Declaração do birô político da Organização Comunista Internacionalista (pela reconstrução da 4ª Internacional)

Pierre Lambert

20 de agosto de 1971


Primeira publicação: folheto da OCI, 20 de agosto de 1971.

Fonte: Revista A Verdade n.º 60/61 - Especial Pierre Lambert (junho de 2008).

Tradução: Comissão de tradutores da Revista A Verdade.

HTML: G. P..


I. Crise da decomposição do regime da propriedade privada dos meios de produção

Bastou apenas um discurso(1), pronunciado pelo representante de Wall Street sediado na Casa Branca(2), para colocar abaixo o amontoado de mentiras edificado para provar que o capitalismo, ao se auto-reformar, teria reencontrado uma pretensa capacidade de superar suas contradições internas, agravadas na fase do“imperialismo, fase superior do capitalismo” (Lênin), fase do capitalismo apodrecido, agonizante. Em um discurso pronunciado em 15 de agosto, Nixon é obrigado a infligir um desmentido feroz aos teóricos do neocapitalismo, do capitalismo monopolista de Estado, e a todos aqueles que, para embelezar, consciente ou inconscientemente — pouco importa — o sistema da propriedade privada dos meios de produção, exaltavam a eficácia das “medidas anticíclicas” tomadas pelos magnatas do capital financeiro, que teriam assim garantido uma “ultrapassagem progressiva” do capitalismo, permitindo-lhe, ao longo de um “período de prosperidade” de longa duração, de desenvolvimento das forças produtivas.

Hoje, todas essas “teorias” se desfazem em migalhas no chão, despedaçadas pelas medidas tomadas pelo imperialismo estadunidense.

Hoje, tanto as medidas tomadas pelo imperialismo dos Estados Unidos quanto aquelas que os imperialismos secundários tentam adotar, e, em particular, no que nos diz respeito, o imperialismo francês, exprimem a tendência inerente do capitalismo agonizante de desagregar o mercado mundial. As medidas exprimem igualmente a vontade de fazer os trabalhadores de cada país pagarem, em seus países, pela sobrevivência do regime da propriedade privada dos meios de produção, para tentar superar o caos econômico, financeiro, político e social que provoca a desagregação do mercado mundial.

Tal é, sem maquiagens, a realidade.

- A OCI afirma, de acordo com Lênin e Trotsky:

No estágio do imperialismo, resultado final de todo o desenvolvimento do capitalismo do qual não seria possível dissociá-lo, as forças produtivas sufocam na prisão da propriedade privada dos meios de produção e dos Estados nacionais.

Crises monetárias, inflação, deflação, desvalorização, revalorização, controle de taxas, embargo sobre o ouro, política de juros, contratos de crédito, todas essas medidas e consequências, e várias outras mais, traduzem o impasse do sistema capitalista, cuja sobrevivência implica no agravamento das condições de vida e de trabalho, na desqualificação, no desemprego, na delinquência juvenil, na queda do poder de compra, no aumento dos preços, no desmantelamento regulado do ensino e na ruína da cultura.

- A OCI afirma:

Para salvar a civilização humana e as massas trabalhadoras da decadência, não há tarefa mais urgente do que o combate unitário pela abolição da propriedade privada dos meios de produção através da revolução proletária, para instaurar o poder da classe operária em substituição aos Estados burgueses.

- A OCI afirma:

Não há tarefa mais urgente do que a de se organizar para construir o partido revolucionário e reconstruir a Internacional, a 4ª Internacional, instrumento indispensável para realizar as aspirações das massas trabalhadoras e para garantir sua defesa contra o capital e o Estado.

II. A militarização da economia capitalista condiciona a sobrevivência do imperialismo

Os acontecimentos confirmam a exatidão da análise marxista, tal como Trotsky a formulou no programa da 4ª Internacional, adotado em 1938: os capitalistas, os agentes conscientes do capital, os jornalistas pequeno-burgueses, os inventores de teorias e outros mistificadores instalados dentro e fora do movimento operário têm buscado, há mais de 30 anos, justificar a pretensa capacidade do regime capitalista de se auto-reformar, de colocar em xeque as capacidades revolucionárias do proletariado, acusando a classe operária de “aburguesamento”. As medidas tomadas por Nixon acabam com todos os cantos de sereia através dos quais, por toda parte, procurou-se ofuscar a consciência de classe do proletariado.

Mas uma questão vem à tona. Como se chegou a esse ponto? Nesses 25 últimos anos, é bem verdade que assistimos a gigantescos progressos técnicos, que os ideólogos e pequeno-burgueses qualificaram de Terceira Revolução Industrial.

