Podendo os títulos de crédito emitidos anteriormente estar vencidos nesse momento, será preciso evidentemente juntar a soma desses pagamentos dos fundos disponíveis necessários à circulação, exceção feita, entretanto, dos títulos comerciais que possam ser cobertos por ocasião do ajuste de contas sem pagamentos em espécie.

Que acontecerá se a quantidade da moeda-ouro ultrapassar a soma necessária à circulação? Já o sabemos. O excedente se acumulará sob forma de tesouro ou será fundido para servir à fabricação de objetos de ouro.

Que acontecerá se, em lugar de moeda-ouro, nós tivermos em circulação papel-moeda?

Suponhamos que o país tenha, nesse momento, 100 milhões de francos de moeda ouro e 100 milhões de papel-moeda. Se a quantidade do dinheiro necessário à circulação, o que se chama valor da circulação, não é inferior a 200 milhões, é evidente que o papel-moeda poderá ser cotado ao par do ouro. Não podendo o ouro bastar a todas as necessidades da circulação e a parte do valor da circulação que ele deixa descoberta não sendo inferior à quantidade de papel-moeda destinada a substituir a moeda-ouro, o papel-moeda terá evidentemente poder aquisitivo igual ao do ouro. Mas suponhamos que a quantidade de dinheiro necessária à circulação continue de 200 milhões e que uma nova emissão de 100 milhões de papel-moeda seja feita. Daí em diante a quantidade de dinheiro, ouro e papel, do país, se elevará a 300 milhões. É evidente que uma parte dessa soma, a saber, 300 — 200 = 100 milhões, se tornará supérflua. Essa soma deverá transformar-se, de meio de circulação, em tesouro.

Qual a moeda que se transformará em tesouro?

Todo mundo preferirá, entesourando, guardar moeda de ouro, que tem valor intrínseco. Os 100 milhões de francos serão pouco a pouco retirados da circulação e depositados nos pés de meias, no fundo das malas e dos cofres. 200 milhões de francos papel ficarão em circulação. E a circulação, tendo precisamente necessidade dessa soma, o papel-moeda substituirá com sucesso a moeda-ouro; receber-se-á por um franco papel tanto de mercadoria quanto por um franco ouro.

Mas, permanecendo o mesmo valor de circulação, a quantidade de papel-moeda se elevará a 300 milhões.

Se esses 300 milhões de papel-moeda substituem na circulação 200 milhões de francos ouro, é evidente que não se poderá receber, por 3 francos, maior quantidade de mercadorias do que a que se recebia antes por dois francos ouro e que o poder aquisitivo de 1 franco papel será igual a 8/3 de franco ouro.

Mas pode o excedente de 100 milhões de francos papel ser eliminado da circulação como aconteceu acima com a moeda-ouro? Ao contrário do ouro, o papel não se pode transformar em tesouro. Ele está condenado a circular incessantemente.

Ha pessoas que, acostumadas ao curso firme do papel-moeda do tempo em que a sua quantidade não era excessiva, costumam guardá-lo para “os maus dias”. O grande capitalista comete esse erro. Podemos figurar-nos em teoria o Estado a emitir justamente tanto papel-moeda supérfluo quanto aquelas pessoas guardam nos seus pés de meias: na realidade, quando as emissões se sucedem durante certo tempo (para cobrir as despesas de uma guerra, por exemplo), a quantidade de papel-moeda ultrapassa de longe essas economias. E, desde que a quantidade de papel-moeda em circulação seja superior ao valor da circulação, nenhuma pressão pode fazê-lo aceitar ao mesmo título que o ouro. Quanto mais papel-moeda houver, menor será o seu poder aquisitivo. As economias feitas em papel-moeda se depreciam e as pessoas inexperientes acabam por perder elas próprias o hábito de guardar papel. O papel- moeda, reservado para os dias difíceis, é então bruscamente lançado no mercado, onde ele vem aumentar a soma de circulação e diminuir o seu poder aquisitivo. O Estado, que pode por vezes reembolsar livremente por ouro o papel, se ele foi emitido em pequena quantidade, cessa de o fazer, por pouco que as emissões se acumulem e que o poder aquisitivo do papel-moeda caia em proporção.

continua>>>


Inclusão 03/10/2018