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Primeira Edição: Shan Van Vocht, agosto de 1897
Fonte: https://www.marxists.org/archive/connolly/1897/08/patlabr.htm
Tradução: Guilherme Corona Reis
HTML: Fernando Araújo.
Direitos de Reprodução: licenciado sob uma Licença Creative Commons.
O que é Patriotismo? Amor à pátria, alguém responde. Mas o que se quer dizer com “amor à pátria”? “O homem rico”, diz um escritor francês, “ama sua pátria porque ele entende que ela lhe deve uma obrigação, enquanto o homem pobre ama sua pátria porque ele acredita que ele lhe deve uma obrigação.” O reconhecimento da obrigação que devemos ao nosso país é, entendo, o impulso principal da ação patriótica; e nossa “pátria”, propriamente dita, não significa somente um ponto particular na superfície da terra do qual descendem nossos familiares, mas também compreende todos os homens, mulheres e crianças da nossa raça dos quais a vida coletiva constitui a existência política do nosso país. O verdadeiro patriotismo busca o bem-estar de cada um na felicidade de todos, e é inconsistente com o desejo egoísta de riqueza material que só pode ser obtida pela exploração dos companheiros mortais menos favorecidos.
Vistas à luz de tal definição, quais são as alegações de patriotismo dadas pela classe endinheirada da Irlanda? O percentual de salários semanais de £ 1 ou menos recebidos pelos trabalhadores dos três reinos é declarado pelo relatório do Conselho de Comércio como o seguinte: Inglaterra, 40; Escócia, 50; e Irlanda, 78 por cento. Em outras palavras, três de cada quatro assalariados da Irlanda recebem menos que £ 1 por semana. De quem é a culpa? O que determina o preço dos salários? A competição entre trabalhadores por emprego. Há sempre um excesso de trabalho desempregado na Irlanda, e por conta disso o empregador irlandês pode tomar vantagem do desespero dos seus compatriotas mais pobres e fazê-los trabalhar por menos do que seus companheiros na Inglaterra recebem pelo mesmo tipo de trabalho.
Os empregados das nossas Corporações municipais e outros órgãos públicos da Irlanda são compelidos pelos nossos vereadores de classe média – seus compatriotas – a aceitar salários que variam de 4 s. até 8 s. a menos do que as Corporações inglesas pagam por semana em ramos similares do serviço público. Empregados ferroviários irlandeses recebem de 5 s. a 10 s. a menos do que empregados ferroviários ingleses recebem por semana nos mesmos departamentos, apesar de que os acionistas das ferrovias irlandesas recebem mais dividendos do que mesmo os das mais prósperas ferrovias inglesas. Em todo o emprego privado da Irlanda a mesma situação prevalece. Sejamos claros nesse ponto. Não há nenhuma lei no código civil, nenhum poder possuído pelo Conselho Privado, nenhum órgão civil ou militar sob controle do Primeiro-Ministro, Lorde Tenente, ou Secretário Chefe que pode, tenta ou almeja compelir a classe empregadora da Irlanda a tomar vantajem do estado lotado do mercado de trabalho e usá-lo para abaixar os salários dos trabalhadores para o atual nível de fome.
É à avareza da nossa classe endinheirada, operando nas condições sociais criadas pela servidão e pelo capitalismo e mantido pelas baionetas estrangeiras, que tal resultado é totalmente imputável, e nenhuma quantidade de protestos poderá convencer os trabalhadores inteligentes que a classe que os mói na escravidão industrial pode, ao mesmo tempo, liderar eles para a libertação nacional. O verdadeiro patriotismo busca o bem-estar de cada um na felicidade de todos, e é inconsistente com o desejo egoísta de riqueza material que só pode ser obtida pela exploração dos companheiros mortais menos favorecidos. É a missão da classe trabalhadora dar ao patriotismo este significado mais elevado, mais nobre. Isto só pode ser feito pela nossa classe trabalhadora, reconhecendo no Trabalho a pedra angular do nosso edifício econômico e o princípio animador da nossa ação política.