Armada do instrumento representado pelo programa marxista do partido revolucionário, a OCI responde:

- Em 1945, a 2ª Guerra Imperialista termina com a mais gigantesca destruição e o maior holocausto jamais conhecido ao longo de toda a história da humanidade.

- Em 1945, em todos os países, as massas trabalhadoras - radicalizadas pelos sofrimentos vividos durante a 2ª Guerra - se mostram prontas a se engajar no combate revolucionário para acabar com o regime capitalista. Mas, em Yalta e Potsdam(3), Churchill, Stalin, Roosevelt, Truman — os grandes desse mundo — colocam-se de acordo contra a revolução socialista e sobre a forma de reconstruir, com os Estados burgueses desagregados, o sistema do lucro. Os dirigentes das grandes organizações operárias colaboram com a burguesia: na França, ministros do Partido Comunista Francês (PCF) e do Partido Socialista são colocados dentro do governo presidido por De Gaulle.

Para acalmar os trabalhadores e bloquear o caminho da revolução, os capitalistas de todos os países são obrigados a conceder algumas reivindicações.

O essencial para a burguesia é salvar o regime da propriedade privada dos meios de produção e reconstruir os Estados burgueses: ela abre uma mão contando firmemente recuperar o dobro com a outra.

Assim, as condições políticas para a reconstrução das economias capitalistas são reunidas até 1949; para os Estados Unidos, em particular, é um “boom” sem precedentes.

A reconstrução das economias devastadas pela guerra torna-se o motor do “progresso” econômico, em todos os países.

A OCI levanta uma nova questão: pode-se qualificar como sendo “progresso” o que não passa de uma reconstrução do que foi destruído? E os milhões de mortos? E os milhões de mutilados? E o gigantesco e mortal desperdício de trabalho humano que o massacre, no qual os povos foram jogados, provocou para saber quem, entre os mestres capitalistas, dominaria o mundo?

Passemos e recomecemos.

Sim, desde 1949, a economia dos Estados Unidos está ameaçada por uma crise econômica e financeira que seria o sinal de um desabamento internacional de uma incomparável e maior amplitude do que a crise de 1929, com todas as ameaças revolucionárias que implicariam uma tal crise.

É então que, “no alto”, entre os mestres capitalistas, decide-se recomeçar.

Em 1950, a Guerra da Coréia vai conduzir ao relançamento da economia estadunidense, e, partindo dela, da economia mundial.

Desde então, ano após ano, foram as injeções, cada vez maiores, de créditos militares na economia dos EUA que levaram a um “progresso econômico sem precedentes”.

Até 1941, a produção de armamentos nos Estados Unidos representava apenas 1% da produção nacional; oficialmente, hoje ela representa 10%, mas na verdade são 20% de forma permanente. Os orçamentos de Defesa são inflados e atingem a soma formidável de 100 bilhões de dólares oficialmente, e, na realidade, chegam a 200 bilhões. O mesmo se passa, guardadas as proporções, nos demais países capitalistas.

Novamente, a OCI coloca a questão para todos aqueles que insistem em martelar, nos ouvidos dos trabalhadores, sobre a capacidade do neocapitalismo, ou do capitalismo monopolista de Estado, de garantir um novo desenvolvimento das forças produtivas no âmbito da propriedade privada dos meios de produção.

Pode-se qualificar de “progresso econômico sem precedentes” esse gigantesco desperdício do trabalho humano, no qual as forças produtivas colocadas em ação pelos explorados transformam-se em forças destrutivas, assim como Marx, Lênin e Trotsky tinham indicado? Pode-se falar efetivamente de avanço das forças produtivas quando os fatos demonstram o quanto Marx e Engels tinham razão em predizer que, em um certo estágio de seu desenvolvimento, os gastos com a sobrevivência do regime capitalista custariam mais caro do que o que esse regime proporciona à humanidade?

Com o imperialismo - a “reação em toda a linha”, assim como Lênin definiu -, a força de trabalho dos trabalhadores é desperdiçada; com a militarização da economia, a civilização humana é ameaçada de ser engolida pela barbárie da 3ª Guerra Mundial, barbárie cuja guerra do Vietnã e o extermínio dos “bengalis”(4) representam os primeiros sintomas.

A OCI afirma, e os fatos demonstram, que o “Programa de Transição” da 4ª Internacional teve um prognóstico correto ao constatar:

“As premissas econômicas da revolução proletária chegaram há muito tempo no ponto mais alto que pode ser atingido sob o capitalismo. As forças produtivas pararam de crescer. As novas invenções e os progressos técnicos não conduzem mais a um crescimento da riqueza material. As crises conjunturais, nas condições da crise social de todo o sistema capitalista, trazem privações e sofrimentos cada vez maiores às massas. O crescimento do desemprego aprofunda, por sua vez, a crise financeira do Estado e mina os sistemas monetários abalados. Os governos, tanto democráticos como fascistas, vão de uma bancarrota a outra.”

O governo dos Estados Unidos, pela voz de seu presidente Nixon, pelas medidas que tomou - embargo sobre o ouro, não-conversibilidade do dólar, taxa de 10% sobre as importações -, busca fazer os outros países capitalistas pagarem sua própria bancarrota. Instaurando o congelamento dos salários, busca igualmente fazer com que os operários estadunidenses paguem sua bancarrota. Mas Nixon não deixou de declarar, em 18 de agosto de 1971, em Dallas:

“As despesas militares não serão atingidas pelas medidas recentemente tomadas; ao contrário, deve-se justamente valorizar a capacidade de defesa do país.”

De bancarrota em bancarrota, se o proletariado mundial não acabar com o regime capitalista em cada país, os capitalistas do mundo todo levarão a humanidade à bancarrota final da barbárie.

III. O impasse da economia de armamentos é a causa da crise monetária

O sistema capitalista não produz mercadorias para satisfazer as necessidades dos seres humanos; produz mercadorias que precisam ser vendidas no mercado visando a realizar, sob a forma de dinheiro, o lucro, cuja fonte é a mais-valia extorquida pelo capital do trabalhador assalariado, e que, sob a forma de capital investido (acumulado), assegura o funcionamento do sistema de produção capitalista.

Em nenhum momento, os produtores conseguem amealhar o produto do seu trabalho. O modo de produção capitalista, em intervalos periódicos, se vê com excesso de mercadorias, excesso de trabalhadores, excesso de capitais.

Não podendo mais realizar a mais-valia, o sistema capitalista confronta-se com a crise econômica que, então, produz uma brusca e maciça destruição das forças produtivas, reduzindo milhões de trabalhadores ao desemprego, até que o modo de produção capitalista, suficientemente saneado, por um lado, como resultado dessas destruições, e, por outro lado, pela conquista de novos mercados, possa retomar sua marcha à frente.

Com o imperialismo, estágio supremo do capitalismo, o planeta inteiro está submetido ao mercado capitalista; a partilha do mundo está terminada.

A expansão de cada imperialismo, a longo prazo, só é possível às custas dos outros ou por meio das guerras imperialistas.

A militarização da economia e a economia de armamentos tornam-se - por um período mais ou menos longo e como prefácio da economia de guerra e da guerra propriamente dita - meios privilegiados de realizar a mais-valia. Dito de outra forma, o militarismo torna-se um meio - o principal - de acumular capital. Os crescentes orçamentos militares e a economia de armamentos tornam-se fatores indispensáveis ao funcionamento do conjunto da economia capitalista. No próprio seio da economia capitalista, em seu conjunto, o Estado burguês, fundindo-se com os monopólios, forja um mercado parasitário no qual se precipita uma parcela cada vez maior das forças produtivas, transformadas assim em forças destrutivas, que servem de motor de empuxo para a marcha de toda a produção capitalista.

A crise econômica clássica é, assim, contida até certo ponto pela destruição maciça das forças produtivas utilizadas para a construção de armamentos.

O consumo de mercadorias para e pelos exércitos, absorvendo o material de guerra, abre um mercado novo, ao qual tudo é subordinado: às máquinas, o trabalho de milhões de produtores, a pesquisa científica e técnica e as aplicações industriais da pesquisa.

A economia de armamentos garante desde então o funcionamento do conjunto do sistema e de todos os ramos da produção capitalista. Ela é a condição para o prosseguimento da acumulação do capital. Mas ela não é suficiente para sanear a economia capitalista. Caso a guerra não venha, como conclusão lógica, as fronteiras do mercado estruturado com base na propriedade privada dos meios de produção na época do imperialismo cedo ou tarde limitarão o setor da economia de armamentos, como todos os outros setores da economia capitalista.

Nixon confirma esses limites nas medidas que acaba de adotar.

O déficit da balança de pagamentos estadunidense traduz o fato de que o capitalismo estadunidense “produziu um excesso de mercadorias de todo tipo, incluindo as militares”. E não se trata somente dos Estados Unidos, mas de todos os demais imperialismos. Todos os países têm, num momento ou noutro,”exportado em excesso” ou “importado em excesso”.

Em todos os países, os preços estão em alta, como também o crédito. Em todos os países há inflação.