Por isso nasce o Partido Republicano Socialista Irlandês. Nós estamos resolutos que a independência nacional é a base indispensável da emancipação industrial, mas nós estamos igualmente resolutos a acabar com a liderança da classe que a constituição social é derivada da opressão. Nossa política é o resultado de longa reflexão sobre a história e circunstâncias peculiares do nosso país. Em um país independente a eleição da maioria de representantes Socialistas para o Legislativo significa a conquista do poder político pelo partido revolucionário, e consequentemente o controle das forças militares e policiais do Estado, que se tornariam então aliadas da revolução em vez de suas inimigas.
No trabalho de reconstrução social que se seguiria, o poder do Estado - criado pelas classes proprietárias para seus próprios interesses de classe - serviria a nova ordem social como uma arma na luta contra os partidários das ordens privilegiadas que resistem a extinção gradual do seu domínio.
Não sendo a Irlanda um país independente, a eleição de uma maioria de Republicanos Socialistas não colocaria, infelizmente, os frutos do nosso trabalho tão prontamente ao nosso alcance. Mas teria outro, talvez não menos importante, efeito. Significaria que pela primeira vez na história da Irlanda uma clara maioria do eleitorado responsável da nação irlandesa – homens capazes de empunhar armas – registraram nas urnas seu desejo de separação do Império Britânico. Tal veredito, anunciado não no tumultuoso e, frequentemente, instável entusiasmo de encontros monstruosos, mas na sóbria atmosfera e calma judicial da cabine de votação, tocaria como um alerta nos ouvidos de nossos governantes e também de todos os inimigos do sistema imperial britânico. Ele sobreviveria muito após tal consumação. Seus inimigos leriam no veredito então dado na urna um pedido apaixonado de ajuda contra o opressor, a insurreição moral do povo irlandês, do qual uma pequena força expedicionária e material de guerra pode se converter em tal insurreição militar que esgotaria o poder do império em seu território e tornaria suas posses no exterior uma presa fácil. Por quanto tempo tal apelo poderia ser ignorado?
Enquanto isso, não há paliativo temporário da nossa miséria, nenhum benefício material que o Parlamento possa conceder que não poderia ser extorquido pelo medo de um partido revolucionário procurando criar uma situação como a que descrevi, mais rapidamente do que qualquer ação mesmo do mais determinado Autonomista ou outro partido constitucional. Então, tanto pelos benefícios presentes como pela liberdade futura, a política revolucionária é a melhor. Um partido que almeje somente uma República política e segue por tal linha poderia sempre ser ameaçado pelo perigo de que algum astuto Estadista inglês pode, ao aprovar uma falsa medida de Autonomia, desorganizar as forças Republicanas com a promessa de concessões, até que o momento crítico tivesse passado. Mas o Partido Republicano Socialista Irlandês, chamando atenção para os males inerentes do sistema social que o Império Britânico é somente a mais alta expressão política, fundamenta sua propaganda no descontentamento com as iniquidades sociais que só passarão quando Império não existir mais, implantando nos seus seguidores um ódio imortal e irremovível do inimigo, que permanecerá imperturbável e consistente em qualquer sistema concebível pelo charlatanismo político.
Uma República Socialista Irlandesa deve, portanto, ser o grito de guerra de todos os nossos compatriotas que desejam ver a união e o triunfo do Patriotismo e do Trabalho.
Nota editorial:
Apesar de ter completa simpatia com as visões do Sr. Connolly sobre as questões sociais e trabalhistas, nós somos completamente contrários com o plano que ele propõe da formação de um partido Republicano Irlandês no Parlamento Britânico. Qualquer Republicano consciente cumpriria o voto de lealdade e nenhuma confiança poderia ser depositada no que John O'Leary chama de homens com "dupla lealdade". John Mitchel se permitiu ser eleito como parlamentar, mas recusou de forma irresoluta a ideia de ocupar seu assento. Ele enxergava a sua eleição apenas como uma declaração a favor dos seus inalteráveis princípios rebeldes. Nós gostaríamos que esta questão fosse debatida.