As crises monetárias e financeiras que se sucedem ano após ano acabam de explodir numa crise maior.

Essas crises têm uma única causa: o mercado mundial não tem capacidade para absorver as mercadorias produzidas. Apesar da economia de armamentos, há uma superabundância mundial de capitais, sob a forma de mercadorias e de meios de produção.

A crise de superprodução ameaça. A ameaça é ainda consideravelmente agravada pelo fato de que o setor da economia de armamentos é alimentado pelos Estados burgueses, que o financiam por meio da inflação de crédito e de moeda, por manipulações financeiras de todo tipo - as famosas medidas anticíclicas -, que terminam criando uma massa crescente de capitais fictícios, dos quais uma fração cada vez menor chega a ser investida na produção.

É aí, exclusivamente aí, que reside a causa da crise do sistema monetário internacional. Todos os Estados burgueses, visando a sustentar suas despesas parasitárias de todo tipo, e particularmente as despesas com armamentos, têm aberto saídas artificiais à produção para permitir à economia, em seu conjunto, funcionar. Todos os governos capitalistas, e em primeiro lugar o governo estadunidense, financiaram o setor de armamentos por meio de acordos de cavalheiros, empréstimos, inflação e pelas mil e uma maneiras fornecidas pelas técnicas financeiras.

Os desequilíbrios das balanças comerciais e de pagamentos, e principalmente o desequilíbrio das balanças estadunidenses, que estão no centro dessa formação de enormes capitais fictícios, traduzem o impasse de uma economia baseada na propriedade privada dos meios de produção.

Não é urgente acabar com a dominação da classe burguesa e com seu modo de produção?

IV - Nixon decidiu não mais honrar seus cheques sem fundos e seus acordos de cavalheiros

No fim da 2ª Guerra Mundial, o imperialismo estadunidense distanciava-se - e de longe - de todos os outros imperialismos, tanto o da Inglaterra e o da França, “vencedores”, quanto o da Alemanha e o do Japão, “vencidos”.

Na conferência monetária de Bretton Woods, em 1944(5), o dólar é consagrado como padrão, equivalente ao padrão ouro ou como meio de pagamento internacional. O capital financeiro ianque domina assim, sem contestação, o mercado mundial, que ele contribuirá para restabelecer até 1949.

A partir de 1949, o imperialismo estadunidense choca-se com as barreiras do mercado mundial, estruturadas sobre a propriedade privada dos meios de produção. Ele se safa, como vimos, por meio de injeções crescentes de créditos militares, que, pela constituição do mercado parasitário e artificial da economia de armamentos, preservam a estabilidade do mercado capitalista, no qual as forças produtivas sufocam na camisa de força da propriedade privada e dos Estados nacionais.

Isso ocorre por algum tempo... até o momento em que a massa de capitais fictícios, incapaz de se reconverter na produção capitalista “normal”, flutua à procura de um lucro na especulação.

A partir daí, e sob uma forma latente, velada ou mais aberta, a crise financeira internacional ameaça, como expressão da crise clássica de superprodução.

O lugar, o papel jogado na economia, na política e na diplomacia mundiais pelo imperialismo estadunidense, sobre o qual repousa todo o edifício do sistema mundial do imperialismo, exigem que o dólar permaneça como meio de pagamento internacional.

Porém, cada vez mais, e sobretudo desde o início da década de 1960, as condições econômicas e financeiras não permitem que o dólar desempenhe livremente o seu papel de meio de pagamento internacional. Confrontado, por um lado, à concorrência de rivais que reconstruíram sua capacidade concorrencial, mas cuja estabilidade social é abalada pela luta de classes, e, por outro lado, com seu próprio proletariado, o imperialismo estadunidense deve sustentar a conjuntura econômica internacional por uma nova escalada das despesas armamentistas.

Essas despesas armamentistas conduzem a novas altas de preços e criam, pela inflação, uma massa sempre crescente de capitais flutuantes, que cada vez arruínam mais a economia, as finanças, as relações sociais.

Em 1968, o sistema começa a quebrar. Como o dólar não podia mais desempenhar livremente o seu papel de moeda de pagamento internacional, o imperialismo estadunidense engaja-se em uma política para impor seu curso foçado, quer dizer, a via de uma subordinação estreita das outras burguesias (alemã, japonesa, francesa, inglesa etc.) ao interesse exclusivo da burguesia estadunidense.

Dois mercados são constituídos: o do curso livre do dólar e o dos bancos controlados que podem obter reembolso de seus dólares pela cotação oficial de 35 dólares a onça de ouro(6).

Esse frágil edifício não dura muito. Ao suspender a convertibilidade do dólar, quer dizer, ao decidir o embargo sobre as compras de ouro, e instituir uma taxa suplementar de 10% sobre as importações, o imperialismo estadunidense e seu presidente Nixon deixaram claro ao mundo que os outros países estavam obrigados a aceitar as condições necessárias à estabilidade da ordem econômica e social estadunidense.

Todos os porta-vozes oficiais dos imperialistas concorrentes não deixavam de ter razão quando denunciavam “as cartas marcadas” que Nixon baixou (segundo o jornal “Times”, de Londres) ou protestavam contra a política do”big stick”(7). As medidas adotadas pelo imperialismo estadunidense significavam “a ruína das exportações alemãs”, declaravam magnatas da indústria alemã.

Com eles, magnatas do capital financeiro europeu, os governos do capital financeiro na França e na Suíça, entre outros, tentam, aterrados, resistir. Mas as medidas que adotam não serão capazes de construir as barreiras que eles pretendiam.

O imperialismo estadunidense dita sua lei

Mas o capital financeiro ianque, apesar de todo seu poder, não pode impor totalmente sua lei. Não que não fosse esse o desejo de Nixon, mas do mesmo modo que as leis cegas do capital não cessaram de se manifestar no período dos 25 anos anteriores, de pretendida prosperidade econômica, elas continuam em vigor.

O capital continua capital. Os outros Estados burgueses continuarão, para defender sua parcela num mercado mundial restrito, a resistir à dominação do imperialismo estadunidense. Eles serão obrigados a aceitar uma parte sempre menor, mas as medidas adotadas por Nixon não serão capazes de abolir nem a anarquia nem a concorrência entre os capitalistas e os monopólios em cada país e entre todos os países.

As medidas adotadas por Nixon significam que, dentro de um período de tempo maior ou menor, terá que ser estabelecida uma nova repartição das posições econômicas e financeiras em escala internacional, novas paridades entre as moedas terão que ser fixadas, tendo em conta a relação de forças real entre as burguesias imperialistas que disputam entre si os mercados.

E depois... tudo recomeça. Até quando? Até o momento em que o proletariado, em cada país, abolir a propriedade privada dos meios de produção e reverter a dominação de classe de cada burguesia encarnada nos Estados burgueses.

V - O governo Nixon e todos os outros governos capitalistas procurarão fazer as massas trabalhadoras pagar a conta

Para serem trocadas por seu valor, as mercadorias exigem um padrão de medida. Somente o padrão ouro e o papel moeda, conversíveis em ouro a qualquer momento, podem garantir um funcionamento “normal” (com as crises periódicas de superprodução) do modo de produção capitalista.

Mas para que o padrão ouro possa funcionar, é preciso que as mercadorias produzidas possam ser escoadas no mercado. O imperialismo decretou o fim do padrão ouro porque chegou ao estágio em que um mercado mundial “limitado” pelas barreiras da propriedade privada dos meios de produção e dos Estados nacionais não pode mais absorver a massa crescente de mercadorias produzidas. O retorno ao padrão ouro é um sonho vão.

De 1945 ao discurso de Nixon, vimos em que condições o mercado mundial funcionou. Durante esse tempo, as forças produtivas, que sufocam na camisa de força das fronteiras nacionais ultrapassadas, tenderam a constituir um mercado mais adequado.

A Europa dos Seis(8) respondeu a essa necessidade... que não poderia resolver o problema, porque a tentativa de unificação europeia se situa no quadro do sistema capitalista. O Mercado Comum implantou-se aos tropeços, em meio a crises sucessivas, enquanto o imperialismo estadunidense aceitava, ou podia manter, a conjuntura mundial.

O discurso de Nixon jogou o belo edifício comunitário por terra. Cada um dos países participantes do Mercado Comum Europeu esforça-se para defender contra todos os outros suas posições face ao imperialismo estadunidense. Cada um se apressa a negociar com Washington.

Vãs especulações habitam o cérebro dos dirigentes capitalistas mistificados e mistificadores, que lhes faz acreditar que, uma vez que o comércio exterior com os Estados Unidos está relativamente fraco, as ameaças seriam menores para a economia francesa. Para começar, os setores mais concentrados, os setores de ponta, aqueles que alavancam toda a economia capitalista, que exporta uma parte importante de sua produção para os Estados Unidos, são os mais afetados. Sem contar a massa de divisas exportadas pelo turismo estadunidense, as restrições decididas por Nixon só podem acentuar as rivalidades entre os imperialismos europeus, reduzidos a uma magra porção do mercado europeu, e, portanto, reforçam a pressão sobre a economia francesa, bem menos desenvolvida que a economia alemã.

Enfim, basta comparar com a crise de 1929: a parte da economia francesa no mercado mundial era, então, menos importante que hoje, e aquela crise não deixou de atingir severamente a França; a economia francesa é parte integrante do mercado mundial, no quadro da divisão internacional do trabalho criada pelo capitalismo e do qual ela não pode se separar.

Do mesmo modo que as outras economias capitalistas, a economia francesa sofrerá as consequências da “nova política econômica” dos Estados Unidos. Já é com grande terror que os dirigentes franceses estimam as possibilidades de desabamento, em prazos maiores ou menores, do Mercado Comum Agrícola.

Os políticos burgueses da França sabem que a única saída que lhes resta consiste em fazer os trabalhadores pagarem a conta, em bloquear as reivindicações por melhores condições de vida e de trabalho, em obrigar a classe trabalhadora a aceitar condições de vida e de trabalho rebaixadas.

Nesse ponto, há perfeito acordo entre todos os dirigentes do imperialismo mundial. Desde Nixon, que congela os salários, passando por Pompidou-Giscard d'Estaing(9) - que pedem aos trabalhadores e sindicatos para não reivindicar -, pelos governos social-democratas alemães e até pelo conservador Heath(10), todos, e com eles os magnatas do capital financeiro, apressam-se em todos os países - tanto nos Estados Unidos, como na França, no Japão e na Alemanha - a tentar impor às massas trabalhadoras o preço a pagar para tentar manter a estabilidade do modo de produção capitalista estagnado.

VI - Por uma política de resistência operária unitária contra as medidas do capital, pelo governo operário

É um fato. Todos os trabalhadores estão convencidos de que não será o poder atual de Pompidou-Chaban(11) que vai economizar medidas contra as condições de vida dos trabalhadores para proteger os lucros dos monopólios. Desde já, antes mesmo do desenvolvimento da crise aberta pelo discurso de Nixon em 15 de agosto, a alta das tarifas de transporte, do gás e da eletricidade, conjuntamente com a elevação sem precedentes do custo de vida, são características da política governamental. Será assim também amanhã, ainda mais que hoje, com certeza.

Mas é preciso falar claro. Os monopólios, o capital financeiro, são o resultado final de todo o desenvolvimento do capitalismo, são o desenvolvimento inevitável do sistema econômico baseado na propriedade privada dos meios de produção. Não é possível dissociar os monopólios do capitalismo, da propriedade privada dos meios de produção. Não é possível combater o sistema da propriedade privada dos meios de produção, que os engendrou, sem combater o capitalismo e o Estado burguês. Pretender o contrário é facilitar toda a política mortífera dos monopólios capitalistas. É assim que a luta para abrir a via ao socialismo, o único meio de colocar um fim aos males inerentes ao regime capitalista, significa que aqueles que pretendem falar em nome das massas trabalhadoras devem chegar a propostas concretas, opor a mobilização da classe operária às medidas tomadas pelo governo para salvar o regime do lucro, baseado na propriedade privada, e tomar as medidas ditadas pela defesa dos interesses dos trabalhadores.

• Contra a carestia: indenização de 200 francos, mensal e igual para todos.

• Contra a alta dos preços, escala móvel integral baseada nos índices de preços estabelecidos pelos sindicatos. Abaixo os índices governamentais manipulados!

• Contra o congelamento de salários sob qualquer forma que seja. Abaixo os contratos de crédito e os contratos-programados por meio dos quais o governo propõe aos sindicatos aceitar uma política de remuneração que impediria a luta pelas legítimas reivindicações.

• Os magnatas do capital financeiro especulam com o franco(12). Abaixo a especulação bancária! Os bancos conhecem os nomes dos especuladores, os sindicatos dos bancários devem abrir todas as contas dos capitalistas e tornar públicos os nomes dos especuladores.

• Para acabar com as especulações fundiárias, estatização sem indenização das terras desocupadas.

Não é suficiente falar de reformas. É preciso indicar claramente pelo que chamamos os trabalhadores a combater. Já soou a hora para o capitalismo. Ele não pode trazer às massas laboriosas mais do que desemprego e agravamento das condições de vida. O capitalismo dos monopólios deve desaparecer, e com ele o regime da propriedade privada dos meios de produção, do qual é produto e ao qual está ligado e religado por milhares de laços de exploração.

• Estatização sem indenização e sob controle operário dos trustes da siderurgia, dos bancos, do comércio atacadista, dos monopólios da indústria e da alimentação.

• Reforma das estatizações da ferrovia, do gás e da eletricidade etc., cassando os conselhos de administração de representantes do Estado burguês e do capital financeiro. Controle pelos trabalhadores da SNCF (ferrovias), do gás e da eletricidade e de todos os serviços públicos, por meio de delegados eleitos pelos trabalhadores, de representantes dos sindicatos e de representantes eleitos dos usuários.

• Estatização sob controle operário, sem indenização, das empresas de transporte.

O capitalismo, cujo tempo já acabou, só pode trazer a decadência à juventude. É preciso acabar com a participação nas estruturas da reforma Faure-Guichar(13) da universidade, que exclui milhares de estudantes da possibilidade de obter um diploma indispensável a um emprego qualificado.

É preciso acabar com as frases vazias sobre os pretensos aspectos positivos da reforma do ensino. Não há nada de positivo para os universitários e para os alunos secundaristas de CET(14) nas medidas adotadas por Guichar. É preciso indicar claramente que o ensino deve ser administrado em todos os níveis, dos colégios e dos CETs à universidade, por representantes dos pais dos alunos, sindicatos de professores e delegados eleitos dos secundaristas e dos estudantes universitários.

Para defender a laicidade, é preciso não apenas suprimir os créditos ao ensino livre e religioso, mas suprimir o ensino livre e religioso e combater por uma só escola. Separação real entre Igreja e Estado!

É claro que essas e outras reivindicações, que os trabalhadores levantarão por si mesmos, e que efetivamente abrirão a via ao socialismo libertador, nem o poder atual nem nenhum governo no qual haja representantes do capital poderão aceitar!

É preciso lutar pelo governo operário, o governo das organizações operárias, que se pronunciarão por esse programa de governo.

É tempo, mais do que tempo, de unir as massas e as organizações para impor pela luta o programa anticapitalista do governo operário, o único que, por recusar acertos e pactos com os detentores da propriedade privada dos meios de produção, responderá às exigências do bem-estar e da liberdade, e acabará com as leis e decretos pelos quais o governo, com seu ministro Marcelin(15), procura, por meio do Estado policial, impor a alta de preços e a deterioração das condições de vida.

Está claro que o governo operário restabelecerá e alargará todas as liberdades democráticas e assim assegurará o pleno e livre exercício das massas em luta contra a burguesia e seu Estado.

VII - Pelo Governo Operário, pelo Partido Operário

• Está claro que essas reivindicações são as que correspondem às verdadeiras aspirações da classe trabalhadora e das massas da pequena burguesia das cidades e do campo.

• Está claro que nenhum trabalhador, nenhum militante operário, nenhuma organização que se reivindique da classe operária poderia se declarar em oposição às reivindicações. Por isso, cada um entre nós, todos juntos, trabalhadores e militantes, nos perguntamos porque as organizações operárias responsáveis não se colocam em acordo em relação a essas reivindicações do programa operário, permitindo satisfazer às aspirações de todos.

A dura experiência da vida ensina aos explorados que se a unidade não se realiza, são os patrões e o Estado dos patrões que introduzem a divisão na classe trabalhadora.

A dura experiência da vida ensina que a divisão se instaura quando, em vez de lutar e defender até o fim, até a vitória, as reivindicações e as aspirações dos trabalhadores, limita-se a greve geral de maio-junho de 1968 aos acordos (de Grenelle) com a burguesia e seu Estado.

Os resultados estão aí!

Três anos após a greve geral de maio-junho de 1968:

- a escala móvel não foi conquistada;

- a legislação contra a Previdência Social está até agora em vigor;

- os 1.000 francos de salário-mínimo não foram conquistados;

- o aumento do custo de vida acabou há muito tempo com cada vantagem adquirida;

- o governo dos monopólios prossegue no cumprimento de seus planos antitrabalhador;

- Marcelin provoca a juventude, protege um policial que agride jornalistas e multiplica os obstáculos ao exercício das liberdades democráticas.

Isso pode prosseguir?

Está provado que o encerramento da greve geral só beneficiou o patronato.

E então? E então?

Já não é tempo de os militantes operários e a juventude tirarem as lições da greve geral que podia tudo, mas que foi trocada por eleições nas quais o grande capital, utilizando-se da recusa de ir até o fim, reagrupou politicamente suas forças contra a classe operária e suas organizações.

A OCI, a AJS e a Aliança Operária dizem:

É tempo, é mais do que tempo de se organizar para combater em unidade pelo governo operário.

É tempo, é mais do que tempo, de se organizar, pois foi a ausência de um verdadeiro partido operário que não permitiu a vitória da greve geral.

A OCI, a AJS e a Aliança Operária chamam os militantes a se unirem em torno do programa operário por um governo operário.

Ninguém, qualquer que seja a tendência operária à qual pertença, será excluído do 2º Congresso da AJS, que se reunirá em 30 e 31 de outubro e em 1º de novembro de 1971. Ninguém, qualquer que seja a tendência operária à qual pertença, será excluído da reunião que organizará a força militante para impor o governo de frente única operária.

Só os que recusam a se engajar no combate contra os defensores da propriedade privada dos meios de produção, e que, por isso mesmo, apesar de sua verborragia, se recusam a abrir uma verdadeira saída contra o governo Pompidou-Chaban, só esses não têm lugar no 2º Congresso da AJS nem no agrupamento pelo governo operário, o partido dos que querem acabar com a burguesia e seu Estado.

VIII. Por uma internacional operária, pela reconstrução da 4ª Internacional

Os trabalhadores estadunidenses e suas organizações sindicais dizem não à política antioperária de Nixon.

Os trabalhadores franceses e suas organizações sindicais dizem não à política antioperária que Pompidou-Chaban-Giscard quer impor para resistir às medidas adotadas por Nixon.

Os trabalhadores alemães, suíço, ingleses e japoneses recusam as consequências da política antioperária de suas próprias burguesias.

Os trabalhadores dos países semicoloniais são chamados a pagar o duro preço da política de defesa do lucro dos imperialistas.

Na URSS, na China, na Hungria e na Iugoslávia, nos países nos quais o capital foi expropriado, as decisões tomadas por Nixon, reforçando o bloqueio e elevando as barreiras ao comércio mundial, representam um golpe aplicado à economia.

Em todos os países, os trabalhadores têm o mesmo interesse de combater o capitalismo e o imperialismo. Em todos os países, contra o inimigo imperialista, pela defesa das conquistas e das posições arrancadas pelo proletariado internacional, os trabalhadores têm um mesmo interesse a lhes unir.

Mas a unidade exige que sejam claramente definidos os objetivos do combate proletário.

Quando os dirigentes da União Soviética apóiam o plano Rogers(16), que permite ao sanguinário Hussein liquidar a resistência palestina, eles aportam seu apoio a Nixon.

Quando os dirigentes da União Soviética chamaram o PC do Sudão a dar seu apoio ao assassino Nemeiry, em nome de uma política de sustentar o capitalismo nacional, levaram os comunistas do país rumo a um massacre.

Quando Mao Tsé-tung se prepara para receber Nixon, constrangendo o povo vietnamita a aceitar as condições impostas pelo imperialismo estadunidense, ajuda o capital financeiro ianque.

Quando os tanques russos são enviados contra o povo socialista tchecoslovaco, e quando, na Tchecoslováquia e na URSS, os melhores combatentes pelo socialismo são presos e condenados a pesadas penas de prisão, são demitidos de seus empregos, a burocracia do Kremlin demostra que se recusa a unir o proletariado do mundo inteiro contra o imperialismo.

Não se pode lutar pelo socialismo em um país e aceitar as violações do socialismo na URSS, na China, na Tchecoslováquia, na Hungria e em outros países.

Não se pode lutar pelo socialismo sem condenar claramente uma política que pactua com o imperialismo em nome de uma pretensa política de coexistência pacífica. Não se pode lutar pelo socialismo a não ser lutando pela unidade mundial da luta de classes do proletariado contra o imperialismo, pela revolução socialista.

Não se pode lutar pelo socialismo sem lutar na Europa contra todas as burguesias e contra a burocracia, pelos Estados Unidos Socialistas da Europa, etapa para a República Universal do Trabalho.

Em Essen, no coração do Ruhr(17), pela primeira vez depois da chegada de Hitler ao poder (em 1933 - NdT), 32 organizações de jovens de diferentes países, com a AJS, a OCI e o Comitê de Organização pela Reconstrução da 4ª Internacional, adotaram um chamamento à unidade de classe do proletariado mundial contra o imperialismo.

Em Essen, cerca de 5.000 jovens levantaram a bandeira da IRJ, a bandeira de Marx, Lênin, Rosa Luxemburgo e Trotsky.

No momento em que uma das mais violentas crises atinge o imperialismo e traduz a falência do regime da propriedade privada, o dever de todos os jovens, de todos os militantes que querem combater pelos interesses de sua classe, pelo socialismo, é se juntar à organização dos combatentes pela 4ª Internacional, a OCI.

20 de agosto de 1971
(“A Verdade” nº 554-555, outubro de 1971)